CECY B. CAMPOS
Juiz de Fora/MG
ÁLBUM
Desfolhando o velho álbum de retratos,
que jazia abandonado em alguma prateleira,
relembrei pessoas, que estavam esquecidas,
e não reconheci imagens que eram minhas.
O tom amarelado esmaecia
sorrisos jovens que ficaram tristes:
tirava o viço de vidas tão distantes
e que, um dia, foram parte de minha vida.
Entre as velhas amizades retratadas,
revi amigos dos quais eu lembro os nomes
e outros, dos quais, nada mais resta,
porque ficaram perdidos pelo tempo.
Ao contemplar aquelas fotos desbotadas,
vou rejuntando, aos poucos, os pedaços
de uma história que nem sei se já vivi.
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FLORBELA ESPANCA
Vila Viçosa/Portugal 1894 – 1930 Matosinhos/Portugal
TARDE NO MAR
A tarde é de ouro rútilo: esbraseia
O horizonte: um cacto purpurino.
E a vaga esbelta que palpita e ondeia,
Com uma frágil graça de menino,
Poisa o manto de arminho na areia
E lá vai, e lá segue ao seu destino!
E o sol, nas casas brancas que incendeia.
Desenha mãos sangrentas de assassino!
Que linda tarde aberta sobre o mar!
Vai deitando do céu molhos de rosas
Que Apolo se entretém a desfolhar...
E, sobre mim, em gestos palpitantes,
As tuas mãos morenas, milagrosas,
São as asas do sol, agonizantes...
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FRANCISCO JOSÉ PESSOA
Fortaleza/CE
GATU’S BAR
Tira gosto é cajarana
Para Pitú, Ypióca,
Mas eu prefiro paçoca
Sempre que vou a Santana
Eu tomo uma boa cana
Para poder me esquentar…
Sem saber onde parar
Vou seguindo pelo faro
Você sabe aonde paro?
Eu paro no GATU’S BAR.
Voltando liso, sem grana,
Deixo esta bela cidade
No bolso levo saudade
Quando saio de Santana
Bom boêmio não se engana
Quando é noite de luar…
Eu sei que vou viajar
Nesta estrada traiçoeira
Pra tomar a saideira
Eu paro no GATU’S BAR.
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JÚLIA DA COSTA
Paranaguá/PR, 1844 – 1911
SONHOS AO LUAR
Quem és tu, bardo noturno
Que me fazes meditar?...
Serás por acaso o eco
De meu triste cogitar?...
Eu também amo a saudade
Que me inspira a solidão;
Amo a lua que me fala
Do passado ao coração.
Como tu choro uma noite
De luar que se ocultou;
Como tu choro a esperança
De uma aurora que passou.
Quem és tu, bardo noturno
Que me fazes meditar?...
Quem és tu que na minh’alma
Vens de manso dedilhar?...
Serás inda a sombra errante
De uma noite que morreu?...
Meigo raio de ventura
Que em meu seio se escondeu?...
Quem és tu? Dize quem és
Branca sombra lá do céu!
Dize o nome do teu canto
Que eu dir-te-ei quem sou eu!
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MARCOS ASSUMPÇÃO
Niterói/RJ
GIRASSÓIS E CORTESÃS
Eu não sei como domar a fera
que insiste em habitar em mim.
Fera fere à faca a carne fraca
e essa vontade de ir embora.
Um milhão de pensamentos luz.
Solidão que bate e desespera
e nas entre linhas do poeta
toda dor transformará canção.
Eu carrego um gosto de sal
e a chuva das manhãs.
Nas minhas mãos, girassóis
pra enfeitar as cortesãs.
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NEMÉSIO PRATA
Fortaleza/CE
GLOSA
Mote:
Um sonho lindo que eu tive
onde tudo era harmonia
acordei... não me contive...
Era um sonho!... Que agonia!
José Feldman (Maringá/PR)
Glosa:
Um sonho lindo que eu tive
trouxe-me doces lembranças
quando jovem, em aclive,
via na vida esperanças!
Fora uma bela visão
onde tudo era harmonia
dando-me viva impressão
do quão feliz eu seria!
Hoje em infausto declive
na vida, sem me por freio,
acordei... não me contive...
foi só mais um devaneio!
Que o sonho fosse verdade
era tudo o que eu queria,
mas quedei-me à realidade:
Era um sonho!... Que agonia!
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VÂNIA M. DINIZ
Brasília/DF
TERNURA
O olhar era intenso,
Como brilhantes faiscantes,
Admiráveis,
Imutáveis.
Havia neles,
Mais do que o brilho,
O regozijo pela vida,
E o fulgor da esperança.
Fixavam um ponto distante,
Como perdidos no sonho,
Quimeras incandescentes,
De longa duração.
Nada parecia irreal,
Na intensidade do momento,
Refletido em soberbas pupilas.
Sinônimo era ternura,
Da expressão a mais linda,
Que enxerguei um dia...
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WALT WHITMAN
Estados Unidos, 1819 – 1892
ENQUANTO EU LIA O LIVRO
Enquanto eu lia o livro, a famosa biografia:
- Então é isso (eu me perguntava)
o que o autor chama
a vida de um homem?
E é assim que alguém,
quando morto e ausente eu estiver,
irá escrever sobre a minha vida?
(Como se alguém realmente soubesse
de minha vida um nada,
quando até eu, eu mesmo, tantas vezes
sinto que pouco sei ou nada sei
da verdadeira vida que é a minha:
somente uns poucos traços
apagados, uns dados espalhados
e uns desvios, que eu busco
para uso próprio, marcando o caminho
daqui afora.)
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