domingo, 6 de janeiro de 2019

Contos e Lendas do Mundo (Mali: Como Apareceram os Animais)


De acordo com um velho mito dos Dogones, do Mali, o mundo foi criado pelo deus Amma. Foi este quem colocou as pessoas na Terra... Mas como é que os animais lá chegaram primeiro?

Amma, o Criador fez o mundo. Primeiro, pegou num gigantesco pote de barro e coseu-o num forno até ficar incandescente. Depois, envolveu-o em cobre vermelho e atirou-o para o céu, fazendo aparecer a luz.

 - Tu és o meu Sol! - declarou.

A seguir, agarrou num pote mais pequeno que, depois de pôr ao rubro no seu forno, cobriu de cobre branco - hoje conhecido por latão - e atirou-o para a outra ponta do céu.

- Tu és a minha Lua! - disse.

Depois, arrancou um pedaço ao Sol, partiu-o em mil pedacinhos que espalhou por todo o céu.

- Vós sois as minhas Estrelas! - acrescentou.

Depois disto, agarrou num bocado de barro e criou a Terra.

- Tu és a Terra Mãe, minha esposa! - declarou.

Posto isto, fez cair a primeira chuvarada na Terra, de onde nasceram gêmeos.

Os gêmeos pareciam-se muito com os humanos que Amma viria a criar mais tarde, mas tinham língua de lagarto e cauda de serpente. Foram os primeiros filhos de Amma: Água e Luz.

Água e Luz foram ter com o pai ao céu e olharam, lá de cima, para a esplendorosa mãe, a Terra.

- Ela não tem roupa! - exclamou Luz.

- Nesse caso, temos de a vestir - retorquiu Água.

Juntos, Água e Luz fizeram crescer erva e as plantas brotaram, cobrindo assim a nudez da mãe. Ainda hoje é assim: as plantas precisam de água e luz para crescer.

A seguir, o Criador moldou o Primeiro Homem e a Primeira Mulher em barro, colocou-os na Terra e insuflou-lhes vida. Os dois, por sua vez, tiveram oito filhos - dois pares de gêmeos e dois pares de gêmeas - que formaram o primeiro povo dos Dogones.

Uma vez mais, Água e Luz olharam para a mãe, agora coberta de verdura, e acharam que precisava de mais roupa.

- Que estão a fazer? - perguntou Anima, o pai.

- Estamos a tecer uma saia de caniços e arbustos para a mãe vestir – explicaram, enquanto o pai se sentava ao seu lado no céu. Os três foram conversando, enquanto Água e Luz trabalhavam.

Nenhum deles percebeu, no entanto, que o entretecer dos caniços e a inserção das folhas criara um vento que levou as suas palavras até à superfície da Terra. Aí, as pessoas escutaram-nas e, como vinham dos deuses, compreenderam-nas. Começaram então a falar uns com os outros, nascendo, assim, a linguagem humana.

Anima, Água e Luz olharam, satisfeitos, para o novo mundo que tinham acabado de criar.

- Está pronto - declarou Amma. - O meu povo vive feliz.

- Mas a Terra é tão grande! - comentou Luz. - Não poderia ter mais gente a habitá-la?

O pai retirou então um pouco de luz reluzente ao Sol e criou as pessoas de pele negra reluzente que andam pelo mundo. Para arranjar as pessoas de pele mais clara, pegou num pouco de luar e, por fim, colocou todas na Terra Mãe.

- Agora o vosso trabalho terminou, pai! - disse Água. - Podeis orgulhar-vos do mundo lindo que criastes.

Os três retiraram-se então para descansar no céu.

As primeiras pessoas adoraram o seu lar. E adoravam o Sol, que brilhava durante o dia, e a Lua que os banhava com o seu luar, à noite.

Adoravam as plantas e as árvores, assim como a terra que pisavam.

Apreciavam imensamente a chuva que caía do céu e a linguagem que lhes chegava através da brisa e que aprenderam a utilizar para comunicar entre si.

- O nosso Criador é um deus sábio e generoso - disse um jovem -, mas na nossa linguagem há palavras para coisas que nunca vi. De que animais fala Ele? Têm nomes tão variados... Se ao menos pudéssemos ver essas criaturas fantásticas!!

- Mas, se esses animais não se encontram na Terra, onde poderão estar? - quis saber a mulher.

- Ora, na própria casa de Amma, claro! - respondeu o homem. - Esses animais devem viver no céu. Temos de Lhe pedir que nos mande alguns.

A jovem riu.

 - Se o Criador quisesse que partilhássemos a Terra com eles, já os teria aqui posto ao nosso lado.

 O jovem concordou.

- Nesse caso, só nos resta ir até ao céu e roubá-los! - declarou, triunfantemente.

 Ficou combinado que um grupo deles subiria até ao céu e escolheria um macho e uma fêmea de cada animal.

 - Como é que iremos levá-los para baixo? - perguntou um.

 - Construiremos uma pirâmide gigantesca de madeira. - sugeriu o jovem. - Não sabemos que tamanho têm esses animais, mas podemos colocar os maiores no fundo e os mais pequenos no topo.

 - Mas como é que traremos a pirâmide de volta à Terra quando estiver cheia? - perguntou outro.

 - Baixá-la-emos com uma corda grossa! - respondeu a jovem.

 - Pensaste em todos os pormenores! - elogiou um.

- Então, mãos à obra! - exclamou um outro.

Assim que a pirâmide ficou pronta, o grupo de pessoas trepou por ela, do alto de uma colina e, chegadas ao céu, maravilharam-se com o reino que lá havia. Havia girafas, hipopótamos, leões, antílopes, besouros, aves, peixes e todo o tipo de animais que podemos imaginar - todos a pastar, correr, voar e nadar por cima das nuvens.

- Que lindos! - exclamou o jovem, boquiaberto.

- Cala-te - ordenou a jovem -, pois o Criador pode estar por perto e se souber que viemos aqui roubar-lhe os animais, não ficará nada satisfeito.

- Não são todos os animais - corrigiu o jovem. - Apenas um macho e uma fêmea de cada.

Foi assim que, rápida e sorrateiramente, o primeiro povo dos Dogones conduziu os animais, dois a dois, para a pirâmide de madeira que construíra - ficando os maiores em baixo e os mais pequenos em cima - até esta ficar cheia e muito pesada.

 - Encontramos muito mais animais do que alguma vez imaginei! – confessou o jovem. - Não podemos fazer baixar a pirâmide com uma corda, pois é demasiado pesada. A corda partir-se-ia e ela cairia na Terra...

- Podíamos puxá-la até aqui abaixo - sugeriu um, apontando para o magnífico arco-íris que unia o céu e a Terra.

- Mas ganharia velocidade e tombaria violentamente sobre a Terra. - lembrou a jovem com um suspiro.

As pessoas já começavam a impacientar-se, receosas de que Amma, Água e Luz pudessem aparecer a qualquer momento, apanhando-os a meio daquele roubo atrevido.

- Já sei! - exclamou o jovem. - Com a ajuda da corda, desceremos a pirâmide pela ponte do arco-íris. Tanto uma como o outro devem ser suficientes para suportar o peso. Iremos à frente da pirâmide para abrandar a descida!

Todos concordaram, mas, a certa altura, alguém perguntou:

- A que é que ataremos a outra ponta da corda?

O jovem, sem proferir palavra, agarrou na extremidade livre da corda e atou-a ao Sol.

- E agora, levemos os animais para a Terra ! - declarou.

Deve ter sido uma visão fantástica e inacreditável: um grupo de pessoas a arrastarem, lentamente, arco-íris abaixo, uma pirâmide gigantesca, em direção à Terra. Imagine-se o que deve ter sido para aqueles que observavam e aguardavam que regressassem sãos e salvos. Calcule-se o horror que sentiram quando, mal a pirâmide pousou, intacta, no chão, se ouviu um retumbante CRAC!

A corda arrancara um pedaço ao Sol... e tanto a corda como o fragmento rodopiavam pelo céu, em direção a eles.

Quando o fragmento de Sol atingiu um arbusto, que se incendiou violentamente, lançando labaredas cor de laranja para o ar, as pessoas fugiram a bom fugir. Nunca tinham visto chamas e estavam assustadas.

 - Amma fez isto para nos castigar! - gritou um homem que tivera demasiado medo para ir com os outros.

- Que tolice - declarou o jovem. - Hoje, além dos animais, recebemos um presente extra. Vejam como este fogo liberta calor e luz... Pode ser um instrumento para a humanidade!

 Dito isto, abriu a porta da pirâmide e os casais de animais começaram a sair.

 As aves levantaram voo, os mamíferos, os insetos e os répteis partiram para as florestas e planícies, e os peixes foram para a água... e a Terra Mãe acolheu-os de bom grado pois tinha muito para lhes oferecer.

 Lá em cima, no céu, Amma, Luz e Água olharam para a Terra.

- As pessoas que eu criei são criaturas muito ardilosas - comentou Amma. - Mas os animais parecem felizes no seu novo mundo e a vossa mãe cuida muito bem deles. A partir de agora, só têm de se respeitar uns aos outros. Deixá-los-ei ficar... pelo menos por enquanto.

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