sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

João Cirino Gomes (Floresta Encantada)



Os moradores da floresta encantada viviam em festa e fantasia.

Cascudinho e Douradinho eram dois peixinhos, e moravam em um riacho que cortava a floresta.

Naquela tarde ensolarada os dois amiguinhos brincavam de pular.

Douradinho se dizia campeão de salto em altura. Como Cascudinho não queria ficar atrás, começou a disputa.

A cada pulo olhavam pra fora da água, apostando quem enxergava mais longe.

Na volta diziam o que tinham visto.

Depois de vários saltos, Douradinho voltou com a novidade.

- Esta chegando alguém.

- Quem será? - Perguntou Cascudinho que era curioso.

- Não sei, mas vamos ver - respondeu Douradinho.

Em seguida, viram a dona Anta, e suas duas filhas, Antônia e Antonieta que se aproximavam... Depois de saciarem a sede, elas se sentaram na relva e se puseram a conversar.

Em dado momento, Antônia pediu: - Mamãe; conta àquela estória do menino que era desobediente?

-É mesmo mamãe! - Concordou sua irmã Antonieta toda empolgada.

Depois de algumas insistências, dona Anta começou: - Era uma vez um garoto branquinho, que morava com sua mãe na floresta. A mulher era muito bondosa, mas seu filho se tornou um peralta. João de Barro é quem o diga. O garoto vivia o perseguindo.

Dona Sabiá também não tinha sossego, e já estava magra de tanto fugir das pedradas do menino. Com sua perversidade o malvado tirava a paz de todos os moradores da floresta. Muitas vezes o garoto tentou derrubar a casinha, que João de barro construíra com sacrifício.

Sua maior magoa, era ver João de barro e Joaninha cantarem felizes da vida, sobre os galhos da paineira.

Certa tarde, depois de muito matutar, o menino resolveu que acabaria com aquela alegria. Escondido da mãe pegou um tição no fogão, e foi para a floresta.

Todo empolgado juntou um monte de folhas, e acendeu uma fogueira junto ao tronco da paineira, onde morava João de barro.

- Eles vão ver comigo - dizia o perverso, esfregando a mão de contentamento.

Deitou-se na relva, e ficou olhando para o alto, esperando o resultado da sua perversidade. Mas pegou no sono, e as chamas começaram a se alastrar.

João de barro e Juaninha percebendo o perigo; cantavam tentando desperta-lo, mas nada do menino acordar.

Quando as chamas lamberam seu calcanhar, ele se levantou e pensou em fugir, porem já era tarde... Desesperado tentou subir na arvore para se livrar das labaredas. Quando se agarrou em um galho foi ao chão e quebrou a perna. Então aumentou seu desespero; não conseguia se levantar, e começou a gritar.

Tanto gritou que sua mãe veio ao seu socorro.

Depois de enfrentar as chamas, a bondosa senhora o pegou no colo, e o levou para a casa.

Mas o malvado tinha se queimado, e estava pretinho como um carvão.

Desde então, ganhou o apelido de Saci Perere.

***

- Mamãe agora conta àquela estória do bicho papão? - Pediu Antonieta.

- Vamos para casa, pois já esta ficando tarde. Amanhã eu conto - concluiu dona anta, e saiu, sendo seguida por suas filhas.

Os dois amiguinhos também se despediram.

E quando iam se afastando, apareceu "Odoro", tio de Douradinho, que chegava para fazer uma visita a sua irmã Dorotéia.

- Ao avistar o sobrinho, Odoro perguntou: - Que você esta fazendo até estas horas longe de casa menino?

- Tio eu e meu amigo Cascudinho estávamos ouvindo a dona Anta contar a estória de um menino muito levado, que se chama Saci Perere. Ele era malvado, e não obedecia a sua mãe, e talvez por isso tenha recebido um castigo.

- Quando eu era jovem, ouvi falar deste menino - disse Odoro.

- O que você ouviu titio?

- Vamos pra casa, chegando lá eu conto.

Então Douradinho abanou a cauda mais rapidamente, e devido a sua grande curiosidade pediu: - O tio vai contando pelo caminho! - Fique calmo guri, eu vou contar, agora ande vamos!

Nem bem entraram por entre as pedras, onde morava Dourotéia, e o garoto já estava ao lado do tio, pedindo ansioso: - Agora conta!

Diante da insistência, Odoro começou a narrativa.

- Certa tarde eu nadava na maior tranqüilidade, quando notei dois pescadores se aproximando em uma canoa.

Ao invés de prestarem atenção no que estavam fazendo, eles remavam distraidamente, conversando animadamente.
Eu aproveitei estas distrações, e tirei a isca do anzol deles por varias vezes. Mas não querendo abusar da sorte, e já de barriga cheia, fiquei ouvindo suas conversas.

O mais velho disse:

- Este riacho me parece encantado, em todo lugar que vou pescar, nunca perco uma fisgada, quando puxo sai uma lasca de um peixão, e aqui já puxei varias vezes; perdi varias iscas e não peguei nada.

- Como assim encantado? - Perguntou o pescador mais novo, ao contador de prosa, que usava um chapelão de palha.

- Rapaz, eu tenho um compadre chamado Bentinho, que cuida de uma roça pra estas bandas, - disse o velho.

Certa vez ele me contou, que quando voltava do trabalho, resolveu pegar umas espigas de milho. Chegando a casa debulhou o milho e colocou numa panela. Em seguida encheu o cachimbo com um fumo que ele mesmo cultivava, e começou a meditar:

- Depois de comer um punhado de pipoca, dou uma tragada no meu cachimbo e vou descansar.

Com estes pensamentos, deitou-se na rede e ficou balançando, esperando a pipoca estralar.

E como estava cansado, meu compadre adormeceu.

Quando acordou, foi até o fogão, e notou que não havia nenhum grão de pipoca na panela. Então ele ficou cismado.

Pegou seu cachimbo, e nele também não tinha fumo.

- Eu não lembro de ter fumado, - pensou ele.

Olhou para um canto, olhou para o outro, coçou a cabeça, e perguntou a si mesmo, - será que estou caducando? Não pode ser; também não comi pipoca, e tenho certeza que eu trouxe milho. A maior prova disso são as palhas que estão aqui!

Naquela noite meu compadre ficou matutando até tarde.

No dia seguinte foi para a roça, e trabalhou o dia todo pensativo.

À tarde quando saiu do trabalho, olhou para o milharal, e pegou outras espigas.

Chegando a sua casa debulhou o milho e colocou na panela. Pegou seu cachimbo encheu de fumo, e o deixou sobre o fogão.

Deitou-se na rede, e ficou ali com um olho fechado e o outro aberto, fingindo que cochilava.

Logo escutou um assobio. Em poucos instantes um menino pretinho chegou pulando numa perna só. Entrou porta adentro e foi direto ao fogão. Encheu a mão de pipoca, e levou a boca. Lambeu os beiços, e despejou o restante da pipoca dentro da toca.

Depois pegou uma brasa colocou no cachimbo, deu uma baforada e saiu.

Já no terreiro, deu uma gargalhada e sumiu.

- Então é isso seu safado? - pensou meu compadre.

Eu estouro pipoca; você vem e come, fuma meu cachimbo, e ainda sai dando risada?

- Há, mas eu vou te dar uma lição; vou sim, pode esperar seu danado!-Disse meu compadre; que estava bravo feito uma onça.

No dia seguinte, fez à mesma coisa, escolheu três rechonchudas espigas de milho, com belas cabeleiras ruivas, e foi para casa.

Lá chegando, debulhou o milho e colocou na panela.

Só que ao invés de por fumo no cachimbo, colocou pólvora. Deitou - se na rede, e ficou fingindo que cochilava...

Não demorou muito ouviu o assobio, logo o pretinho entrou sorridente pulando numa perna só. Foi para o fogão, experimentou um punhado de pipoca e despejou novamente o restante dentro da toca. Pegou o cachimbo, e quando o ascendeu e deu uma tragada, a pólvora se incendiou e, bumm!

Com a explosão, e a fumaceira, o Saci tomou um susto e caiu de costas.

Meu compadre deu um grito, e só viu o vulto que se engatinhou por baixo da rede e fugiu.

Bentinho foi até a porta e gritou: - Viu seu safado, quem ri por ultimo ri melhor! Em seguida deu uma gargalhada e retornou para dentro da casa ainda enfumaçada.

Quando já se deitava na rede, notou que na sua pressa, o Saci tinha esquecido a toca cheia de pipoca.

O dia seguinte amanheceu fazendo muito frio, e Bentinho resolveu dormir até mais tarde.

Assim que o sol começou a surgir, escutou um choro.

Saiu para o quintal, e viu o saci chorando.

- Porque chora seu peralta? - Perguntou Bentinho.

-É que eu estou com muito frio. Por favor, seu moço me devolva minha toca. Sem ela eu não tenho magia.

- Então você esta querendo a toca de volta, para continuar aprontando das suas em?

- Não seu moço, eu prometo não fazer mais artes.

- Se for assim eu devolvo.

Depois de colocar a toca na cabeça, o Saci agradeceu e se foi. Daí em diante ninguém mais ouviu falar nele!

***

- Tio, amanhã a dona Anta vai contar uma estória do bicho papão, será que ele existe mesmo?

- Já faz muito tempo que não ouço falar nele! - Respondeu Odoro.

- Há muito tempo atrás, o rei Leão autorizou o Bicho Papão comer todas as crianças desobedientes.

Com medo do Bicho Papão, as crianças se tornaram boas, e não desobedeciam mais seus pais.

Desta forma aconteceu que o Bicho Papão ficou sem alimentação, pois o rei tinha autorizado ele comer somente as crianças teimosas.

Com fome; Bicho Papão que era cheio de astúcia, resolveu fazer uma festa. Sua intenção era convidar todos os animais, e come-los um a um.

O Bicho Preguiça ficou incumbido de entregar os convites.

Quando chegou o dia da festa, nenhum convite ainda tinha sido entregue.

E o bicho papão desiludido, virou uma fera.

Chamou o Bicho Preguiça de lerdo, de irresponsável... E o Bicho Preguiça chateado com as ofensas respondeu:

- Se você ficar me criticando, e me apressando; eu não vou entregar droga de convite nenhum.

Então o Bicho Papão se afastou resmungando, mas não desistiu.

No dia seguinte, resolveu organizar uma nova festa.

Desta vez, o macaco que era mais ágil, é quem iria entregar os convites.

Só tinha um inconveniente, precisavam de um barco, pois a festança seria em uma ilha.

E os animais da floresta, sem desconfiar das intenções do Bicho Papão, começaram a trabalhar na construção do barco.
No dia da festa, o Pavão apareceu todo empolgado com sua plumagem colorida.

O Coelho e dona Coelha, davam saltos de alegria.

Todos entraram no barco e seguiram em direção a ilha.

A festa estava animada.... A bicharada dançava, pulava e batia palmas.

O macaco batucava, a cigarra chiava, a coruja cantava e tocava sanfona, e o bode corria entre os convidados, fazendo a maior farra.

E o Bicho Papão em um canto, Matutava:

- Vou embebedar a todos... Assim será mais fácil come-los!

O Gambá foi o primeiro a ficar bêbado, e queria brigar com o Tatu.

Então Bicho Papão apartou a briga e disse:

- Eu levarei o compadre ao riu para se refrescar. Abraçou-se ao Gambá e se afastaram. - Este é o primeiro que vou comer, - pensou ele.

Assim que chegaram ao rio, viu que tanto ele quanto o Gambá estavam fedendo.

Por mais que o esfregasse aquele mau cheiro persistia. Varias vezes tentou engolir o gambá, chegou até a tapar o nariz, mas quando se aproximava com a boca aberta, sentia o fedor, fazia ânsia e se afastava.

Depois de muito tempo dentro da água gelada, o bicho papão começou a espirrar. - Atichim... Atichim... Revoltado, e com fome, abandonou o bêbado em um canto, e decidiu voltar para o baile.

Antes, porem, resolveu soltar o barco na correnteza.

Enquanto desamarrava o barco dizia: - Agora ninguém mais sai daqui. E quando eu sarar desta gripe, vou comer todos, um após o outro.

Mas o Pavão que estava de ressaca, foi beber água no rio. Ao ouvir o que o bicho papão dizia, voltou voando para a festa, e lá chegando contou para bicharada o que tinha visto e ouvido.

De madrugada a coruja começou a cantar um estranho refrão:

- Coitado de quem não sabe?

E a bicharada respondia: - Ainda bem que estou sabendo!

E o refrão continuava. - Coitado de quem não sabe...! - Ainda bem que estou sabendo...

- Atichim... Que musica é esta? - Perguntou o Bicho Papão.

- Então o compadre não sabe? - Vem vindo um temporal ai, e o vento vai levar tudo pelos ares - respondeu o macaco.

- Não diga! E como eu farei compadre? Eu não quero ser levado pelo vento! - Disse o Bicho Papão temeroso.

- Nós vamos nos amarrar nas arvores! - Informou o macaco.

- E o compadre pode me amarrar?- Perguntou o Bicho Papão.

-Sim! Só que você será o ultimo! - Falou o macaco, que era muito maroto.

- Eu sendo o dono da festa, tenho o direito de ser amarrado primeiro! - Questionou o Bicho Papão.

- Então vamos consultar os convidados, - disse o macaco. - Se todos estiverem de acordo, faremos a sua vontade!
Só tem um inconveniente, precisamos de um cipó bem forte.

-Pode deixar que eu pego o cipó! - Falou o bicho papão.

Entrou na floresta, e logo retornou com uma braçada de cipó.

Então os animais amarraram o Bicho Papão em um tronco, e lhe deram uma surra com vara de marmelo.

Depois jogaram o tronco na correnteza.

E o Bicho Papão se foi rio abaixo.

Se ainda existe não sei. Mas que existiu, existiu! Isso eu falo e afirmo! - Disse Odoro.

Fontes:
Colaboração do autor. http://www.autores.com.br/
Saci Pererê = http://centoeuma.com.br/
Bicho-Papão = http://www.jangadabrasil.com.br/

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