terça-feira, 1 de junho de 2010

A. A. de Assis (A Língua da Gente) Parte 13


12. Rebaixa de fatos de banho

Aproveite: estão liquidando os maiôs. Isso mesmo: em Portugal, rebaixa é liquidação; fato é roupa; e fato de banho é, naturalmente, traje de praia: maiô, biquíni, calção etc.

Quando você for lá, vá sabendo: a língua é (quase) a mesma. Sublinhe o pormenor: quase. Nos jornais de lá você vai logo notar algumas diferenças gráficas. Por exemplo: eles escrevem académico, Amazónia, António, bónus, fémur, fénix, fenómeno, quilómetro, ténis... (com acento agudo, quando aqui marcamos tais palavras com acento circunflexo); eles conservam, mais do que nós, as consoantes chamadas “mudas” (escrevem acto, accionista, adopção, baptismo, correcto, director, excepção, óptimo, optimismo...). Na linguagem oral também será fácil perceber características interessantes: eles “engolem” alguns fonemas: cr’oa, difr’ente, espr’ança...; eles usam habitualmente, no tratamento íntimo, o pronome tu; e no tratamento mais cerimonioso, além de o senhor, a senhora, a senhorita, valorizam muito a fórmula Vossa Excelência.

O que mais chama atenção, entretanto, é o vocabulário. Você, por certo, já ouviu falar que bicha em Portugal é fila, daí resultando frases como estas: “Ontem à noite havia uma bicha enorme na porta do teatro”... “Favor não furar a bicha”... E como baguete (pão) é cacete, não estranhe se ouvir alguém dizer: “Entrei na bicha para apanhar um cacete quentinho”. Outra palavra curiosa é troço (trecho de estrada). Você poderá encontrar placas assim: “Troço escorregadio”... “Longo troço em declive”...

Autocarro é ônibus, berma é acostamento, peão é pedestre, e aparcar é estacionar. Descapotável é conversível, gasolineiro é frentista de posto (hoje raramente encontrável por lá), boleia é carona, e demasia é troco. Romagem é romaria, renda é aluguel, betão é cimento, e piroso é brega, jeca. O avião, quando levanta voo, descola; quando desce, aterra. Canalizador é encanador, casa de banho é banheiro, e banheiro é como se chama o salva-vidas. Retrete é privada, autoclismo é caixa de descarga, defumos é exaustor, e esquentador é aquecedor. Pastilha elástica é chiclete, sandes é sanduíche, e ementa ou preçário ou carta de pratos é o que chamamos cardápio ou menu. Capachinho é peruca, penso é curativo, e casa com recheio é casa com os móveis. Mandato a distância é controle remoto; atendedor automático ou gravador de chamadas é secretária eletrônica, e ficha é tomada. Relvado é campo de futebol, equipa é time, e golo da igualdade é gol de empate. Camião é caminhão, camionista é motorista, e portagem é pedágio. Estomatologista é dentista, peúga é meia para homem, e elétrico é bonde.

Mas nada disso é problema, porque tanto lá como cá amizade é amizade, amor é amor, abraço é abraço. Um abraço enorme, que já dura mais de 500 anos e que a cada dia é mais dengoso.
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Fonte:
A. A. de Assis. A Língua da Gente. Maringá: Edição do Autor, 2010

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