Era um macaco que resolveu sair pelo mundo a fazer negócios. Pensou, pensou e foi colocar-se numa estrada, por onde vinha vindo, lá longe, um carro de boi. Atravessou a cauda na estrada e ficou esperando.
Quando o carro chegou e o carreiro viu aquele rabo atravessado no caminho, deteve-se e disse:
— Macaco, tire o rabo da estrada, senão passo por cima.
— Não tiro! — respondeu o macaco — e o carreiro passou e a roda cortou o rabo do macaco.
O bichinho fez um barulho medonho.
— Eu quero meu rabo, eu quero meu rabo — ou então uma faca!
Tanto atormentou o carreiro que este sacou da cintura a faca e disse:
— Tome lá, seu macaco dos quintos, mas pare com esse berreiro, que está me deixando zonzo.
O macaco lá se foi, muito contente da vida, com a sua faca de ponta na mão.
"Perdi meu rabo, ganhei uma faca! Tin-glin, tinglin, vou agora para Angola!"
Seguiu caminho. Logo adiante deu com um tio velho que estava fazendo balaios e cortava o cipó com os dentes.
— Olá, amigo! — berrou o macaco. — Estou com dó de você, palavra! Onde já se viu cortar cipó com os dentes? Tome esta faca de ponta.
O negro pegou a faca mas quando foi cortar o primeiro cipó a faca se partiu pelo meio. O macaco botou a boca no mundo.
— Eu quero, eu quero minha faca — ou então um balaio!
O negro, tonto com a gritaria, acabou dando um balaio velho para aquela peste de macaco — que, muito contente da vida, lá se foi cantarolando: "Perdi meu rabo, ganhei uma faca; perdi minha faca, pilhei um balaio! Tinglin, tinglin, vou agora para Angola!"
Seguiu caminho. Mais adiante encontrou uma mulher tirando pães do forno, que recolhia na saia.
— Ora, minha sinhá — disse o macaco — onde se viu recolher pão no colo? Ponha-os neste balaio.
A mulher aceitou o balaio, mas quando começou a botar os pães dentro, o balaio furou. O macaco pôs a boca no mundo.
— Eu quero, eu quero o meu balaio — ou então me dê um pão.
Tanto gritou que a mulher, atordoada, deu-lhe um pão. E o macaco saiu a pular, cantarolando: "Perdi meu rabo, ganhei uma faca; perdi minha faca, pilhei um balaio; perdi meu balaio, ganhei um pão. Tinglin, tinglin, vou agora para Angola!"
E lá se foi, muito contente da vida, comendo o pão.
— Foi para onde? — indagou Emília. — Para Angola?
— Sei lá para onde o macaco foi! — respondeu tia Nastácia. — Para Angola não havia de ser, que é muito longe. Foi para o mato, que é a Angola dos macacos.
— Esperei que a história acabasse melhor — disse Narizinho. — A esperteza do macaco para ganhar coisas está boa, apesar de que isso de dar parte do corpo em troca duma faca não me parece negócio. Mas o inventor da história chegou no meio e não soube como continuar; por isso parou no pão.
==============
— É, sim — concordou Pedrinho. — Ele devia fazer o macaco ir ganhando coisas de valor cada vez maior, para mostrar que com esperteza uma pessoa consegue tudo quanto quer na vida. Mas o pobre macaco fazia os negócios e ia ficando na mesma. Saía perdendo sempre.
— Bobinho! — exclamou Emília. — Dar a cauda por uma faca ordinaríssima, que quebra ao cortar um cipó, parece-me o pior negócio do mundo. Depois trocou a faca por um balaio velho e podre. Outro negócio péssimo. E acabou trocando o balaio por um pão. Comeu o pão e ficou sem balaio, sem faca e sem cauda. Isso é mesmo o que se chama "negócio de macaco". E ainda acham que macaco é bicho ladino! — observou a menina.
— Não — disse dona Benta. — Nas histórias populares o mais ladino não é o macaco, sim a raposa e o jabuti. A raposa, ladiníssima, sai ganhando sempre. Chegou a ficar o símbolo da esperteza. Quando queremos frisar a manha dum político, dizemos: É uma raposa velha! E o jabuti, não sei por que, também ficou com fama de fino. O macaco, coitado, faz suas espertezas mas nem sempre sai ganhando. Esse de tia Nastácia, por exemplo. Lá foi, muito contente da vida, a comer o pão — mas não se lembrou de que estava sem cauda.
— Tolinho! — gritou Emília. — Quando for trepar a uma árvore é que verá a asneira que fez. Macaco sem cauda é macaco aleijado. Eles fazem na floresta aqueles prodígios de agilidade justamente por causa da cauda. Idiota!
–––––––––––––
Continua… XXII – O Macaco e o Coelho
–––––––––––––-
Fonte:
LOBATO, Monteiro. Histórias de Tia Nastácia. SP: Brasiliense, 1995.
Este livro foi digitalizado e distribuído GRATUITAMENTE pela equipe Digital Source
Quando o carro chegou e o carreiro viu aquele rabo atravessado no caminho, deteve-se e disse:
— Macaco, tire o rabo da estrada, senão passo por cima.
— Não tiro! — respondeu o macaco — e o carreiro passou e a roda cortou o rabo do macaco.
O bichinho fez um barulho medonho.
— Eu quero meu rabo, eu quero meu rabo — ou então uma faca!
Tanto atormentou o carreiro que este sacou da cintura a faca e disse:
— Tome lá, seu macaco dos quintos, mas pare com esse berreiro, que está me deixando zonzo.
O macaco lá se foi, muito contente da vida, com a sua faca de ponta na mão.
"Perdi meu rabo, ganhei uma faca! Tin-glin, tinglin, vou agora para Angola!"
Seguiu caminho. Logo adiante deu com um tio velho que estava fazendo balaios e cortava o cipó com os dentes.
— Olá, amigo! — berrou o macaco. — Estou com dó de você, palavra! Onde já se viu cortar cipó com os dentes? Tome esta faca de ponta.
O negro pegou a faca mas quando foi cortar o primeiro cipó a faca se partiu pelo meio. O macaco botou a boca no mundo.
— Eu quero, eu quero minha faca — ou então um balaio!
O negro, tonto com a gritaria, acabou dando um balaio velho para aquela peste de macaco — que, muito contente da vida, lá se foi cantarolando: "Perdi meu rabo, ganhei uma faca; perdi minha faca, pilhei um balaio! Tinglin, tinglin, vou agora para Angola!"
Seguiu caminho. Mais adiante encontrou uma mulher tirando pães do forno, que recolhia na saia.
— Ora, minha sinhá — disse o macaco — onde se viu recolher pão no colo? Ponha-os neste balaio.
A mulher aceitou o balaio, mas quando começou a botar os pães dentro, o balaio furou. O macaco pôs a boca no mundo.
— Eu quero, eu quero o meu balaio — ou então me dê um pão.
Tanto gritou que a mulher, atordoada, deu-lhe um pão. E o macaco saiu a pular, cantarolando: "Perdi meu rabo, ganhei uma faca; perdi minha faca, pilhei um balaio; perdi meu balaio, ganhei um pão. Tinglin, tinglin, vou agora para Angola!"
E lá se foi, muito contente da vida, comendo o pão.
— Foi para onde? — indagou Emília. — Para Angola?
— Sei lá para onde o macaco foi! — respondeu tia Nastácia. — Para Angola não havia de ser, que é muito longe. Foi para o mato, que é a Angola dos macacos.
— Esperei que a história acabasse melhor — disse Narizinho. — A esperteza do macaco para ganhar coisas está boa, apesar de que isso de dar parte do corpo em troca duma faca não me parece negócio. Mas o inventor da história chegou no meio e não soube como continuar; por isso parou no pão.
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— É, sim — concordou Pedrinho. — Ele devia fazer o macaco ir ganhando coisas de valor cada vez maior, para mostrar que com esperteza uma pessoa consegue tudo quanto quer na vida. Mas o pobre macaco fazia os negócios e ia ficando na mesma. Saía perdendo sempre.
— Bobinho! — exclamou Emília. — Dar a cauda por uma faca ordinaríssima, que quebra ao cortar um cipó, parece-me o pior negócio do mundo. Depois trocou a faca por um balaio velho e podre. Outro negócio péssimo. E acabou trocando o balaio por um pão. Comeu o pão e ficou sem balaio, sem faca e sem cauda. Isso é mesmo o que se chama "negócio de macaco". E ainda acham que macaco é bicho ladino! — observou a menina.
— Não — disse dona Benta. — Nas histórias populares o mais ladino não é o macaco, sim a raposa e o jabuti. A raposa, ladiníssima, sai ganhando sempre. Chegou a ficar o símbolo da esperteza. Quando queremos frisar a manha dum político, dizemos: É uma raposa velha! E o jabuti, não sei por que, também ficou com fama de fino. O macaco, coitado, faz suas espertezas mas nem sempre sai ganhando. Esse de tia Nastácia, por exemplo. Lá foi, muito contente da vida, a comer o pão — mas não se lembrou de que estava sem cauda.
— Tolinho! — gritou Emília. — Quando for trepar a uma árvore é que verá a asneira que fez. Macaco sem cauda é macaco aleijado. Eles fazem na floresta aqueles prodígios de agilidade justamente por causa da cauda. Idiota!
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Continua… XXII – O Macaco e o Coelho
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Fonte:
LOBATO, Monteiro. Histórias de Tia Nastácia. SP: Brasiliense, 1995.
Este livro foi digitalizado e distribuído GRATUITAMENTE pela equipe Digital Source
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