CONHECIMENTO
Estamos todos enganados!
Pensamos que podemos enxergar...
Mas pela ilusão fomos picados.
Vivemos no escuro!
Sabemos pouco do passado,
só pensamos no futuro
e não vivemos nada do presente.
QUASE REBELDIA
Chega de versos melosos, caudalosos,
que acompanham os momentos
de desatino.
Rompi com o destino!
Mesmo os momentos amorosos
serão mais curtos e secos.
Navegarei mares incertos,
não terei medo de becos escuros,
de passar por grandes apuros
ou atravessar longos desertos.
Chega de versos saudosos, lamentosos,
que acompanham os momentos
de solidão.
Rompi com a emoção!
Os punhais serão mais racionais
e os romances serão mais mortais.
Enquanto viverem, os amores serão rasos
como raízes em vasos;
suas marcas serão superficiais
e jamais exalarão perfumes florais.
Os versos serão brancos e secos
como os vinhos e a noite fria,
que é estéril e nada cria.
Mas a criação, criatura ingrata
na folha esculpida,
desata a forma da vida
e revolta-se contra o criador,
chorando pelas entrelinhas
sob o ritmo romântico
das marchinhas.
Os versos saem cheios de amor provinciano
e abdicam da oportunidade
de tornarem-se poesia.
Para o criador,
nada de fotografia!
Talvez num outro dia
dê resultado a euforia
de sua quase rebeldia.
UM HOMEM POETA
Mergulhado em tristeza e solidão,
um homem escreve.
Versos ritmados? Não!
Escreve sobre seus dias,
contando horas vazias.
Escreve, com movimentos lentos,
palavras que tentam definir sentimentos.
É um poeta!
não porque escreve,
querendo escolher a palavra e a alegoria,
mas porque sonha,
perdido em ilusões e melancolia.
Um homem chora.
Chora por sua vida dura,
querendo esquecer uma amargura.
Chora como todo amante,
que já sofreu o bastante.
É um poeta!
Não porque escreve,
querendo escolher a palavra e os pontos,
mas porque ama,
perdido em solidão e desencontros.
Por isso escreve,
com o coração pequenininho,
querendo seu ninho.
Escreve porque está sozinho
e só o papel lhe dá carinho.
A PALAVRA É A SEMENTE
A palavra é a semente.
Cata grão, cata grão, cata não.
O sábio escolhe
e protege o grão
antes de levá-lo ao chão
e só planta com o coração.
Da semente impura, não
germinará o trigo-pão;
e depois de lançada,
ela não torna à mão.
A palavra é a semente.
Junta grão, junta grão, junta não.
O sábio separa o joio do trigo bom
e não semeia na escuridão;
o faz no branco do papel cartão,
retirando uma a uma
as ervas daninhas, que estragam a plantação.
AMOR PERDIDO
O coração fica magoado
quando relembra o passado.
Folha negra, virada;
fica o avesso.
Folha seca, levada;
fica o movimento,
o barulho do vento.
ESTRAGOS DE UMA TEMPESTADE DE AMOR
Uma enxurrada
de lágrimas
arrasou as margens
do meu coração.
Suas águas vermelhas
extravasaram
e inundaram –
como violenta tempestade –
todo o meu ser,
que não resistiu.
Corpo e alma sucumbiram
diante dos estragos.
Toda a estrutura desabou.
O que restou?
Não sei.
As perdas foram grandes,
irreparáveis.
Reconstruir?
Não sei se vale a pena.
Talvez demore
uma vida inteira.
RIDÍCULA
a Fernando Pessoa
Quando deixar de escrever cartas de amor,
deixarei de ser ridícula,
serei amarga.
Quando deixar de chorar por amor,
deixarei de ser ridícula,
serei seca.
Quando deixar de pedir seu amor,
deixarei de ser ridícula,
serei outra.
Quando aprender a fazer versos,
deixarei de ser ridícula,
serei Pessoa.
UM HOMEM SEM UM SONHO
Um homem que não sonha!
É como aquela velha cegonha,
que, embora livre,
voa pelo mundo
sem fugir do inverno,
sem chegar ao alto,
sem conquistar os céus.
Sem saber para onde ir,
sem saber o que buscar,
vai para onde é enviada,
com um destino já traçado
e uma carga predeterminada.
Sem tecer sua própria teia,
cansa de voar a vida alheia
e espera a tempestade trazer os ventos
que apagam os rabiscos de lamentos
que sempre carrega consigo
e, não tendo feito um grande amigo,
só ousa revelar às areias incertas
de praias tão desertas
como a vida,
que não tenta viver.
Fonte:
Olga Agulhon. O Tempo. Maringá: Midiograf, 2003.
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