segunda-feira, 19 de agosto de 2024

Vereda da Poesia = 88 =


Trova de Caicó/RN

PROFESSOR GARCIA

Mãe! quisera eu me deitar
junto à parede, aos teus pés.
adormecer e sonhar,
sentindo os teus cafunés.
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Poema de Pelotas/RS

CRISTINA CECCAGNO

(In) definição

procuro nas palavras de outras pessoas
algo que defina o que sinto por ti
pela insanidade que nos envolve
pela tua ausência

nada nos define
nada nos enquadra

procuro nas lembranças
uma pista do tempo que vivemos
do tempo que perdemos
e do que se perdeu ao longo do tempo

nada nos define
nada nos enquadra

procuro nos andarilhos
o movimento certo para seguir adiante
para acertar o passo
para dançar a música certa
para inventar um ritmo

nada nos define
nada nos enquadra

procuro a ti
nos mesmos lugares
e só te encontro dentro de mim
isso me define: tua
isso me enquadra: pra sempre.
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Trova de Curitiba/PR

NEI GARCEZ

Quando a vida fica tensa,
na iminência de um perigo,
como faz a diferença 
a presença de um amigo.
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Soneto sobre Cenas do Cotidiano

RICARDO CAMACHO
Rio de Janeiro/RJ

Dia de branco

No recomeço, à madrugada escura,
Em cumprimento do dever, sozinho,
Embalo os passos, surdos, no caminho,
Principiando a laboral ventura.

Em meio à suburbana arquitetura,
Adentro a multidão, em desalinho,
Que marcha resmungando bem baixinho
Como se encaminhando à sepultura...

As faces, fundos sulcos de canseira,
Evidenciam a segunda-feira
E o velho realismo suburbano...

Neste relato, a cena costumeira 
Traduz a romaria rotineira 
Dos proletários no cotidiano.
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Trova Premiada em Salinópolis/PA, 2005

EDUARDO TOLEDO 
Pouso Alegre/MG

Vaga o meu sonho ao luar,
num dilema permanente:
- Se pesca a estrela-do-mar...
- Se colhe a estrela cadente!
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Poema de Montenegro/RS

DENISE MULLER GARATEGUY

Todas as tuas cores

Tateio
Teus bolsos,
Encontro
Sementes
E
Nos teus olhos
Vejo
Encardidas ilusões
Há pedras
De todos os tipos
Segurando portas
Por sobre a mesa
Há os vasos de flores
De tomates
E
De pimentas
Há os gatos
Os livros
Os acordes
E as letras
A dura indecisão
Transbordando copos
E pensamentos

Os sonhos
Nos escapam...

Tua presença
Vinga-se
De mim
Na perfeição
De ser
Como
És
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Trova Popular

Quem me dera ser a hera
pela parede subir,
para chegar à janela
do teu quarto de dormir.
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Soneto sobre Cenas do Cotidiano

ELVIRA DRUMMOND
Fortaleza/CE

Poluição sonora

Buzinas e sirenes… britadeira! 
Quisera por o mundo “na surdina”
(recurso que o piano discrimina 
a matizar os sons, sobremaneira…)

No meio da avenida, a betoneira 
castiga meus ouvidos, me alucina…
(a rua dos meus tempos de menina
foi palco de avezinha cantadeira). 

Se agora adoto o tom de nostalgia, 
é fuga da audição que se arrelia
com o cruel triunfo do ruído… 

A música que a mídia, por capricho, 
impõe ao cidadão é puro lixo… 
Quisera, Deus, ter pálpebras o ouvido!
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Trova do Rio de Janeiro/RJ

LUIZ POETA
Luiz Gilberto de Barros

A vitória é de quem ganha,
quando vence a própria luta.
Só mesmo aquele que apanha,
dá mais valor à disputa.
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Poema de Porto Alegre/RS

GILBERTO MONTEIRO MAZOT

Cadafalso de mim

Trancado em meu baú de desejos, sonhos, loucuras,
Meu coração faz-me cadafalso de mim.

Atuando meu teatro interior,
Faz-me sorrir,
Aplaudir
Despedaçar-me de chorar por ti.

Contraceno no espelho a consciência inconsciente
de que teu desejo é meu desejo.
Desejo que se torna meu por incorporar tudo o que sente.

Se sente frio,
Frio eu sinto,
Se fome sente,
Sinto fome,
Se pensa em mim,
Teu amor me consome!
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Trova Humorística de São Paulo/SP

THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA

Num dos quadros se consterna...
vê o pintor... “mete o bedelho”:
- Que homem feio! Arte moderna?
- Não, meu senhor... é um espelho!
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Soneto sobre Cenas do Cotidiano

LUCÍLIA ALZIRA TRINDADE DECARLI
Bandeirantes/PR

Labor sem fim

Manhã de sol… cidade em movimento,
calçadas cheias, trânsito lotado
e em muitas mentes flui um pensamento: 
“chegar no emprego e o ponto, registrado.”

Trabalho e casa… nesta, pouco alento;
o banho do casal, não prolongado.
Cuidar dos filhos, roupas, alimento…
Novela e futebol?… No feriado!

Criança, o aposentado e o preguiçoso 
(um outro grupo, às vezes, ocioso),
desfrutam dos aromas de um jardim.

Na madrugada a pressa se esvazia…
Vem nova aurora, instiga à correria 
 e tal labor parece ser sem fim.
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Trova de Bauru/SP

HELVÉCIO BARROS
Macau/RN 1909 – 1995 Bauru/SP

Há caprichos diferentes 
em certas cartas lacradas: 
são os gritos contundentes 
das reticências caladas… 
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Poema de Sapucaia do Sul/RS

IONITA KÉSIA PEREIRA

Não se afaste de mim

Não se afaste de mim
Além de meu olhar

Não se declare com ardor
Além do “eu te amo”

Não cesse seu carinho
Além de um abraço

Não se desnude em você
Além de sua alma

Não dê causa à embriaguez
Além de meus beijos

Não se revele em cores
Além de seus sonhos

Não queira estar comigo
Além de um momento chamado sempre

E não esperarei de você
Além de seu amor por mim.
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Trova de de Magé/RJ

REGINA CÉLIA ANDRADE

O criador do universo
tendo o belo como tema,
pôs em cada estrela um verso
e fez da noite um poema.
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Soneto sobre Cenas do Cotidiano

ARLINDO TADEU HAGEN
Juiz de Fora/MG

Os sons da madrugada

Um som parece vir da casa ao lado,
uma TV, um rádio, uma vitrola,
demonstrando que alguém está acordado,
sofrendo a mesma insônia que me assola.

Ao longe um galo doido cantarola,
num ritmo repetido e alucinado.
Mais longe ainda, o som de uma viola
dá voz a um coração apaixonado.

Enquanto os gatos miam namorando,
eu sigo em minha cama reparando
um bando de cachorros a latir.

Nasce o dia... os ruídos da alvorada
vão abafando os sons da madrugada
de quem passou a noite sem dormir.
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Trova Premiada em Salinópolis/PA, 2005

IZO GOLDMAN  
Porto Alegre/RS, 1932 – 2013, São Paulo/SP

Brigaram o céu e o mar,
ficaram "de bem" depois,
quando Deus os fez parar,
dando estrelas para os dois!!!
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Poema de Pelotas/RS

ISABEL CRISTINA SILVA VARGAS

Louvação

Cantam os pássaros
Saudando o sol
A vida que aqui transborda.
Ao seu canto
Acrescento minha prece
Cheia de amor e saudade
Louvando tua preciosa vida
Que a todos encantou.
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Trova de Maringá/PR

A. A. DE ASSIS

Procura-se ortopedista,
de preferência letrado,
pra vaga de especialista
em versos de pé quebrado…
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Poema de Cachoeirinha/RS

MARCELO ALLGAYER CANTO

Quem é você?

Quem é você?
Que acalma meu coração
Pelo sabor de todas as noites
Seja em qualquer estação.

Quem é você?
Que com sua simplicidade
Me mostra a possibilidade
De um viver despreocupado
Regado pelo amor.

Quem é você?
Que não precisa me procurar na noite,
Pois me encontra dia a dia
Sem clamor, mas com a vida ganha.

Quem é você?
Que me conquistou pela paciência
Seguindo meus passos “descalçados”
Pelas ilusões de meus dias.

Quem é você?
Que ratificou meus caminhos
Com seus doces e suaves carinhos
Me salvando dos despropósitos.

Quem é você?
Você é a minha amada!
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Trova de Pedro Leopoldo/MG

WAGNER MARQUES LOPES

Pessoa determinada,
de fé honrosa e esplendente,
sempre faz de um quase nada
um brilhante continente!
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Hino de João Pessoa/PB

No nordeste do Brasil te encontramos
Onde vemos o encanto de um verde mar
És a terra gloriosa que amamos
E o teu nome exaltamos a cantar
De um grande presidente de estado
Tu ressurgiste, ó, cidade vitoriosa!
Se tens o nome pelas ondas do passado
Não deixarás de ser sempre valorosa

Tua bandeira simboliza o heroísmo
De um exemplo imortal
Que em teu nome ficou
E no grito do nego
Defendeu o teu povo rebelde
E te glorificou

No passado, outros nomes recebeste
Consagramos o teu solo, sempre a exaltar
A bravura e a nobreza não perdeste
João pessoa, tu és hoje, a vibrar
Teus combates sempre foram triunfantes
E o heroísmo a história nos declara
E evocando teus primeiros habitantes
Tu serás sempre a cidade tabajara

Tens palmeiras no teu parque mais formoso
A lagoa circulando sempre a inspirar
O poeta decantando orgulhoso
Vem fazer tua beleza proclamar
Tão formosas as acácias que se espargem
Em ornamento pelas tuas avenidas
São tantas flores escondendo a folhagem
Deixando enfim, tuas árvores floridas

Tambaú trazendo a brisa mansamente
Num afago que nos prende sob o céu anil
E o soberbo cabo branco evidente
Na paisagem litorânea do Brasil
Nos teus mares as jangadas velejando
No horizonte vem o sol resplandescente
Quanta grandeza que encerras inspirando
No teu valor consagrado eternamente!
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Trova de Curitiba/PR

MAURÍCIO NORBERTO FRIEDRICH
Porto União/SC, 1945 – 2020, Curitiba/PR

Plácido, corres no leito,
às margens, onde nasci;
ó Iguaçu, trago em meu peito
a água que é parte de ti!
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Soneto sobre Cenas do Cotidiano

JÉRSON LIMA DE BRITO
Porto Velho/RO

Os portais

O refletor celeste, ao fim da lida,
deitado sobre densos matagais,
expande o louro abraço e dá sinais
de sua majestosa despedida.

As águas, de beleza desmedida,
à espera das pinturas noturnais,
transformam as correntes em portais
por onde passa a luz enfraquecida.

Um barco, a deslizar no espelho, adorna
a tarde morrediça, ainda morna,
repleta de magia, graça e encanto.

O rio encanta todas as retinas
que enlaçam as imagens vespertinas,
justificando os versos deste canto...
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Trova de Fortaleza/CE

FRANCISCO PESSOA 
FRANCISCO JOSÉ PESSOA DE ANDRADE REIS
Fortaleza/CE, 1949 - 2020

Ciúme é como se fosse
um veneno sedutor:
amargo, se mostra doce,
matando aos poucos o amor.
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Fábula em Versos da França

JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry, 1621 – 1695, Paris

Os ladrões e o asno

Brigavam dois ladrões por um roubado burro:
Com ele um quer ficar, quer outro expô-lo à venda.
E enquanto a discussão entre ambos corre a murro,
Terceiro vem que empolga a causa da contenda.

Não raro uma província ao burro é semelhante,
E uns príncipes quaisquer, iguais aos salteadores:
O Turco, o Transilvano, o Húngaro — em que instante,
Em vez de dois que busco, eis três dos tais senhores!

Abunda esta fazenda — embora com frequência
Nenhum lograr consiga a terra conquistada,
Se vem quarto ladrão que rindo da pendência
Cavalga no jumento e aos três dá surriada.

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