segunda-feira, 12 de agosto de 2024

Sílvio Romero (O irmão caçula)


(Folclore do Pernambuco)

Havia um homem que tinha três filhos: João o mais velho, o outro Manoel e o caçula José. 

Todos eles se revoltaram contra o pai. Fugiram João e Manoel e ficou José. 

O pai o botou à procura dos irmãos. José ganhou o mundo e foi ter à casa de uma velha, que lhe disse: “Meu netinho, você o que anda fazendo por estas alturas?” 

— “Minha avó”, respondeu ele, “venho buscar meus irmãos que fugiram de casa de meu pai e ele quer que eu os descubra.” 

— “Pois dorme, meu netinho, que eu os farei te acompanhar.” 

No outro dia a velha, depois de lhe dar de comer, disse que ele fosse ao Reino das Três Pombas, onde encontraria os dois irmãos, porque havia ali uma grande festa para se tirar por sorte quem devia desencantar as três pombas, que estão dentro do mar. “Leva”, disse a velha, “esta vara e esta esponja com muito cuidado para que ninguém veja, porque teus irmãos te hão de caluniar ao rei, dizendo que tu te gabaste de ir ao fundo do mar quebrar a pedra e desencantar as três princesas. O rei te há de chamar, e tu deves sustentar que sim. Vai então à praia do mar e atira nele a esponja, a esponja há de boiar e a seguir, tu deves acompanhá-la; vai com a varinha e toca na pedra, que se partirá pelo meio, há de te aparecer uma serpente, toca com a varinha nela e ela há de adormecer; entra pela pedra adentro e tira de lá uma caixa, toca com a vara na caixa que há de se abrir, tira de dentro um ovo, este ovo tem três gemas, quando o quebrares dá a clara à serpente.” 

José foi e fez tudo quanto a velha lhe ensinou. Chegando ao reino viu lá a grande festa: por estar mal pronto os irmãos fingiram que o não conheciam, e trataram de intrigá-lo, dizendo ao rei que ele se atrevia a desencantar as princesas. O rei o mandou chamar e lhe perguntou. 

“Saberá, rei, meu senhor, que eu não disse tal, mas se o rei, meu senhor, assim o ordena, eu estou pronto.” 

Todos ficaram admirados e duvidavam. No outro dia apresentou-se ele para seguir, e o rei mandou pôr navios à sua disposição. Ele disse que não os precisava, porque iria a nado. Todos acharam impossível ir nadando até à pedra. Mas o José largou no mar a esponja e seguiu com ela até a pedra. Bateu nela com a varinha e ela se abriu, apareceu a serpente, bateu também nela e ela adormeceu. Bateu na caixa e ela se abriu, tirou o ovo e partiu, botou a clara na boca da serpente e as três gemas no chapéu e largou-se para trás. Chegando na praia bateu com a varinha nas três gemas, que se transformaram nas três moças mais bonitas do mundo. 

Chegando a palácio todos se admiraram da sua coragem. Ainda lhe levantaram os irmãos nova cal[unia, dizendo que o José tinha dito que era capaz de ir buscar no mar a própria serpente. Ele foi, fez o mesmo com a esponja e a varinha e trouxe a serpente. Como ainda quisessem mangar com ele, tocou com a vara em todos a começar pelo próprio rei, e os fez adormecer.

Mandou então agarrar os irmãos e levá-los a seu pai. 

O rei, quando voltou a si, mandou casar o José com a mais bonita das princesas. Ele tocou com a vara em todos os presentes e os fez adormecer. Mandou buscar o pai e os irmãos, casou estes com as outras duas princesas, e ficaram todos vivendo juntos.

Fonte: Sílvio Romero. Contos populares do Brasil. Publicado originalmente em 1885. Disponível em Domínio Público.

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