quarta-feira, 28 de agosto de 2024

Vereda da Poesia = 96 =


Trova de Pouso Alegre/MG

EDUARDO A. O. TOLEDO

Feito uma estrela vadia
que brilha até na alvorada,
sou filho da boêmia
e neto da madrugada!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Poema de Lisboa/Portugal

ANTERO JERÓNIMO

Eros

À luz da vela titubeante
pasmado pela ciência dos antigos
convoco-te, deus do amor
ao palácio da minha ousadia
em concílio de desesperança

Não mendigo ambrósia e néctar
nem as graças do teu acolhimento
pois sou insignificante mundano
perdido no seio da adversidade

Desfecha tuas setas certeiras
no coração do homem descrente
de deuses de honra e de amor

Penetra no coração empedernido
ferindo de morte a cobiça vil
entorpecida em iludido sono estígio

Que a beleza da lenda
torne da razão a fantasia

Que o puro sentimento peregrino
seja conduzido nos braços
servis do gentil zéfiro
levando o mesquinho rastejar
à imortalidade alada da alma.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova Humorística de Santos Dumont/MG

MÁRIO LUIZ RIBEIRO

Vendo o moço correr tanto,
julguei ser um campeão,
mas, foi grande o meu espanto
quando ouvi: - Pega o ladrão!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Soneto de Magé/RJ

BENEDITA AZEVEDO

Vendaval

O vento frio açoitando meu rosto
Penetra na pele, mas também na alma
Fico parada só  a contra gosto
Querendo muito que a mim tragas calma.

A doença não há de me vencer
Tenho amigos com quem posso contar
Para tanto busco o que  merecer
Busco alívio e meto-me a trabalhar.

Os trovões retumbando ao longe trazem
Insegurança, inquietação e fazem
A angústia, a saudade da pátria aflorar.

Lá fora ruge o vento inquietante
Assustando o coração desta imigrante
Despertando o ensejo de à pátria voltar.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova Premiada em Belém/PA, 2005

SÉRGIO BERNARDO 
Nova Friburgo/RJ

Descrente dos bens terrenos,
chego à tardia certeza
de quanto foram pequenos
meus delírios de grandeza...
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Poema de Campina Grande/PB

DANIEL RODAS

Descriação 

às vezes passo dias
procurando a palavra certa
o rumo certo

vasculho dicionários estéreis 
mergulho 
em versos frios e obscuros

mas nada encontro: nenhuma
semente do que queria
dizer

e o que me resta é olhar pela
janela

os bem-te-vis plantando flores
nos seus ninhos.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova Popular

Bateram, abri por dó;
era a desgraça que entrou.
Fez-lhe pena ver-me só
e nunca mais me deixou.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Soneto de de Santos/SP

CAROLINA RAMOS

Vila dos Andradas

Nasci naquela vilazinha feia, 
sem árvores nem flores nas calçadas.
Rua? Perdão! Errei se assim chamei-a, 
era apenas a Vila dos Andradas.

Saí criança e não voltei. Lembrei-a,
saudosa das cirandas nas calçadas.
Foi lá, que eu aprendi que a lua cheia
era a Mansão dos Sonhos e das Fadas!

Não mais existe a minha velha Vila,
mas, pobre e triste, seu passado atesta
que nela havia luz que ainda cintila

a ultrapassar os sóbrios horizontes:
- Naquela Vila, plácida e modesta,
viveu, rimou o nosso Martins Fontes!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova do Rio de Janeiro/RJ

LUIZ POETA
Luiz Gilberto de Barros

Cada rastro no caminho
nos mostra novo trajeto,
mas Deus nos dá, com carinho
o caminho predileto.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Spina de São Paulo/SP

SOLANGE COLOMBARA

Noite de inverno 

Decanto teus versos
em suaves nuances,
aquecendo a poesia 

que existe na noite fria.
Sinto os ecos do vento
açoitando no ar, tua ira.
Ouço o silêncio do luar,
sorrio... Ele é meu guia.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova Humorística de São Paulo/SP

THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA

Pedir votos, não foi "canja"!
Um político safado
criou confusão na granja
e saiu "ovocionado!?
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Soneto de de São Paulo/SP

HUMBERTO – POETA
Humberto Rodrigues Neto

Flagelo

Do passado não deixes que a lembrança
te ponha o peito em pranto a flagelar
para a noite da dor não apagar
o antigo sol dos tempos de bonança.

Procura um outro amor pela esperança
de novas alegrias desfrutar,
pois diz velho provérbio popular
que aquele que algo espera sempre alcança.

Limpa da mente aquele antigo rosto
que agora só te traz mágoa e desgosto
e afasta da tua vida esse flagelo!

Varre, pois, da tua alma o sofrimento,
apaga da lembrança esse tormento
e exuma dela esse já morto anelo!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova de Niterói/RJ

JORGE PICANÇO SIQUEIRA
Macaé/RJ, 1930 – 2006, Niterói/RJ

Todos dizem que saudade
é lembrança que se sente,
mas saudade, na verdade,
é saudade simplesmente.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Poema de Curitiba/PR

RITA DELAMARI

Luminescência

Noite longa e misteriosa,
e o silêncio me consome...
Apareces por trás das nuvens,
fica a observar-me de longe.

Com teu brilho prateado,
banhas o céu totalmente.
Brincas de esconde-esconde,
que até parece se divertir.

Teimosa, se fazes presente,
e sorri bem sorrateira!
Conversas comigo, não queres partir
Solidão, não é mais companheira.

Consegues enxugar-me o pranto,
preenches todo meu pensamento.
Percebes que a ti tenho encanto!
Sabes como ninguém, seduzir.

Então, sem pedir licença
acalma a minha noite,
domina os meus sonhos...
Derrama sobre mim, sua luz!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova de Campinas/SP

ARTHUR THOMAZ

No momento da partida,
o beijo cala um adeus
e uma lágrima incontida
vem molhar os lábios teus.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Soneto de São Paulo/SP

FILEMON MARTINS

O Andarilho

“Não me fale de amor”, alguém me disse,
“o amor morreu, já não existe mais”.
E eu retruquei que aquilo era tolice,
– será pecado alguém amar demais?

Ficou parado ali, talvez me ouvisse
que o amor perdoa e espera, sem jamais
querer em troca o favo da meiguice
que perpetua a vida entre os casais.

O tempo foi passando e pela rua
eu vi aquele vulto olhando a lua
perambulando como um peregrino.

E percebi, então, que aquele rosto
marcado pela dor, pelo desgosto,
nunca teve um Amor em seu destino!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova Premiada em Belém/PA, 2005

VANDA FAGUNDES QUEIROZ 
Curitiba/PR

Atrás dos sonhos correndo,
no meu delírio sem fim,
eu acabei me esquecendo
de passar perto de mim...
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Poema de Curitiba/PR

DANIEL MAURÍCIO

Desavisado
Trazia um beijo antigo 
Guardado no peito 
Mas ao te ver com outro
Fiquei tão sem jeito 
Que deixei que o beijo 
Caísse no chão.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova de Saquarema/RJ

JOÃO COSTA

O tempo que tudo apaga,
  promovendo o esquecimento,
  em vez de apagar afaga
  teu nome em meu pensamento.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Soneto de Caicó/RN

PROFESSOR GARCIA

Ilha de Sant’Ana

Tua origem, de fato, ninguém sabe,
mas nasceste das cinzas deste pó;
Ilha amada, em teu ventre, tudo cabe,
aos sussurros do velho Seridó!

Que teu nome, no tempo, não desabe,
nem te deixem viver assim tão só;
que o teu canto de amor, nunca se acabe,
ante o olhar de Sant'Ana, nossa avó!

Sob as bênçãos de nossa padroeira,
e os arpejos de cada cachoeira,
que deságua nas terras deste chão...

Quando o rio, de verde se reveste,
tens a imagem mais pura do Nordeste,
e és a Ilha mais linda do sertão!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Quadra de São Paulo/SP

IDEL BECKER
Porto Casares/ Argentina (1910 – 1994) São Paulo/SP

Você diz que sabe muito,
há outros que sabem mais;
há outros que tiram pomba
do laço que você faz.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Hino de Matinhos/PR

Ó berço romântico, de ingênuo fulgor.
Ó filha do Atlântico, ó paraíso em flor.
Na calma que anseias, escrínio do mar.
As tuas sereias são joias sem par.

Princesa do mar, de amenos caminhos.
Eu quero cantar tuas glórias Matinhos.

Na azul madrugada, tu a cintilar.
És sonho de fada que o sol faz dourar
Nas noites serenas, secreto rumor.
Escuta-se apenas, o mar teu cantor.

Princesa do mar, de amenos caminhos.
Eu quero cantar tuas glórias Matinhos.

Doçura sem conta, propício rincão.
Oásis que aponta a vasta amplidão
Teu mar sem fronteiras, excelso e viril.
Em ondas brejeiras, te beija sutil.

Princesa do mar, de amenos caminhos.
Eu quero cantar tuas glórias Matinhos.

Seus torvos cuidados, ó praia feliz.
Em ti namorados passeiam tão gentis.
Com rútila vida, mais bela não há.
Matinhos querida, gentil Caiobá.

Princesa do mar, de amenos caminhos.
Eu quero cantar tuas glórias Matinhos.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Triverso de Curitiba/PR

VANICE ZIMERMAN

fim de tarde -
sutil gota d’água
na folha seca.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Poema de Curitiba/PR

SONIA CARDOSO

Retinografia 

A névoa é densa 
Bastões longos e finos 
- Fixe o xis 
Laranjas e citrinos sobem 
E descem vertiginosos 
Aumentando a náusea 
Repentinamente a sensação 
Cessa dando lugar ao 
Caleidoscópio multicor 
Alabares delgados entopem 
As narinas em prata e rubi 
E as estrelas vem ao meu encontro.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova de Natal/RN

JOAMIR MEDEIROS

A natureza agredida
por queimadas criminosas,
perde os encantos da vida,
perde a beleza das rosas!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Fábula em Versos da França

JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry, 1621 – 1695, Paris

O carvalho e a cana

«Teu ser bem pouco à natureza deve!
— Disse o carvalho à cana.—
O pássaro mais leve,
Se pousa sobre ti, logo te abana;
Um ligeiro soprar
Que a face encrespa do regato, apenas,
Faz-te logo vergar
E obriga-te a sofrer bem duras penas;
Enquanto eu ergo a fronte com vaidade,
Do Sol detenho o raio
E afronto a tempestade!
Todo o vento é me um zéfiro de maio,
Para ti todo o vento é vendaval!
Se da minha ramada
Nascesses abrigada,
Não sofrerias um tamanho mal.
O fado foi contigo muito injusto!...
— A tua compaixão,
Lhe respondeu o arbusto,
Abona o teu sensível coração;
Mas tanto não te mates
Chorando as minhas penas:
Melhor que tu, do vento sofro embates;
Não quebro, dobro apenas.
Tens resistido a rígidas nortadas...
Porém atrás do tempo, tempo vem!»
Tais vozes acabadas,
Bóreas em seus furores se despica;
A pobre cana dobra,
Firme o carvalho fica.
Ativa Bóreas a feroz manobra,
Faz tão cruenta guerra,
Que deita enfim por terra
Quem com a fronte nos astros topetava
E no abismo as raízes ocultava!

Não consegue o seu fim na estância térrea
Quem tudo quer levar à virga-férrea;
E é de crer que bem pouco se moleste
O que se abaixa quando a onda investe.

Nenhum comentário: