sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

José Feldman (Godofredo)

Era uma noite típica no Condomínio Parque das Flores, e a sala de reuniões estava cheia. Moradores de todas as idades se acomodavam nas cadeiras, ansiosos para discutir as reformas necessárias no condomínio. Mas, como sempre, havia uma nuvem ameaçadora pairando sobre a reunião: Godofredo, o morador do prédio que era um “chato de galochas”.

Dona Rita, a síndica, começou a reunião com um sorriso nervoso.

— Boa noite a todos! Hoje, vamos discutir a reforma da piscina. O que vocês acham de reformá-la e deixar mais agradável?

— Olha, eu não sei se isso é uma boa ideia — interrompeu Godofredo, levantando a mão como se estivesse em sala de aula. — A piscina já é um foco de problemas!

— Como assim, Godofredo? — perguntou Marta, uma mãe de dois filhos. — A piscina é um lugar de lazer!

— Exatamente! E onde tem lazer, tem acidente! — rebateu Godofredo, cruzando os braços. — E quem vai limpar todo aquele cloro?

— A gente contrata alguém, Godofredo! — disse Jorge, o morador mais jovem, com um sorriso cansado.

— E quanto isso vai custar? — Godofredo insistiu. — Aposto que vai aumentar o nosso condomínio!

Marta, já sem paciência, respondeu:

— Godofredo, uma piscina reformada pode aumentar o valor dos apartamentos!

— Ah, mas será que alguém vai querer comprar um apartamento em um prédio com piscina? — questionou Godofredo, provocando risadas nervosas entre os presentes.

Dona Rita tentou mudar de assunto.

— Ok, vamos para o próximo item: a reforma do salão de festas. O que vocês acham?

— Eu sou contra! — gritou Godofredo. — O salão já é um lugar cheio de barulho. Reformar só vai piorar!

— Mas o salão está caindo aos pedaços! — ressaltou Ana, uma adolescente que estava na reunião. — Não dá pra fazer festas lá!

— E quem disse que precisa de festas? — retrucou Godofredo. — As festas só atraem mais gente barulhenta!

Carlos, um senhor simpático, tentou apaziguar a situação:

— Godofredo, também precisamos nos divertir, não acha?

— Divertir-se é só uma forma de gastar dinheiro! — disse Godofredo, com um tom de desdém. — E depois, vem a limpeza!

— Godofredo, você é o único que vê tudo pelo lado negativo! — exclamou Dona Rita, já exasperada.

— Não, não sou! Eu sou o único que vê a verdade! — defendeu-se Godofredo, com um gesto dramático.

Dona Rita, tentando manter a ordem, passou para o próximo tópico.

— Vamos discutir a reforma do elevador. Ele está muito antigo e precisa de melhorias.

— E se ele quebrar durante a reforma? — perguntou Godofredo, levantando a mão novamente. — E se a gente ficar preso lá dentro?

— Godofredo, isso é um risco que corremos com o elevador velho também! — respondeu Jorge. 

— Mas a situação atual é familiar. A reforma pode trazer riscos desconhecidos! — insistiu Godofredo.

— Riscos desconhecidos? — riu Marta. — Você assiste muitos filmes de terror, Godofredo?

— E você não deveria subestimar o que não conhece! — retrucou Godofredo, ofendido.

Ana, já cansada, interveio:

— Godofredo, você é como um aplicativo de previsão do tempo que só diz que vai chover! Às vezes, precisamos de sol!

Todos riram, mas Godofredo não se deixou abalar.

— E quem vai pagar a conta das reformas? — continuou ele. — Aposto que vai ser a gente! 

Carlos, tentando mudar o clima, sugeriu:

— Que tal fazermos uma vaquinha para as reformas?

— Uma vaquinha? — exclamou Godofredo. — Isso é um plano horrível! E se a vaca não der leite?

— Godofredo, você sabe que isso é uma expressão, certo? — disse Jorge, rindo.

— É, mas eu não gosto de expressões! Elas complicam a comunicação! — respondeu Godofredo, como se fosse o porta-voz da lógica.

Dona Rita, já sem saber como lidar, anunciou:

— Ok, se todos concordam com a reforma do salão, vamos votar.

— Ah, mas eu sou contra! — gritou Godofredo. — E quem vai garantir que a reforma vai ser bem feita?

— Nós vamos acompanhar, Godofredo! — afirmou Marta. — E temos um arquiteto!

— E se o arquiteto não souber o que está fazendo? Estamos todos perdidos! — disse Godofredo, gesticulando dramaticamente.

— Godofredo, você sempre vê o lado ruim de tudo! — exclamou Carlos, já irritado. — A gente precisa de melhorias!

— Com certeza, você é o único que não quer! — respondeu Marta.

Dona Rita, percebendo que a reunião estava se transformando em um debate sem fim, decidiu tomar uma atitude drástica.

— Olha, Godofredo, talvez seja melhor você não participar mais dessa reunião.

— Como assim? — disse Godofredo, perplexo.

— Você está expulso! — anunciou Dona Rita, com um sorriso firme. — Na próxima, vamos deliberar sem você!

Godofredo ficou em silêncio, mas seu olhar demonstrava que ele ainda ia arranjar um jeito de contestar essa decisão.

— Vocês vão se arrepender! — foi a última coisa que ele disse, enquanto saía da sala, deixando os moradores aliviados.

Mas não parou por aí, quando a reunião terminou, com seu ar de resistência, ele se dirigiu ao parquinho onde alguns moradores estavam, e aproximando-se de um grupo.

— Olá, vizinhos! Vocês têm um momento para falar sobre as reformas?

— Godofredo, estamos tentando aproveitar o dia. O que você quer? – Marta balançou a cabeça.

— É só uma conversa rápida. Eu acho que precisamos nos unir contra essas reformas. Elas vão acabar com a tranquilidade do nosso condomínio!

— Como assim, Godofredo? O que há de errado com as reformas? – disse Carlos, curioso.

— Pensem bem! A piscina vai ser mais barulhenta, o salão de festas vai atrair mais gente estranha e, no final das contas, vamos gastar um monte de dinheiro! – Godofredo gesticulava.

— E o que você sugere? Ficar tudo como está?

— Exatamente! O antigo é seguro! O novo é um risco! Vamos preservar a nossa paz!

Jorge interveio. 

— Mas Godofredo, a paz que você defende é a mesma que a gente já não tem? O salão está caindo aos pedaços!

— E se a reforma trouxer barulho, e se o elevador quebrar? Vamos ficar presos lá dentro! Olhem, eu sei que vocês pensam que sou chato, mas eu só quero o melhor para todos nós! – Godofredo falou com um olhar dramático

Marta, cruzando os braços, disse: — O melhor é ter um espaço agradável para as crianças brincarem e para a gente se reunir. Não dá para viver no passado!

Godofredo insistiu: — Mas e se essas crianças fizerem barulho? E se os pombos voltarem? Vocês não estão pensando nas consequências!

— Godofredo, você sempre traz os pombos para a conversa! – disse Carlos, sorrindo.

— E quem vai limpar isso? Pensem no trabalho extra!

Ana falou brincando: — Godofredo, você deveria ser advogado. Tem talento para convencer as pessoas a não fazer nada!

— Então, o que me dizem? Vamos juntos? Podemos fazer um abaixo-assinado!

— E colocar “não à diversão” no título? – disse Marta, rindo.

Carlos entrou na brincadeira: — Ou “protetores dos pombos”?

— Não, não! É sério! Precisamos nos unir!

— Godofredo, a verdade é que a maioria já decidiu. Você pode tentar, mas a mudança vai acontecer, com ou sem você.

Godofredo suspirou: — Então, vocês vão me deixar sozinho nessa?

Marta falou com deboche — Não, Godofredo. Você sempre terá a companhia dos pombos!

Os moradores riram, enquanto Godofredo, derrotado, cruzou os braços e observou o grupo se afastar, ainda conversando animadamente sobre as reformas. Ele murmurou para si mesmo, já pensando em seu próximo plano para tentar mudar a opinião dos vizinhos.
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JOSÉ FELDMAN nasceu na capital de São Paulo. Formado em patologia clínica, não concluiu o curso superior de psicologia. Foi enxadrista, professor, diretor, juiz e organizador de torneios de xadrez a nível nacional durante 24 anos; como diretor cultural organizou apresentações musicais; trovador da UBT São Paulo e membro da Casa do Poeta “Lampião de Gás”. Foi amigo pessoal de literatos de renome (falecidos), como Artur da Távola, André Carneiro, Eunice Arruda, Izo Goldman, Ademar Macedo, Hermoclydes S. Franco, e outros. Casado com a escritora, poetisa e tradutora professora Alba Krishna mudou-se em 1999 para o Paraná, morou em Curitiba e Ubiratã, radicou-se definitivamente em Maringá/PR em 2011. Consultor educacional junto a alunos e professores do Paraná e São Paulo. Pertence a diversas academias de letras e de trovas, como Academia Rotary de Letras, Academia Internacional da União Cultural, Academia de Letras Brasil-Suiça, Academia de Letras de Teófilo Otoni, Confraria Brasileira de Letras, Confraria Luso-Brasileira de Trovadores, Academia Virtual Brasileira de Trovadores, União Brasileira dos Trovadores, etc, possui o blog Singrando Horizontes desde 2007, com cerca de 20 mil publicações. Atualmente assina seus escritos por Campo Mourão/PR, onde pertence a entidades da região. Publicou mais de 500 e-books. Dezenas de premiações em trovas e poesias.

Fontes:
José Feldman. Peripécias de um jornalista de fofocas & outros contos. Maringá/PR: I. A. Plat. Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul.
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing 

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