sexta-feira, 31 de outubro de 2025

Monsenhor Orivaldo Robles (Compra-se um pai)


Muitos talvez conheçam a história que, faz tempo e não me lembro onde, li sobre um garotinho de orfanato. Quando aparecia uma visita, ele corria-lhe ao encontro com papéis recortados em forma de cédulas, e os oferecia, pedindo: “Tó meu dinheiro, compra um pai pra mim”.

A cena, mesmo imaginada, comove pela inocência e dor do pedido. Calcule-se o espanto do embasbacado visitante. Surpreendeu-me o pedido por um pai. Acostumamo-nos à ideia de que filho sente mais a ausência da mãe. Talvez o orfanato fosse dirigido por religiosas que, muitas vezes, oferecem amor mais completo que mãe biológica. Esta, quem sabe, não fizesse tanta falta à criança.

O avanço científico dos últimos tempos tem conhecido uma escala que parece autorizar-nos a jogar fora certezas tidas, até aqui, por inabaláveis. De repente, nos vemos tão evoluídos nas ciências que passamos a desprezar lições, antes sagradas.

Dia dos Pais era uma data respeitosa, criada para homenagear aquele que, desde os albores da vida, garante segurança e ternura. Hoje, sob tanta propaganda de incentivo ao consumo, nos tornamos vítimas de mais uma das muitas armadilhas que o mercado cria para enganar os trouxas que somos. O erro está não em festejar os pais, mas em fazer do seu dia só data de faturamento maior para o comércio.

Não obstante todas as transformações, não é exagero dizer mais uma vez: pai é necessário. Não só para gerar o filho, mas para viver ao seu lado num grupo humano permanente e responsável, chamado família.

Ao lado da mãe, a presença física, estável e amorosa do pai é exigência básica para equilíbrio emocional e desenvolvimento sadio da personalidade de qualquer criança. São falaciosas - e a vida o tem cabalmente comprovado - as propostas de modelos diferentes. Dispensar a família por inútil, como resquício de organização social imperfeita e transitória, demonstra ignorância bem mais que conhecimento. Sem medo de receber a pecha de atrasado, continuo a entendê-la como construtora do futuro da humanidade.

Vai tornando-se “normal” a ausência física do pai e a desnecessidade de uma família indissolúvel com marido, mulher e filhos. Cresce, entre muitos que se consideram evoluídos cultural, intelectual ou economicamente, a convicção de que o momento exige novos modelos, em que cada pessoa assuma o que lhe parecer mais conveniente. Sem um referencial objetivo a ser observado que, para eles, não existe.

“Pelos frutos se conhece a árvore”, ensinou o Senhor. Basta ver que sociedade vamos produzindo nestes tempos. Uma das causas tem sido a diluição da família de moldes cristãos, formada na observância dos valores essenciais da natureza humana.

Crer que absolutamente tudo até aqui ensinado tenha que ser virado de pernas para o ar não traz a felicidade nem a paz desejadas. Apenas intensifica a desgraça que pretende corrigir.

O erro está não na família, mas no coração da pessoa. Ele é que precisa mudar. Só que isso custa. Mais fácil é atirar pedras na família. Não dá trabalho. Não exige responsabilidade. Nem transformação interior, que é difícil pra burro.
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Monsenhor Orivaldo Robles nasceu em Polôni (SP) em 1941. Estudou em Jales e Poloni e ingressou no Seminário Nossa Senhora da Paz, em São José do Rio Preto, em 1953. Cursou Filosofia em Curitiba (PR), graduando-se na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, de Mogi das Cruzes SP, com diploma reconhecido pela USP, São Paulo. Graduou-se em Teologia no Studium Theologicum de Curitiba, afiliado à Pontifícia Universidade Lateranense, de Roma. Lecionou no Colégio Estadual Dr. Gastão Vidigal, e no Instituto de Educação, em Maringá (PR) (1967-1969). No Colégio Estadual e na Escola Normal de Paranacity (PR) (1970-1972). Por quase onze anos trabalhou como pároco de Marialva, de onde saiu no início de 1983 para assumir, por seis anos, o cargo de reitor do Seminário Arquidiocesano Nossa Senhora da Glória – Instituto de Filosofia de Maringá. Em 1989 assumiu a Paróquia Santa Maria Goretti, em Maringá, onde trabalhou por mais de 20 anos. Desde 2009, trabalhou na Catedral Metropolitana de Maringá, exercendo a função de vigário paroquial. Foi palestrante convidado a discorrer, em colégios ou outros núcleos humanos, sobre temas ligados à cidadania, formação pessoal e sobre ética pessoal ou pública. Em 2012 teve publicado o livro “Celeiro Desprovido”, com 270 páginas, contendo 118 crônicas e artigos escritos desde 1995. Em 2017, foi publicado o livro dos 60 anos da Diocese de Maringá. Foi articulista mensal ou semanal, por mais de quinze anos, de jornais editados em Maringá, além de ter matérias reproduzidas em revistas ou blogs da região.Faleceu de enfisema pulmonar, em 2019, em Maringá/PR.
Fontes:
Recanto das Letras do autor. 23.01.2012.
https://www.recantodasletras.com.br/cronicas/3456457
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing  

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