foi mantida a grafia original.
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OS PALHAÇOS
Heróis da gargalhada, ó nobres saltimbancos,
Eu gosto de vocês,
Porque amo as expansões dos grandes risos francos
E os gestos de entremez,
E prezo, sobretudo, as grandes ironias
Das farsas joviais.
Que em visagens cruéis, imperturbáveis, frias.
À turba arremessais!
Alegres histriões dos circos e das praças,
Ah, sim, gosto de vos ver
Nas grandes contorções, a rir, a dizer graças
De o povo enlouquecer,
Ungidos pela luta heroica, descambada,
De giz e de carmim,
Nas mímicas sem par, heróis da bofetada,
Titãs do trampolim!
Correi, subi, voai num turbilhão fantástico
Por entre as saudações
Da turba que festeja o semideus elástico
Nas grandes ascensões,
E no curso veloz, vertiginoso, aéreo,
Fazei por disparar
Na face trivial do mundo egoísta e sério
A gargalhada alvar!
Depois, mais perto ainda, a voltear no espaço,
Pregai-lhe, se podeis,
Um pontapé furtivo, ó lívidos palhaços,
Luzentes como reis!
Eu rio sempre, ao ver aquela majestade,
Os trágicos desdéns
Com que nos divertis, cobertos de alvaiade,
A troco duns vinténs!
Mas rio ainda mais dos histriões burgueses,
Cobertos de ouropéis,
Que tomam neste mundo, em longos entremezes,
A sério os seus papéis.
São eles, almas vãs, consciências rebocadas,
Que enfim merecem mais
O comentário atroz das rijas gargalhadas
Que às vezes disparais!
Portanto, é rir, é rir, hirsutos, grandes, lestos,
Nas cómicas funções,
Até fazer morrer, em desmanchados gestos,
De riso as multidões!
E eu, que amo as expansões dos grandes risos francos
E os gestos de entremez,
Deixai-me dizer isto, ó nobres saltimbancos:
Eu gosto de vocês!
A HIDRA
Há muito que desceu das orientais montanhas
A hidra singular que espalha nas ardências
Duma luta febril cintilações estranhas!
Ela galga, rugindo, às grandes eminências,
E enquanto vai soltando o silvo pelo espaço
Engrossa à luz do sol na seiva das consciências.
Tem rijezas sem par, como de roscas de aço
E corre descrevendo em giros caprichosos
Na leiva popular um indefinido traço.
Prefere aos antros vis os focos luminosos
E em mil voltas cruéis aperta dia a dia,
Numa longa espiral, os tronos carunchosos.
Passou pelo país da cândida Utopia:
Nos míticos rosais viveu dum vago aroma
Ao pálido fulgor da aurora que rompia.
Mas hoje com valor em toda a parte assoma,
E sem temer sequer a lúgubre viseira
Há muito que transpôs os pórticos de Roma.
E os Papas mais os reis sentindo-a na carreira
Do seu longo triunfo, um tanto apavorados,
Trataram de acender a lívida fogueira.
E ao galope lançando os esquadrões cerrados
Começaram depois, na terra, a persegui-la,
A cúmplice fatal dos lívidos Pecados!
Mas ela sem temor, nos cérberos tranquila,
Derrama cada vez mais belos e fecundos
Os intensos clarões da lúcida pupila,
E enquanto a imprecação de tantos moribundos,
Os déspotas cruéis, acolhem com desdém,
A hidra imensa — a Ideia — a farejar nos mundos
Ainda a garra adunca afia contra alguém!
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OS PALHAÇOS
Heróis da gargalhada, ó nobres saltimbancos,
Eu gosto de vocês,
Porque amo as expansões dos grandes risos francos
E os gestos de entremez,
E prezo, sobretudo, as grandes ironias
Das farsas joviais.
Que em visagens cruéis, imperturbáveis, frias.
À turba arremessais!
Alegres histriões dos circos e das praças,
Ah, sim, gosto de vos ver
Nas grandes contorções, a rir, a dizer graças
De o povo enlouquecer,
Ungidos pela luta heroica, descambada,
De giz e de carmim,
Nas mímicas sem par, heróis da bofetada,
Titãs do trampolim!
Correi, subi, voai num turbilhão fantástico
Por entre as saudações
Da turba que festeja o semideus elástico
Nas grandes ascensões,
E no curso veloz, vertiginoso, aéreo,
Fazei por disparar
Na face trivial do mundo egoísta e sério
A gargalhada alvar!
Depois, mais perto ainda, a voltear no espaço,
Pregai-lhe, se podeis,
Um pontapé furtivo, ó lívidos palhaços,
Luzentes como reis!
Eu rio sempre, ao ver aquela majestade,
Os trágicos desdéns
Com que nos divertis, cobertos de alvaiade,
A troco duns vinténs!
Mas rio ainda mais dos histriões burgueses,
Cobertos de ouropéis,
Que tomam neste mundo, em longos entremezes,
A sério os seus papéis.
São eles, almas vãs, consciências rebocadas,
Que enfim merecem mais
O comentário atroz das rijas gargalhadas
Que às vezes disparais!
Portanto, é rir, é rir, hirsutos, grandes, lestos,
Nas cómicas funções,
Até fazer morrer, em desmanchados gestos,
De riso as multidões!
E eu, que amo as expansões dos grandes risos francos
E os gestos de entremez,
Deixai-me dizer isto, ó nobres saltimbancos:
Eu gosto de vocês!
A HIDRA
Há muito que desceu das orientais montanhas
A hidra singular que espalha nas ardências
Duma luta febril cintilações estranhas!
Ela galga, rugindo, às grandes eminências,
E enquanto vai soltando o silvo pelo espaço
Engrossa à luz do sol na seiva das consciências.
Tem rijezas sem par, como de roscas de aço
E corre descrevendo em giros caprichosos
Na leiva popular um indefinido traço.
Prefere aos antros vis os focos luminosos
E em mil voltas cruéis aperta dia a dia,
Numa longa espiral, os tronos carunchosos.
Passou pelo país da cândida Utopia:
Nos míticos rosais viveu dum vago aroma
Ao pálido fulgor da aurora que rompia.
Mas hoje com valor em toda a parte assoma,
E sem temer sequer a lúgubre viseira
Há muito que transpôs os pórticos de Roma.
E os Papas mais os reis sentindo-a na carreira
Do seu longo triunfo, um tanto apavorados,
Trataram de acender a lívida fogueira.
E ao galope lançando os esquadrões cerrados
Começaram depois, na terra, a persegui-la,
A cúmplice fatal dos lívidos Pecados!
Mas ela sem temor, nos cérberos tranquila,
Derrama cada vez mais belos e fecundos
Os intensos clarões da lúcida pupila,
E enquanto a imprecação de tantos moribundos,
Os déspotas cruéis, acolhem com desdém,
A hidra imensa — a Ideia — a farejar nos mundos
Ainda a garra adunca afia contra alguém!
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