sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Amosse Mucavele (Conversa do Pão e da Escrita)


Ao Marcelo Panguana*

Pão- Oi! Ví aquele homem que certa vez disse que conhecia o local onde foram sepultados os Ossos de Ngungunhane** a andar como um louco.

Escrita- Quando?

Pão- Ontem, ao fim da tarde! Acreditas que ele falava para si mesmo dizendo falta-me algo.

Escrita- O que é que fizeste para o ajudar?

Pão- Nada! Somente fiquei com pena dele,e é por isso que estou partilhando consigo este pesadelo, que não sai da minha cabeça mesmo acordado.

Escrita- Sabes! Deverias ter lhe arranjado um livro para ele (pro)ler.

Pão- Pareces que não conheces esta nossa cidade? Na avenida em que cruzei com ele não tem nem sequer uma bilbioteca,ou livraria, o que tem de mais são barracas,discotecas,e drogarias. Mas, amigo! O porquê do livro? Achas que a leitura poderia ter curado a loucura que o acompanhava naquela tarde?

ESCRITA- Sim! Lembro-me dele ter me segredado que quando encotra-se com os livros e lê, ele sente os seus pés a pisarem o chão das coisas que o rodeiam, e a sua alma a dançar a balada dos deuses, e quando anoitece convida o amigo à volta da fogueira, conversam com os seus antepassados e compartilham as estórias de reconciliação.

Pão- Oh,interessante! É por isso que o chamam a voz que fala verdades!A propósito, quando o encontrares, peça-o para me ensinar a tocar xipalapala.***
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Notas:

* MARCELO PANGUANA - escritor e jornalista moçambicano,Charrueiro,atualmente é diretor da Revista Proler Fundo Bibliográfico da Lingua Portuguêsa),onde assina uma coluna denominada Algum Algo. Xipalapala nome da coluna que assinava no Jornal Notícias na decada 90.

Publicou - As vozes que Falam de Verdade, 1987; A Balada dos Deuses, 1991; Os Fazedores da Alma, 1997 (com Jorge de Oliveira - entrevistas, Estórias de Reconciliação - com Ungulani Ba Ka Cossa, Os Ossos de Ngungunhane, 2006; Como um Louco ao Fim da Tarde, 2010,e tem no prêlo o livro O Pão e a Escrita.

** NGUNGUNHANE, Mdungazwe Ngungunyane Nxumalo, N'gungunhana, Gungunhana ou Reinaldo Frederico Gungunhana (Gaza, c. 1850 — Angra do Heroísmo, 23 de Dezembro de 1906) foi o último imperador do Império de Gaza, no território que actualmente é Moçambique, e o último monarca da dinastia Jamine. Cognominado o Leão de Gaza, o seu reinando estendeu-se de 1884 a 28 de Dezembro de 1895, dia em que foi feito prisioneiro por Joaquim Mouzinho de Albuquerque na aldeia fortificada de Chaimite. Já conhecido da imprensa europeia, a administração colonial portuguesa decidiu condená-lo ao exílio em vez de o mandar fuzilar, como o fizera a outros. Foi transportado para Lisboa, acompanhado por um filho de nome Godide e por outros dignitários. Após uma breve permanência naquela cidade, foi desterrado para os Açores, onde viria a falecer onze anos mais tarde

*** XIPALAPALA - Substantivo feminino e singular derivado de "Xi-pala-pala", termo incerto no idioma Ronga (também reconhecido como XiRonga) que é um dialecto do sudeste africano e da família Tswa-Ronga, especialmente audível nas regiões do sul de Moçambique e nordeste da África do Sul.


O vocábulo é designativo de uma corneta produtora de magnas sonoridades, sintetizada a partir de uma haste de um antílope cuja específica identificação é impala.

É muito comum em Moçambique, onde diversos povos nativos a utilizavam e ainda usam como meio de chamamento, de convocação para variados mas determinados fins; e.g., para juntar os líderes intelectuais e políticos em uma reunião importante onde cruciais assuntos eram e são debatidos ou, até mesmo, somente para unificar o povo em alguma celebração ocasional ou oficializada, alguma ocorrência espontânea ou preestabelecida.

Exemplo: O chefe da tribo fez soar a xipalapala, chamando todos os constituintes do grupo à sua presença.

Ele tem voz de xipalapala. Todo o bairro escuta suas profundas falas quando ele conversa na intimidade de sua casa com sua mulher


Fontes:
O Autor
NGUNGUNHANE e XIPALAPALA = wikipedia

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