Já vi a mesma cena, aqui e no exterior. E acredito que todos nós já vimos coisa igual em qualquer parte do mundo.
Em Frankfurt, ainda ao tempo em que havia o muro de Berlim (na Alemanha havia disso), vi o mendigo do Primeiro Mundo estendido na calçada, cozinhando vasta bebedeira - havia umas 30 latas vazias de cerveja em volta dele.
Esparramado na calçada, ele atrapalhava o movimento dos passantes. Mas ninguém, nem mesmo os policiais, se atrevia a mexer nele, a recolher as latinhas de cerveja. Não era piedade nem um cochilo na tradicional vocação à ordem dos alemães.
É que o mendigo tinha ao lado um cão, que nem precisava latir para guardar o dono. Parecia um vira-lata, talvez o fosse. Tomava conta daquele pedaço da calçada, protegendo o sono do homem que com ele repartia os restos de comida arranjados nos restaurantes em volta.
Semana passada, em São Paulo, saindo do hotel, na Avenida Ipiranga, vi a mesma cena, o mendigo, emborcado num canto do edifício Copan e o cão ao lado, velando pelo dono. Se um milionário o chamasse, oferecesse incenso, ouro e mirra, o cão não se afastaria de sua guarda. Se um santo passasse e o atraísse para um monastério habitado por anjos e atapetado de flores, o cão nem se mexeria dali.
E o dono podia ser um desclassificado, um homem repudiado pela sociedade, pela família. Nem os pais nem os filhos nem os amigos querem saber dele, acham que o miserável está tendo o que merecia.
Para o cão, nada disso tem importância. O dono pode ser rei ou mendigo, santo ou criminoso. Fica a seu lado, sem esperar outra recompensa a não ser a de sentir o cheiro e a onipotência do homem, o homem frágil, tombado na rua, que ele protege daqueles que o abandonaram.
Em Frankfurt, ainda ao tempo em que havia o muro de Berlim (na Alemanha havia disso), vi o mendigo do Primeiro Mundo estendido na calçada, cozinhando vasta bebedeira - havia umas 30 latas vazias de cerveja em volta dele.
Esparramado na calçada, ele atrapalhava o movimento dos passantes. Mas ninguém, nem mesmo os policiais, se atrevia a mexer nele, a recolher as latinhas de cerveja. Não era piedade nem um cochilo na tradicional vocação à ordem dos alemães.
É que o mendigo tinha ao lado um cão, que nem precisava latir para guardar o dono. Parecia um vira-lata, talvez o fosse. Tomava conta daquele pedaço da calçada, protegendo o sono do homem que com ele repartia os restos de comida arranjados nos restaurantes em volta.
Semana passada, em São Paulo, saindo do hotel, na Avenida Ipiranga, vi a mesma cena, o mendigo, emborcado num canto do edifício Copan e o cão ao lado, velando pelo dono. Se um milionário o chamasse, oferecesse incenso, ouro e mirra, o cão não se afastaria de sua guarda. Se um santo passasse e o atraísse para um monastério habitado por anjos e atapetado de flores, o cão nem se mexeria dali.
E o dono podia ser um desclassificado, um homem repudiado pela sociedade, pela família. Nem os pais nem os filhos nem os amigos querem saber dele, acham que o miserável está tendo o que merecia.
Para o cão, nada disso tem importância. O dono pode ser rei ou mendigo, santo ou criminoso. Fica a seu lado, sem esperar outra recompensa a não ser a de sentir o cheiro e a onipotência do homem, o homem frágil, tombado na rua, que ele protege daqueles que o abandonaram.
Fonte:
Folha de São Paulo - São Paulo - SP, 12/06/2001
Folha de São Paulo - São Paulo - SP, 12/06/2001
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