segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Irmãos Grimm (Rapunzel)

Era uma vez um homem e uma mulher que há muito tempo desejavam em vão ter um filho. Os anos iam passando e a mulher esperava que Deus fosse atender o desejo dela. Eles tinham uma pequena janela no fundo da casa de onde se podia ver um esplêndido jardim, cheio das mais belas flores e verduras. No entanto, ele era cercado por um muro alto, e ninguém se atrevia a escalá-lo, porque ele pertencia a uma feiticeira, que possuía grandes poderes e era temida por todo o mundo.

Um dia, a mulher estava de pé ao lado da janela e olhava para o jardim, quando ela viu um canteiro onde haviam plantado o mais lindo rapôncio (ou rapunzel) que ela jamais vira, e a planta era tão verde e fresca que ela queria pegar algumas, e desejava muito comê-las. Este desejo aumentava a cada dia que passava, e como ela sabia que não havia jeito de conseguir nem um pouquinho delas, ela começou a definhar, e foi ficando triste e abatida.

Até que um dia o marido dela ficou assustado, e perguntou:

— O que você tem, minha querida esposa?

— Ah, respondeu ela, se eu não puder pegar um pouco de rapôncio, que fica no jardim atrás de nossa casa, para comer, eu vou morrer. O marido, que a amava, pensou:

— Antes que a minha esposa morra, preciso trazer para ela um pouco de rapôncio, custe o que custar. Ao cair da noite, ele pulou o muro que dava para o jardim da feiticeira, pegou apressadamente um punhado de rapôncios, e levou para a sua esposa.

Imediatamente ela fez uma salada, e a comeu com grande satisfação. Ela, no entanto, gostou tanto, mas tanto mesmo do rapôncio que no dia seguinte por três vezes ela sentiu a mesma vontade de antes. Se ele quisesse ter um pouco de sossego, o seu marido deveria descer mais uma vez ao jardim. Quando começou a escurecer, portanto, ele decidiu ir lá novamente, mas assim que ele pulou o muro, ele ficou terrivelmente assustado, porque ele viu a feiticeira de pé diante dele.

— Como te atreves, disse ela com ódio nos olhos, descer ao meu jardim e roubar os meus rapôncios como se fosses um ladrão? Deves sofrer por isso!

— Ah, respondeu ele, permita que a misericórdia tome o lugar da justiça, eu só decidi fazer isso por motivo de necessidade. A minha esposa viu o seu rapôncio da janela, e sentiu uma vontade muito grande de comê-lo que ela teria morrido se não conseguisse alguns para comer. Então, a feiticeira deixou que o ódio diminuísse, e disse a ele,

— Se é assim como dizes, eu permitirei que leves contigo tanto rapôncio quanto desejares, mas, exijo porém, uma condição, tu darás a mim o filho que a tua esposa trará ao mundo; ele será bem tratado, e eu cuidarei dele como se fosse uma mãe.

O homem estava tão apavorado que concordou com tudo, e quando a mulher ficou de cama, a feiticeira apareceu de repente, deu à criança o nome de Rapunzel, e a levou embora consigo.

Rapunzel cresceu como a mais linda criança abaixo do sol. Quando ela completou doze anos de idade, a feiticeira a prendeu em uma torre, que ficava no meio de uma floresta, e não possuía nem escadas nem porta, porém, bem no alto havia uma pequena janela. Quando a feiticeira queria entrar, ela se colocava debaixo da janela, e gritava:
   
— Rapunzel, Rapunzel
Joga as tuas tranças para mim.

Rapunzel tinha um cabelo esplendoroso, finos como os fios de ouro, e quando ela ouviu a voz da feiticeira, ela soltava seu emaranhado de tranças, enrolava-os em torno dos ganchos da janela acima dela, e então os cabelos caiam o comprimento de vinte varas para baixo, e a feiticeira subia por ele.

Depois de um ano ou dois, aconteceu que o filho do rei cavalgava pela floresta e passava perto da torre. Então ele ouviu uma canção, que era tão linda que ele parou para ouvir. Esta era Rapunzel, que em sua solidão, passava o tempo deixando que a sua linda e doce voz ressoasse. O filho do rei quis subir até onde ela estava, e procurou a porta da torre, mas não encontrou nada. Foi para casa, mas a voz dela havia tocado tão profundamente o seu coração, que todos os dias, ele saía pela floresta para ouvi-la. Uma vez, quando ele estava assim de pé atrás de uma árvore, ele viu que uma feiticeira havia chegado, e ele ouvia quando ela gritou:

— Rapunzel, Rapunzel
Joga tuas tranças para mim.

Então Rapunzel descia as tranças de seus cabelos, e a feiticeira subia até lá em cima. Se essa é a escada por onde se sobe até o alto da torre, eu vou tentar a minha sorte uma vez,disse ele, e no dia seguinte, quando começou a escurecer, ele foi até a torre e gritou:

— Rapunzel, Rapunzel
Joga tuas tranças para mim.

Imediatamente os cabelos caíram e o filho do rei subiu.

A princípio Rapunzel ficou muito assustada quando tal homem, que seus olhos jamais haviam contemplado, se aproximou dela, mas o filho do rei começou a conversar com ela como um amigo, e disse-lhe que o seu coração havia sido tocado tão fortemente que isso não lhe permitia que ele tivesse sossego, e ele se sentiu obrigado a procurá-la. Então, Rapunzel perdeu o medo e quando ele lhe perguntou se ela o aceitaria como seu marido, e vendo ela que ele era jovem e belo, ela pensou:

— Ele me amará mais do que me ama a velha Senhora Gothel, e ela disse sim, colocando suas mãos sobre as dele.

Ela disse:

— Faço questão de ir-me embora contigo, mas eu não sei como descer. Sempre que vieres, traze contigo uma meada de seda, que eu vou tecer uma escada com ela, e quando ela estiver pronta eu descerei, e tu me levarás em teu cavalo. Eles combinaram que até que esse momento chegasse ele viria vê-la todas as noites, porque a velhinha somente vinha de dia. A feiticeira não desconfiou de nada, até que uma vez Rapunzel disse a ela:

— Diga-me, Senhora Gothel, porque será que a senhora é muito mais pesada para eu puxar do que o jovem filho do rei — ele sobe num instantinho.

— Ah, criatura perversa, gritou a feiticeira. — O que te ouço dizer! Pensei que a tivesse separado do mundo, e ainda assim me enganas!

Cheia de ódio, ela agarrou as lindas tranças de Rapunzel, deu duas voltas em sua mão esquerda, pegou uma tesoura com a direita, e snip, snap, cortou os cabelos dela, e as belas tranças foram jogadas no chão.
   
E a velha era tão impiedosa que levou a pobre Rapunzel para o deserto onde ela foi obrigada a viver triste e abandonada.

No mesmo dia, contudo, depois de ter expulsado Rapunzel, a feiticeira amarrou as tranças de cabelo que ela tinha cortado ao gancho da janela, e quando o filho do rei veio e gritou:

— Rapunzel, Rapunzel
Joga tuas tranças para mim.

Ela descia os cabelos. O filho do rei subiu, mas ele não encontrou sua bela Rapunzel lá em cima, mas, a feiticeira, que olhou para ele com olhos perversos e venenosos. Ahá, gritou ela, zombeteiramente.

— Viestes buscar a tua amada, mas o lindo pássaro não está mais cantando em seu ninho, o gato o comeu, e irá arranhar os teus olhos também. Rapunzel não existe mais para ti, não a verás mais.

O filho do rei sentiu um pesar muito grande, e desesperado, pulou para fora da torre.

Ele salvou a sua vida, mas os espinhos sobre os quais ele caiu, perfuraram os seus olhos. Então ele caminhou completamente cego pela floresta, não comia nada além de raízes e de frutas, e não fazia nada além de lamentar e chorar a perda de sua querida esposa. Desesperado, o príncipe caminhava qual um desesperado durante alguns anos, e, depois de muito tempo, chegou ao deserto onde Rapunzel, vivendo com os gêmeos a quem dera a luz, um menino e uma menina, vivia muito infeliz.

O príncipe ouviu uma voz, que lhe parecia muito familiar, e caminhou em direção a ela, e quando ele se aproximou, Rapunzel o conheceu, e abraçou o seu pescoço e chorou. Duas lágrimas suas molharam os olhos dele e eles ficaram claros novamente, e ele conseguiu ver como antes. Ele a levou para o seu palácio onde foi recebido com alegria, e eles viveram durante muito tempo depois, felizes e satisfeitos.

Fonte:
Contos de Grimm

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