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quarta-feira, 15 de abril de 2020

Malba Tahan (Uma Lenda de Krishnamurti)


Muitos propósitos há no coração do homem, porém o conselho de Deus permanecerá.
Davi, Salmos, 19-91.


O rapaz pálido, com uma túnica andrajosa, que se achava ao meu lado, passou a mão pela testa e, voltando-se para Krishnamurti, assim falou em tom calmo e respeitoso:

— Mestre! Uma dúvida veio refugiar-se em meu coração. Sinto em mim um feixe de espinhos que me torturam...

— Qual é essa dúvida, meu filho? — volveu o Iluminado, cruzando os braços e erguendo os olhos para a imensidade do céu.

— Senhor! — respondeu o jovem da túnica andrajosa. — A minha dúvida está ligada a delicado problema da vida: quem tem mais amor, ou mais apego, aos bens materiais, os ricos ou os pobres? Onde apontar os mais afeiçoados às suas fazendas ou os mais agarrados aos seus trastes? Terá o mendigo mais aferrado aos seus andrajos do que o milionário às suas baixelas de ouro?

O sábio e judicioso Krishnamurti não respondeu. Baixou o rosto sereno, de linhas impecáveis, e ficou um instante a meditar. Decorridos alguns minutos, voltou-se para o discípulo que o arguira e disse:

— Não me acho, no momento, com ânimo para discorrer sobre esse problema, cuja delicadeza transcende nossa imaginação. Mas, como não seria oportuno deixar sem resposta a tua pergunta, vou contar-te uma lenda do país de Girkka. Queres ouvi-la, meu filho?

— Sim, sim — acudiu pressuroso o jovem, com um sorriso de júbilo e pueril sinceridade. — Ouviremos com encantamento a tua lenda, ó mestre, pois as tuas palavras são sempre cheias de preciosos e ternos ensinamentos!

Krishnamurti, o venerável, com voz pausada e firme, em linguagem desnuda e clara, narrou o seguinte:

Para além do país de Girkka, na Índia, entre escarpadas montanhas, vivia, há muitos anos, virtuoso anacoreta, grandemente venerado, de nome Timanak. Os dias desse bom guru, ou melhor, desse santo varão, eram consagrados à prece e à meditação. Numerosos fiéis, escalando as pedras, iam, uma vez por semana, visitá-lo na gruta úmida e triste que ele tornara famosa com sua vida modelar de penitências e sacrifícios. Budistas fanáticos, vindos de remotos climas, traziam-lhe ricos presentes e cestos com saborosos manjares.

O santo de Girkka, porém, com palavras admiráveis, recusava os presentes e devolvia as dádivas mais preciosas. Os acepipes, que faziam as delícias dos gulosos, não o atraíam. Contentava-se com um punhado de arroz branco e meia medida de ervilhas secas. Sua vida de expiação era pautada por extrema abstinência e desprendimento. Cobria a nudez do corpo magro apenas com uma tanga. Tinha, além disso, outra tanga, que usava quando se via obrigado a lavar e purificar a primeira.

Ora, esse virtuoso eremita das duas tangas ouviu, certa vez, contar que vivia em Dakka, a cidade dos 107 templos, o douto Sindagg Nagor, filósofo de renome, que conhecia a Verdade.

“Vou procurar esse homem”, refletiu o ermitão. “Quero conhecer a Verdade. Que pretendo, afinal, na vida, senão descobrir a Verdade e desfazer o Mistério?”

E, deixando a gruta que lhe servia de morada, venceu as ladeirentas estradas e encaminhou-se para a opulenta cidade de Dakka. Vestia, como sempre, a sua tanga amarelada e trazia no braço esquerdo, como troféu precioso, a outra tanga — direi assim —, a tanga sobressalente.

Viajantes e peregrinos budistas que o avistavam ao longo dos caminhos paravam para saudá-lo. Acercavam-se dele e, respeitosos, de joelho na terra, solicitavam um conselho ou imploravam a bênção.

Chegou, finalmente, Timanak, o piedoso, à fervilhante capital. Indiferente aos homens que se acotovelavam pelas praças e aos ricos mercadores que cruzavam as ruas com seus utensílios e baixelas, procurou avistar o brâmane filósofo que desejava conhecer.

Que grande surpresa para o penitente de Girkka! O sábio, deslumbramento da fé budista, mestre entre os mestres, não residia numa choupana, nem se escondia entre pedras. Habitava, ao contrário, suntuoso palácio, junto a um lago em que se espanejavam soberbos cisnes brancos. Levado por um guia, entrou o penitente na senhoril mansão. Pelo chão, que os pés mortificados de Timanak pisavam, estendiam-se tapetes riquíssimos; viam-se, pelos cantos, ou junto às colunas de mármore, jarros transbordantes de flores; oscilavam do teto, presos por correntes de prata, pesados candelabros de cristal. Tudo ali faiscava majestosa beleza e otimismo.

— Que desejas de mim, meu irmão? — indagou o sábio Sindagg Nagor, acolhendo bondoso o desnudo visitante. — Em que poderei servir-te?

Falava com tranquila segurança. Tinha a pele clara e era cheio, pesado, grisalho.

Esmagado pela pompa, ofuscado pelo luxo que o rodeava, sentiu-se o eremita confuso e perturbado. Dominou-se e disse com não pequeno embaraço, tentando um sorriso irônico:

— A fama do vosso incomparável saber chegou até a gruta obscura em que sempre vivi. Deliberei abandonar o meu refúgio e vim até aqui, desejoso de ouvir os vossos ensinamentos. Sinto-me, porém, constrangido. Como permanecer no meio de tanta riqueza? Aqueles que vivem em vossa companhia, e que residem neste magnífico palácio, envergam trajes soberbos, ao passo que eu resguardo a nudez de meu corpo, roído de chagas, com este pequeno retalho. Além da mísera tanga que visto, tenho apenas esta outra tanga sobressalente que trago sob o braço. Na seminudez em que vivo, não posso inclinar-me entre os vossos discípulos sem causar escândalo ou pisotear suscetibilidades.

— Estás profundamente equivocado, meu irmão — tornou o sábio, sem a menor ostentação e com a maior naturalidade. — Os trajes que cobrem o corpo não medem o valor do homem. A mim, na verdade, não me interessa saber se tens duas, três, vinte ou duzentas mil tangas. Que adianta ao homem vestir-se de sedas e ter a alma nua de virtudes e de predicados? Interessa-me, tão somente, as roupagens do espírito e não os vestidos e bordados que cobrem a matéria. Não te preocupes, pois, com os trajes, nem com o luxo dos que te cercam. Cuida de cultivar a tua alma e enriquecê-la. Se queres permanecer neste palácio, aqui ficarás com toda a honra e deferência que mereces. Durante a tua estada conversaremos sobre os assuntos que mais te interessam. Limitado, bem limitado, é o meu saber, mas imenso e constante é o meu desejo de servir; tudo farei, portanto, em teu auxílio. Com os minguados dons de minha inteligência, tentarei esclarecer as tuas dúvidas e vencer as tuas inquietações e incertezas.

Sequioso por aprender a Verdade, aquiesceu o ermitão ao convite do sábio e passou a figurar entre os hóspedes de honra do grande palácio. Longas horas entretinha-se em palestras com o rico filósofo, e desse brâmane ouvia notáveis e edificantes ensinamentos.

Uma tarde, ao luzir das primeiras estrelas, como faziam, aliás, quase todos os dias, partiram os dois amigos — o guru e o filósofo — a passear por atraente bosque que perto verdejava. Deambulavam sossegados entre as árvores, por pequeno caminho de bom piso, quando os surpreendeu estranho ruído. Parecia um bando de elefantes, em marcha, esmagando os galhos secos sobre um tablado.

Que seria?

A observação e a experiência levam os homens mais depressa à descoberta da Verdade do que as divagações incertas e as conjeturas vãs. Sugeriu, pois, o supersapiente hindu ao seu companheiro de Girkka:

— Indaguemos do que se trata. Algo de anormal ocorre na região que nos cerca.

Com passo normal e certo, sem mostras de impaciência, encaminharam-se para a estrada. E viram, com indefinível espanto, boquiabertos, um espetáculo pavoroso. Todo o vetusto palácio do eloquente Sindagg era presa das chamas. Colunas de fumo, levadas pelo vento, subiam negras para o céu, e o fogo, na sua faina destruidora, retorcia suas espirais vermelhas, devorando, como um chacal faminto, a pomposa residência.

Sindagg Nagor, o filósofo, ao perceber a extensão da calamidade, não teve um gesto de revolta ou desapontamento; cruzou serenamente os braços e olhou para o céu já avermelhado, não pelo crepúsculo, mas pelos clarões sinistros do incêndio. Dentro de alguns instantes, todos os seus tesouros estariam reduzidos a cinzas, ruínas fumegantes e escombros disformes.

O eremita Timanak, porém, não imitou em quietude e sossego a atitude de seu mestre. Longe disso. Depois de dardejar, em redor, olhares aflitos, atirou-se ao chão e pôs-se a rolar como um demente e a praguejar como um pária, com toda a expansão de uma dor represada:

— Que desgraça, senhor! Que desgraça! Tudo perdido!

E lamentava entre uivos e imprecações:

— Tudo perdido!

Ao presenciar o desespero do discípulo, o venerável Sindagg acudiu-o solícito e procurou erguê-lo do chão. Segurou-o pelo braço e proferiu com desusada energia:

— Domina-te, meu irmão, domina-te! “Muitos propósitos há no coração do homem, mas o conselho de Deus permanecerá!” Não te preocupes com o desastre. Errado procede aquele que se aflige e sofre diante do irremediável. Recebe com serenidade os decretos inapeláveis do destino. O palácio que ali vês, presa das chamas, é meu; todas as riquezas — tapetes, alfaias, móveis e joias — que nele se achavam eram de minha exclusiva propriedade. E, como vês, estou absolutamente calmo e indiferente; a perda dos bens materiais não chega sequer a perturbar, de leve, a serenidade de meu espírito!

A tais palavras retorquiu, com exasperação e sinistra riqueza, o guru de Girkka:

— Que me importa a mim o vosso palácio? Não me interessam tampouco as vossas alfaias ridículas e os vossos inúteis tapetes! Que leve tudo o fogo o mais depressa possível!

— E por que te mostras, assim, tão apoquentado? — estranhou, bondoso, o filósofo. — Não vejo, então, motivo para o teu desespero!

— A minha tanga! — deplorou, entre soluços, o santo, em novo assomo de ira. — A minha tanga sobressalente! Esqueci-me de trazê-la, hoje, quando saí a passeio. Perdi a minha tanga no incêndio!

E desatou em pranto, batendo, sem cessar, com a cabeça no chão. Para a dor que o afligia, não havia lenitivo no mundo. O infeliz perdera a sua tanga sobressalente!...

Calou-se Krishnamurti, o mestre admirável. O rapaz da túnica andrajosa ergueu-se. E, sem proferir palavra, retirou-se da larga varanda.

O Sol, tocando de leve a linha do horizonte, espargia pelo céu, tão martelado de nuvens, as cores avermelhadas do crepúsculo.

Fonte:
Malba Tahan. Novas Lendas Orientais.

domingo, 23 de fevereiro de 2020

Literatura Hindu Através dos Tempos


Algumas das obras que são conservadas da literatura hindú do III milênio são escritas em sânscrito, a língua mais antiga da árvore indo-europeia.

Durante o primeiro período, foram escritos textos religiosos divididos em diferentes grupos. Vamos ver:

1. Veda: palavra que significa "ciência". Dentro deste grupo, encontramos textos como

Rigveda (Veda dos hinos),
Atharvaveda (Veda dos feitiços),
Samaveda (Veda dos cânticos) e
Yajurveda (Veda das fórmulas sagradas).

São coleções de hinos, orações, canções para a liturgia, invocações aos deuses, etc.

2. O Brahmana: coleção de ensinamentos de gênero religioso e filosófico.

3. O Sutra: são séries de aforismos sobre os mais diversos assuntos.

Mais tarde, grandes poemas épicos da literatura sânscrita começam a aparecer:

o Mahabharata e
o Ramayana.

O primeiro é o poema mais longo escrito no mundo, pois consiste em duzentos mil versos. O tema central deste trabalho são as lutas entre os descendentes dos irmãos Kuru e Pandu. O segundo é mais curto e narra as façanhas do rei Rama. É escrito por Valmiki.

O budismo, a religião por excelência da Índia, deu origem a literatura canônica, que foi preservada em uma grande obra chamada Tripitaka. Seu conteúdo é basicamente religioso, há fábulas e lendas do tipo romancesco.

Na era cristã, o teatro alcança seu maior sucesso graças a Kalidasa, com sua obra-prima Sakuntala, drama de intrigas amorosas intrigantes do Mahabharata. No entanto, o teatro também teve outros criadores menores, como Bhasa (século 2), autor de Carudala, uma comédia emaranhada, e Vishakhadatta (século 5), autor de Mudraraksasa, drama político.

As coleções mais antigas de poesia lírica são Sattasai e reúnem poemas amorosos.

A narrativa indiana é muito importante nesse período, porque é influenciada pela literatura e pelo folclore universal. Uma amostra disso é o Panchatantra (os cinco livros), conjunto de setenta histórias ou fábulas.

Após um período de crise literária, a literatura indiana renasce no século XIV através de diferentes veículos de expressão. Por exemplo, o sânscrito é traduzido por diferentes idiomas modernos, principalmente tâmil, bengali e hindi. O tema principal é amor e religião.

O autor mais universal da literatura indiana é Rabindranath Tagore (1861-1941), que ganhou o Prêmio Nobel de Literatura em 1913. Embora esse autor escreva em bengali, seus trabalhos traduzidos para o inglês são divulgados.

Fonte:
Traduzido de Mailxmail = Literaturas del Mundo
Fonte da imagem = Literatura Universal

terça-feira, 8 de maio de 2018

Contos e Lendas do Mundo (Índia: Modo correto)

Um Monge de grande devoção e instruído, atravessava uma vez um rio em um barco quando ao passar ao lado de uma pequena ilhota, ouviu uma voz de um homem que muito torpemente tentava elevar suas preces. No interior do monge não pode mais que entristecer-se.

- Como era possível que alguém fora capaz de entoar tão mal aqueles mantras? Talvez aquele homem ignorava que os mantras deviam ser recitados com entonação adequada, com ritmo e musicalidade precisas, com pronuncia perfeita.

Decidiu então ser generoso e desviando-se de seu rumo aproximou-se a ilhota para instruir aquele homem sobre a importância da correta execução dos mantras. Não era em vão que se considerava um grande especialista e aqueles mantras não tinham para ele qualquer segredo.

Quando desembarcou na ilhota, pode ver um pobre homem de aspecto sossegado cantando alguns mantras um pouco sem acerto. O monge, com serena paciência, dedicou algumas horas a instruir minuciosamente a aquele indivíduo que a cada momento mostrava efusivas mostras de agradecimento a seu instrutor. Quando entendeu que por fim aquele sujeito poderia recitar os mantras com certa capacidade despediu-se dele, advertindo-lhe:

- E lembre-se meu bom amigo, é tal a potência de estes mantras que sua correta pronuncia permite que um homem seja capaz de caminhar sobre as águas.

Mas apenas havia percorrido alguns metros com seu barco, ouviu a voz daquele homem a recitar os mantras ainda pior que antes.

- Que horror. Há pessoas que são incapazes de aprender nada de nada, assim pensou o monge.

- Ei, monge - escutou atrás de si uma voz muito perto.

Ao voltar-se viu ao pobre homem que, caminhando sobre a as águas, aproximava-se de seu barco e perguntava:

- Nobre monge, já esqueci-me tua instruções sobre o modo correto de recitar os mantras. Serias, tão amável de repeti-lo novamente?

Fonte:

Observação: Este conto, adaptado ao cristianismo, foi escrito por Leon Tolstói, não recordo bem o título, creio ser "Os Três Eremitas" ou "Os Três Monges". O enredo é o mesmo, só que eram três monges que entoavam o Padre Nosso erroneamente (JF) 

terça-feira, 11 de outubro de 2016

Lendas da Índia (A Busca das Plantas Medicinais)

No cerco de Lanka, o chão ficou coalhado de mortos e de feridos. Lakshman foi gravemente atingido e Rama entrou em desespero com o estado que se encontrava o irmão.

Nesse momento Hanuman atravessou o mar, dessa feita voando em direção ao norte, até o Himalaia, em busca da montanha da vida, coberta de plantas medicinais capazes de curar todo tipo de ferimento e ainda devolver a vida aos mortos.

Vindas da lua, as plantas brilhavam com luz própria. Lá de cima, Hanuman viu a montanha faiscando. Mas as plantas se esconderam debaixo da terra e as luzes se apagaram, quando sentiram que alguém se aproximava.

Como não havia tempo para desenraizá-las, Hanuman arrancou a montanha inteira, com as ervas, árvores, os minérios, rios, animais e,  levantando-a com as mãos acima da cabeça, retornou a Lanka. O voo rápido aqueceu as ervas que começaram a exalar vapores. Enquanto pairava no ar, à procura de um lugar apropriado para depositar a montanha, o cheiro das plantas se espalhou por todo o campo de batalha e isso foi o bastante para que os mortos recuperassem a vida e os feridos se curassem. Todos se salvaram, romperam o cerco e conquistaram Lanka.

Vencida a guerra contra o Demônio de Dez Cabeças, Sita foi liberada e voltou para a companhia de Rama, de Lakshman, agora completamente curado, de Hanuman, Sugriva, Jambavat e do vitorioso exercito de macacos e ursos.

Fonte:

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Lendas da Índia (O Voo de Haruman / O Incêndio de Lanka)

O Voo de Hanuman

Com um salto descomunal, Hanuman lançou-se sobre o mar. Sabendo que o macaco era filho do vento, o oceano pediu a Mainaka, a montanha submersa, que se erguesse bem alto e se oferecesse como um lugar de repouso para Hanuman.

- Agradeço, mas não posso interromper o voo – disse ele, apoiado no ar e tocando a montanha com a ponta do dedo.

Quando os deuses viram o filho do vento varando o espaço, resolveram testar sua força e mandaram Surasa, a mãe das serpentes, devorá-lo. No momento em que ela abriu a boca, o macaco duplicou deu corpo. A serpente abriu a boca ainda mais e ele ficou cem vezes maior. Por fim, quando ela escancarou a bocarra, Hanuman diminuiu de tamanho, entrou lá dentro e tornou a sair.

- Experimentei sua esperteza e sua força – disse Surasa – e foi para isso que os deuses me mandaram. Você será capaz de cumprir a tarefa.

Hanuman continuou o voo.

Uma figura demoníaca, que vivia no meio do oceano, ao ver na água os reflexos das criaturas que voavam, agarrava-lhes as sombras e elas, assim presas, serviram de comida àquela boca voraz. Quando a diaba pegou a sombra do macaco voador, ele se tornou bem pequeno, entrou no corpo dela, espremeu-lhe o coração e sai pela orelha. A diaba caiu no fundo do mar e foi devorada pelos peixes.

Chegando à cidade de Lanka, Hanuman esperou anoitecer, pousando num rochedo. Depois, tomando a forma de um gatinho, transpôs as muralhas da cidade. Lankini, a guardiã, percebendo sua chegada perguntou:

- Você aí, aonde vai? Não sabe que todo ladrão intruso é minha comida?

Hanuman lhe deu um soco tão forte que ela vomitou sangue. Mas recuperando-se, levantou e disse que a profecia tinha se cumprido:

- Quando você receber o soco de um macaco, fique sabendo que está tudo acabado com a raça dos demônios – avisavam as palavras proféticas.

Depois de atingir com um salto o palácio de Ravana, de se meter entre os demônios-vigias, de procurar nos jardins e nos pátios, o macaco acabou descobrindo Sita, magra, pálida e abatida, num pequeno bosque atrás do palácio. Escondido no alto de uma árvore, Hanuman observou a chegada de Ravana, que tentava agradar a moça, sem sucesso. Sita lhe dizia:

- Escute aqui, Dez Cabeças, pode uma flor de lótus florir com a luz de um vaga-lume? Não temes a setas de Rama? Bandido, você me raptou quando estava só. Não se envergonha disso?

Furioso, Ravana ordenou que as bruxas a atormentassem. Mas uma delas resolveu ficar do lado da moça, pedindo-lhe que a salvasse e às suas companheiras, por causa de um sonho profético que tivera. No sonho, aparecia um macaco que incendiava a cidade e matava os demônios e as bruxas, enquanto Ravana, nu, montado num asno, estava com todas suas dez cabeças raspadas e seus vinte braços cortados. Sita prometeu livrá-las da morte.

E foi então que a prisioneira descobriu Hanuman no esconderijo. Apresentando-se como criado e mensageiro de Rama, o macaco lhe entregou o anel conforme o desejo de seu senhor.

- Posso levá-la comigo agora mas não tenho ordens de Rama para fazê-lo. Espere mais uns dias e ele próprio virá com uma tropa de macacos para libertá-la – explicou Hanuman.

- Mas os maçamos são pequenos e os demônios poderosos guerreiros – respondeu-lhe Sita.

Ouvindo isso, Hanuman ficou de um tamanho colossal, mostrando todo seu poder. Despedindo-se de Sita, partiu exibindo aquela forma imensa e derrubando tudo que encontrava pela frente.

O Incêndio de Lanka

Os demônios, alarmados, avisaram Ravana que um macaco gigantesco causava a maior destruição por onde passava. Exércitos foram enviados para combatê-lo e Hanuman derrotou todos, matando um dos filhos de Ravana. Um outro filho foi incumbido da mesma missão e depois de muita luta acorrentaram o macaco e levaram-no à presença do Demônio de Dez Cabeças, que perguntou:

- Quem é você, de onde veio e o que quer?

- Sou Hanuman, mensageiro de Rama e vim até aqui para descobrir onde está Sita.

Depois de conversar com seus guerreiros sobre o que fazer com o prisioneiro, Ravana decidiu:

- Deixem-no ir embora, mas mutilem-no primeiro. Um macaco é muito apegado à sua cauda. Amarrem nela trapos molhados de óleo e ponham fogo. Quando o macaco sem rabo retornar à casa, trará seu mestre de volta com ele e então veremos que poder tem esse mestre tão elogiado – falou o demônio.

Em toda cidade não sobrou um trapo sequer, nem uma única gota de óleo, porque Hanuman fez crescer a cauda até que ela ficasse enorme. Quando o fogo foi ateado, o vento soprou forte e o macaco não sentiu o calor. Desprendeu-se das correntes, saltou de palácio em palácio, de casa em casa, até incendiar toda a cidade.

Do alto de uma colina contemplou Lanka, destruída pelo fogo. Esfriou a cauda numa fonte e saltou até o bosque onde se achava Sita. Esta lhe deu uma joia, que usava nos cabelos, para que entregasse a Rama. Hanuman voou até a praia e lá estavam os ursos e macacos, à espera de notícias.

Sabendo que Sita fora encontrada, todos voltaram para o reino. Lá chegando, prepararam o grande exercito de animais, que acompanharia Rama no resgate de sua esposa Sita, e partiram para a guerra contra Ravana e seus demônios.

Fontes:

domingo, 9 de outubro de 2016

Lendas da Índia (O Filho do Vento)

Quando Brahma, o deus criador, descansava, derramou uma lágrima sobre o chão de ouro do monte Meru e assim nasceu o primeiro macaco. Um dia, ao contemplar seu reflexo no lago e pensando se tratar de um inimigo, o macaco se atirou nas águas, mergulhou até o fundo mas não encontrou ninguém. Ao sair, havia se transformado numa fêmea.

O grande Indra se apaixonou por aquela linda macaca e dessa união nasceu Vali.  Surya, o Sol, também se enamorou dela e desse encontro nasceu Sugriva. Numa ocasião em que a mãe banhava os filhotes no lago, ficou toda respingada da água que os macaquinhos lhe atiravam e, nesse momento, percebeu que havia voltado a ser macho. Levou, então, os filhos até Brahma e este deu a Vali uma cidade da qual ele se tornou rei. Mas nada deu a Sugriva.

O primeiro macaco foi morar no céu e lá de cima viu que Vali parecia ter o domínio de tudo. Então pediu a Vayu, o deus do vento, que gerasse um filho macaco, a fim de que se fosse o fiel amigo de Sugriva.

Um dia, quando soprava no alto de uma montanha, o deus do vento encontrou uma bela macaca sonhadora que passeava distraída. Vayu se uniu a ela e nasceu Hanuman, cujo nome significa “o que tem mandíbulas fortes”.  Porém, a macaca abandonou o filhote na entrada de uma caverna e foi embora. Sozinho e com fome, Hanuman se pós a correr atrás do sol para devorá-lo. Isso provocou a raiva de Rahu, a cabeça sem corpo, engolidora do sol e provocadora dos eclipses.

Rahu reclamou com Indra e ele, montando em seu elefante Airavata, derrubou Hanuman com um raio. Na queda, o macaco quebrou a mandíbula. Vayu tomou o filho ferido nos braços e tal foi sua tristeza que se recolheu no interior de uma caverna, recusando-se a ventar. De repente, desapareceram as dez formas de vento e o mundo parou de respirar.

Os deuses apavorados com o perigo que ameaçava toda a criação, imploraram o perdão de Vayu e ofereceram a Hanuman o dom da imortalidade, a coragem total e o poder da cura.

Fonte: