quarta-feira, 25 de maio de 2011

A. A. de Assis (Triversos III)




61
Longindo-se vai,
suminte, o barquinho a vela.
Quem será com quem?

62
Ah, espelho meu.
Cada vez que em ti me vejo
vejo menos eu.

63
Receita do sapo:
quem quer um sono tranquilo
antes coma o grilo.

64
A rosa, Keké,
a rosa que coisa é?
– Email de Deus.

65
Quantas vezes, ah,
eu vi o pião rodar.
E os anos também.

66
Poeta no parque.
Enquanto caminha ao sol
vai catando haicais.

67
Do dente por dente
ao voto por dentadura.
A lei da mordida.

68
Nuns de vez em quando
sou porventura menino.
Melhores momentos.

69
Na praia desfilam
sungas, biquínis. De gala,
um par de pinguins.

70
O Sol que se cuide.
Volta e meia a meia-lua
chega em casa cheia.

71
Tanto foi ao brejo,
que a vaca um lírio gerou.
O copo-de-leite.

72
Bolsa de valores.
Nem só de ações morre o homem,
mas também de infarto.

73
Mágica é a palavra.
Beija-flor é beija-flor,
colibri nem tanto.

74
Tinha um pé de pinha
no quintal vizinho. Tinha.
Nem quintal tem mais.

75
Nem ao vento verga
o velho jequitibá.
Dá flores, porém.

76
As celebridades?...
Dê-lhes tempo: logo-logo
serão gasparzinhos.

77
Equino sem trema?
Desculpem, mas me parece
cavalo sem jóquei.

78
O parto da história:
aquele em que Adão, dormindo,
fez-se Adão e Eva.

79
Um pingo de luz
no topo do arranhacéu.
Brincando de estrela.

80
Garrincha e Pelé.
Depois deles nunca mais
houve igual olé.

81
Ao velhinho, o dia.
Nem passado nem futuro
têm-lhe serventia.

82
Meu sonho está aí?...
Por favor, mande-o de volta,
que a saudade dói.

83
Entre o céu e a terra,
quanta vã filosofia...
E o pior: bem paga.

84
Pois é, meu poeta:
até as crateras da Lua
de longe são belas.

85
Antissolidão.
A cada velhinho a tela
de um computador.

86
Doce portuñol.
Para los niños los nidos
... y los abuelos.

87
Pousa o passarinho
na imagem de São Francisco.
Os irmãos se entendem.

88
Branquinhas, branquinhas,
voam as garças em V.
Vitória da paz.
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Fonte:
ASSIS, A. A. de. Vida, verso e prosa. Maringá: EDUEM, 2010.

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