OUTONO
A bailarina
para o passo
estanca o corpo
diáfano
esconde o sorriso
radiante
estar ali por instantes
triste
bailarina
parada
sua a dor da descoberta
sua a intenção revelada
sua a vontade primeira
descalça as sapatilhas
e as joga fora
sem cumprimentar ninguém
vai embora.
DESCONHECER
Do que não conheço:
a distância rítmica com que as lembranças
se iludem em imagens e fotografias
de altos prédios de faz de conta e o transatlântico
dobra outro cabo
há desesperança em seu apito
frêmito e fremido em espadas divinas
arestas mal aparadas
e eu aqui
parado confesso e conto
não os reconheço vizinhos e parentes
sei que suas faces obscurecem e branqueiam
enquanto atrás das vidraças quando passo
no trajeto com o livro embaixo do braço
no banco da praça leio
as palavras que por lá brincam e conversam
desconheço:
ordens e comandos
pois avesso ao começo
em viagens enjoo a chegada
não carrego malas
e chapéus
nem bengalas
(apenas) levo o que livro.
VIAGEM
Espaço
tempo
espaçonave
aqui
e lá
agora
o corpo com que viaja
traz a imagem
do lado de fora
escuro
tempo
a nave
silêncio
dentro e fora
estática.
HORAS
São horas tantas
passadas
nas músicas repetidas
aos gritos
no bar da esquina
no barulho irritante
dos móveis arrastados
no andar de cima
são tantas horas
insones
a olhar você
dormindo
com as mãos espalmadas
em abrigo
do rosto descansado
de quem sonha
horas tantas são
esperadas
como se o milagre
pudesse as multiplicar
no meu tanto faz.
VÍRUS
O vírus vive (morre) onde ataca. Destaca
a fragilidade aberta ao contato. Vivencia
o ato da disputa: o revés não o aniquila.
Feito paciente no horário determinado.
O corpo não permite ao vírus a entrada.
Cede no cansaço de anos de batalha.
O vírus permanece na oportunidade.
MISTÉRIO
Sobre o mistério de eu ter vindo
no longo serpentear do caminho
ignaro e ignoto homem
eu sozinho
refeito em paisagens borradas
pelos olhos anteriores
eu distraído
esquecido de ser paragem
no horizonte
nas tênues - poucas -
luzes
eu trazido
em oferenda e oferta de carinhos
ensimesmado nos castigos
eu parido
em primavera longínqua e esquecida
de uma casa sob a rua
eu surgido
no minuto terço
eu nascido
não explicam as razões
eu estando
nem dizem que o amor esconde
o canto
em cantigas antigas
eu espanto
esperta criança
eu corrido
que aguarda nas noites
eu sofrido
a explicação do mistério e a finalidade
de ter vindo
e ter estado
eu aqui.
VIDA
No zumbido
a zombaria
dos garotos
acompanha
a passagem
a raiva transforma
a reação em nada
e o corpo apressa
o passo
o zumbido ecoa
nos ouvidos
a vida escoa
em passos
os garotos
ficam para trás.
ESQUECER
Cada vez revejo
o olvido
no ouvido permanece
o domingo no zumbido
do coro religioso
cada vez refaço
o olvido
em mim se renovam
expostas palavras
que descortinam
o canto dolente
da língua materna
cada vez recomeço
o olvido.
PAIXÃO
a paixão devora olhos e corações
de épocas e sentidos com que
passamos horas e dias frios
para chegarmos a esse tempo
e encontrarmos o vazio
de não havermos encontrado
a pronúncia exata das palavras
na maneira certa de dizer
estamos aqui e a paixão
permanece em nossos olhos
embaçados em lágrimas
de reconhecimento
como naquelas horas
e como serão em futuros
tempos de mãos entrelaçadas
chegamos sem esquecer e sobrecarregamos
a memória e as lembranças com as imagens
nas músicas em altos sons
e perguntas presas
em gargantas curtas
de desejos e secura
a nossa história recortada em quadros
passados lentamente entre as lentes
dos óculos que usamos e nos servimos
para enxergamos o que não vimos cedo
estávamos cegos em blindagens jovens
e tínhamos a certeza de que as incertezas
seriam dos caminhos as trilhas e as armadilhas
que não nos pegariam na passagem
essa paixão extravasa a hora
fôssemos pessoas espiando
o lado de fora de cada um
meros espantalhos em hastes
de empregos e desesperanças
de que tudo termine logo após
o instante em que os corpos
se desencontrem
somos mais que paixões ardentes
dos dentes cravados das serpentes
ávidos pelo fim da história.
Fonte:
A bailarina
para o passo
estanca o corpo
diáfano
esconde o sorriso
radiante
estar ali por instantes
triste
bailarina
parada
sua a dor da descoberta
sua a intenção revelada
sua a vontade primeira
descalça as sapatilhas
e as joga fora
sem cumprimentar ninguém
vai embora.
DESCONHECER
Do que não conheço:
a distância rítmica com que as lembranças
se iludem em imagens e fotografias
de altos prédios de faz de conta e o transatlântico
dobra outro cabo
há desesperança em seu apito
frêmito e fremido em espadas divinas
arestas mal aparadas
e eu aqui
parado confesso e conto
não os reconheço vizinhos e parentes
sei que suas faces obscurecem e branqueiam
enquanto atrás das vidraças quando passo
no trajeto com o livro embaixo do braço
no banco da praça leio
as palavras que por lá brincam e conversam
desconheço:
ordens e comandos
pois avesso ao começo
em viagens enjoo a chegada
não carrego malas
e chapéus
nem bengalas
(apenas) levo o que livro.
VIAGEM
Espaço
tempo
espaçonave
aqui
e lá
agora
o corpo com que viaja
traz a imagem
do lado de fora
escuro
tempo
a nave
silêncio
dentro e fora
estática.
HORAS
São horas tantas
passadas
nas músicas repetidas
aos gritos
no bar da esquina
no barulho irritante
dos móveis arrastados
no andar de cima
são tantas horas
insones
a olhar você
dormindo
com as mãos espalmadas
em abrigo
do rosto descansado
de quem sonha
horas tantas são
esperadas
como se o milagre
pudesse as multiplicar
no meu tanto faz.
VÍRUS
O vírus vive (morre) onde ataca. Destaca
a fragilidade aberta ao contato. Vivencia
o ato da disputa: o revés não o aniquila.
Feito paciente no horário determinado.
O corpo não permite ao vírus a entrada.
Cede no cansaço de anos de batalha.
O vírus permanece na oportunidade.
MISTÉRIO
Sobre o mistério de eu ter vindo
no longo serpentear do caminho
ignaro e ignoto homem
eu sozinho
refeito em paisagens borradas
pelos olhos anteriores
eu distraído
esquecido de ser paragem
no horizonte
nas tênues - poucas -
luzes
eu trazido
em oferenda e oferta de carinhos
ensimesmado nos castigos
eu parido
em primavera longínqua e esquecida
de uma casa sob a rua
eu surgido
no minuto terço
eu nascido
não explicam as razões
eu estando
nem dizem que o amor esconde
o canto
em cantigas antigas
eu espanto
esperta criança
eu corrido
que aguarda nas noites
eu sofrido
a explicação do mistério e a finalidade
de ter vindo
e ter estado
eu aqui.
VIDA
No zumbido
a zombaria
dos garotos
acompanha
a passagem
a raiva transforma
a reação em nada
e o corpo apressa
o passo
o zumbido ecoa
nos ouvidos
a vida escoa
em passos
os garotos
ficam para trás.
ESQUECER
Cada vez revejo
o olvido
no ouvido permanece
o domingo no zumbido
do coro religioso
cada vez refaço
o olvido
em mim se renovam
expostas palavras
que descortinam
o canto dolente
da língua materna
cada vez recomeço
o olvido.
PAIXÃO
a paixão devora olhos e corações
de épocas e sentidos com que
passamos horas e dias frios
para chegarmos a esse tempo
e encontrarmos o vazio
de não havermos encontrado
a pronúncia exata das palavras
na maneira certa de dizer
estamos aqui e a paixão
permanece em nossos olhos
embaçados em lágrimas
de reconhecimento
como naquelas horas
e como serão em futuros
tempos de mãos entrelaçadas
chegamos sem esquecer e sobrecarregamos
a memória e as lembranças com as imagens
nas músicas em altos sons
e perguntas presas
em gargantas curtas
de desejos e secura
a nossa história recortada em quadros
passados lentamente entre as lentes
dos óculos que usamos e nos servimos
para enxergamos o que não vimos cedo
estávamos cegos em blindagens jovens
e tínhamos a certeza de que as incertezas
seriam dos caminhos as trilhas e as armadilhas
que não nos pegariam na passagem
essa paixão extravasa a hora
fôssemos pessoas espiando
o lado de fora de cada um
meros espantalhos em hastes
de empregos e desesperanças
de que tudo termine logo após
o instante em que os corpos
se desencontrem
somos mais que paixões ardentes
dos dentes cravados das serpentes
ávidos pelo fim da história.
Fonte:
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