quinta-feira, 20 de março de 2014

Pedro Du Bois (Navegando nos Versos)

PROVÍNCIAS

Pensou ser histeria
a província. Estava
olhando o espaço
errado. A província
incógnita contém
ideias indigestas
trazidas de fora. O cosmo
fechado em buracos atrai
a sede da permanência:
bom dia boa tarde boa noite.

FAMÍLIA

Pais e filhos distanciados
                                em compromissos
             de escola e trabalho

             desconhecidos no final do dia

secas cadeiras de altos espaldares
escondem corpos cansados
                            de frustrações
                              e raiva: poucas
              esperanças de dias acalmados
                                nos finais de semana

             tempo: erro humano de progresso
             e regresso
                         em novos caminhos
                         de reis e rainhas
                                       em troncos
                                       no despetalar
                                       de secas flores

pelas ruas a cidade perambula corpos
isentos de culpas na espera de trens
atrasados desde a infância.

PENSAMENTOS

observo a paisagem
                         além
                         a noite se aclara

pensamentos estrelam
a velocidade necessária

a paisagem cessa na nuvem
em que o pensar permanece
                     
                       atento

tempos difíceis de descobertas
ensombrecem a vida em relações
vazias de interpretação única

retorno à luz das estrelas
no firmamento sem sombras

não encontro o significado
                         para estar aqui

                         meus olhos fixam o horizonte
                         no firmamento que desaparece

(serão) dias de difíceis ultrapassagens
                         pela paisagem fechada

SOLIDÃO

O carro diminui a marcha
                                sinaliza
                       sai da estrada
                       e para

nenhum envelope posto
                             sob a porta

o carro parado
            na noite
            suas luzes
                   indicam a ignição
                                     ligada

nenhuma mão procura
sob a porta
      algum envelope

o tiro ecoa
o corpo cai
             sobre a direção
e as luzes se apagam.

VIDRAÇAS
 

A vidraça transcende defesas: mostra
aos olhos educados a graça da visão.

Determina a transparência e alucina
o corpo visto. Desconta as sombras
e alisa o rosto. Encontra o espaço
e se projeta no vazio da imagem.

Revista em séries inconcebíveis
a vidraça alonga a visão da casa
e a integra ao lado de fora.

Nada pretende além de ligar
o exposto e o imposto
ao silêncio.

MONTANHAS

 Traz o sorriso
em olhos brilhantes
a música rápida e alta
montanhas aparentes
no presente
em que se apresentam
músicos

sorrisos de entrevistas vidas
além dos poucos rostos
que admiram a vista

montanhas e gritos
nos ecos de tempos
em planícies.

SONHOS

Por que não escrevo sobre sonhos
sofro tormentosos instantes
em que a cena desnuda desenredos
de náufragos sentimentos

na busca de longos desencontros

ávidas águas serpenteiam pecados
não acontecidos na comunhão do corpo
                           no esgarçar dos tecidos
                           no semi-brilho das alturas
                           e no não chegar

sou sombra sobra sobrado encantado
da esquina no caminhar retilíneo pela calçada

descoradas paredes liberam o corpo
de meu futuro passado e presente
momento na mumificação do corpo
em sorrisos e esgares

movimento protelatórios
em que o acordar se manifesta
                                     e cessa.

Fonte:
O Autor

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