sábado, 25 de dezembro de 2010

Monteiro Lobato (Emília no País da Gramática) Capítulo XVII: Epílogo

Quando Emília voltou para onde se achavam os meninos, viu-os em preparativos para o regresso. Estavam com uma fome danada.
— E o Visconde? — indagou ela. — Apareceu?

— Está aqui, sim — respondeu Pedrinho —, mas nega a pés juntos que haja furtado o Ditongo.

Emília aproximou-se do velho sábio, que tinha uma bochecha inchada de dor de dente.

— Então, onde está o Ditongo, Senhor Visconde? — interpelou ela, de mãozinha na cintura e olhar firme.

O pobre fidalgo pôs-se a tremer, todo gago.

— Eu. . . eu. . .

— Sim, o senhor mesmo! — disse Emília com vozinha de verruma. — O senhor raptou o Ditongo Ão e escondeu-o em qualquer lugar. Vamos. Confesse tudo.

— Eu. . . eu. . . — continuava o fidalgo, que não sabia lutar com a boneca.

Emília refletiu uns instantes. Depois agarrou-o e fê-lo abrir a boca à força. O Ditongo furtado caiu no chão. . .

— Vejam! — exclamou Emília, vitoriosa. — Ele tinha escondido o pobre Ditongo na boca, feito bala. Que vergonha, Visconde! Um homem da sua importância, grande sábio, ledor de álgebra, a furtar Ditongo. . .

— Eu explico tudo — declarou por fim o Visconde, muito vexado. — O caso é simples. Desde que caí no mar, naquela aventura no País da Fábula fiquei sofrendo do coração e muito sujeito a sustos. Ora, este Ditongo me fazia mal. Sempre que gritavam perto de mim uma palavra terminada em Ão, como Cão, Ladrão, Pão e outras, eu tinha a impressão dum tiro de canhão ou dum latido de canzarrão. Por isso me veio a idéia de furtar o maldito Ditongo, de modo que desaparecessem da língua portuguesa todos esses latidos e estouros horrendos. Foi isso só. Juro!

Emília ficou radiante de haver adivinhado.

— Eu não disse? — gritou para os meninos. — Eu não disse que devia ser isto?

E para o desapontadíssimo fidalgo:

— Pegue o Ditongo e vá botá-lo onde o achou. Você não é Academia de Letras para andar mexendo na língua. . .

Meia hora mais tarde já estavam todos no sítio, contando ao Burro Falante o maravilhoso passeio pelas terras da Gramática.

.•.•´¯`•.•. ( FIM ) .•.•´¯`•.•.

Fonte:
LOBATO, Monteiro. Emília no País da Gramática. SP: Círculo do Livro. Digitalizado por http://groups.google.com/group/digitalsource

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