AS DUAS IRMÃS
Vem a primeira a fala-lhe em segredo:
“Amiga, vê, (nem sei como isto conte!)
Como correm as águas desta fonte:
Tal corre a vida, e acaba-se tão cedo!
Ama, pois!” A segunda, em cuja fronte
Brilha um raio de luz, murmura, a medo,
Apontando-lhe o chão: “Este é o degredo
Perpétuo e atroz do teu amor insonte.
Contudo, espera.” E somem-se a Esperança
E a Saudade. E ela fica, como doida,
A olhar o rastro dessas deusas belas...
E ela fica esperando-as.... Cansa, cansa
De esperá-las assim, a vida toda,
Sem jamais receber notícias delas! ...
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A UMA CRIANÇA
(Imitação de Hugo)
Vous qui ne savez pas combien l’enfance est belle,
Enfant! N’enviez point notre age de douleurs...*
Vitor Hugo.
Vous qui ne savez pas combien l’enfance est belle,
Enfant! N’enviez point notre age de douleurs...*
Vitor Hugo.
Choras, criança, mas chorar não deves;
Entre a velhice e as tuas horas leves
É pequena a distância;
Choras debalde; choras,
Por que não sabes, flor, quanto são breves
Da humana vida as horas,
Por que não sabes quanto é bela a infância!
Tu, cuja vida é um suave paraíso
Adornado de flores,
Da nossa vida mísera de dores
Amargas e revezes,
Nunca invejes o júbilo indeciso,
Porque teu pranto é menos triste, às vezes,
Do que nosso sorriso.
Os teus dias são rosas
Que vicejam, alegres e radiosas,
Nessas tuas manhãs de eternas galas;
Nunca as desfolhem, gárrula criança;
Deixa-as em paz, descansa,
Deixa que o tempo venha desfolhá-las.
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*“Você não sabe como é linda a infância,
Criança! Não inveje nossa idade de dor...”
Criança! Não inveje nossa idade de dor...”
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EGITO
No ar pesado, nenhum rumor, o menor grito;
Nem no chão calvo e seco o mais pequeno adorno;
Um velho ibe* somente arranca um raro piorno**
Que cresce pelos vãos das lajes de granito.
A aura branda, que vem do deserto infinito,
Arrepia, ao de leve, a água do Nilo, em torno.
Corre o Nilo, a gemer, sob um calor de forno
Que, em ondas, desce do alto e invade todo o Egito.
Destacando na luz, agora, o vulto absorto
De um adelo que passa, em caminho da feira,
Dá mais um tom de mágoa ao vasto quadro morto.
Bate na areia o sol. E, num sonho tranquilo,
Pompeia, ao largo, a alvura uma barca veleira,
A tremer, a tremer sobre as águas do Nilo.
EGITO
No ar pesado, nenhum rumor, o menor grito;
Nem no chão calvo e seco o mais pequeno adorno;
Um velho ibe* somente arranca um raro piorno**
Que cresce pelos vãos das lajes de granito.
A aura branda, que vem do deserto infinito,
Arrepia, ao de leve, a água do Nilo, em torno.
Corre o Nilo, a gemer, sob um calor de forno
Que, em ondas, desce do alto e invade todo o Egito.
Destacando na luz, agora, o vulto absorto
De um adelo que passa, em caminho da feira,
Dá mais um tom de mágoa ao vasto quadro morto.
Bate na areia o sol. E, num sonho tranquilo,
Pompeia, ao largo, a alvura uma barca veleira,
A tremer, a tremer sobre as águas do Nilo.
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* Ibe ou Ibis: ave do Egito.
** Piorno = Denominação de vários tipos de arbusto do gênero retama.
* Ibe ou Ibis: ave do Egito.
** Piorno = Denominação de vários tipos de arbusto do gênero retama.
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MÃE
Embora a mágoa a aflija e a sorte a oprima,
O seu amor, como celeste esmola,
É um perfume sutil que se lhe evola
Do peito e sobe deste mundo acima.
Com que ternura a sua voz me anima,
Quando, pelo meu rosto, o pranto rola!
Ninguém, como ela, a minha dor consola,
Ninguém, como ela, o meu pesar lastima.
Julgo-me só e chamo-a... Ela não tarda!
Volta, acode-me, alegre; e, num momento,
Desfaz a dor que o coração me enluta.
Ela é a mais fiel, a mais constante guarda
Que, no meio da noite, o ouvido atento,
O meu suspiro entrecortado escuta.
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QUADRO INCOMPLETO
Foi um rico painel. Traço por traço,
Nele notava-se a paixão do artista.
Via-se, ao fundo, a tortuosa crista
De altas montanhas a beijar o espaço.
No centro, um rio, a distender o braço.
Selvas banhavam em triunfal conquista.
Ao longo, dois amantes, pela lista
De um carreiro, seguiam, passo a passo.
Foi um rico painel. Uma obra finda
A primor, que, apesar de velha, ainda
Conservava das cores a frescura.
Hoje, porém, não é como era dantes:
Pois no ponto onde estavam os amantes,
Existe apenas uma nódoa escura.
MÃE
Embora a mágoa a aflija e a sorte a oprima,
O seu amor, como celeste esmola,
É um perfume sutil que se lhe evola
Do peito e sobe deste mundo acima.
Com que ternura a sua voz me anima,
Quando, pelo meu rosto, o pranto rola!
Ninguém, como ela, a minha dor consola,
Ninguém, como ela, o meu pesar lastima.
Julgo-me só e chamo-a... Ela não tarda!
Volta, acode-me, alegre; e, num momento,
Desfaz a dor que o coração me enluta.
Ela é a mais fiel, a mais constante guarda
Que, no meio da noite, o ouvido atento,
O meu suspiro entrecortado escuta.
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QUADRO INCOMPLETO
Foi um rico painel. Traço por traço,
Nele notava-se a paixão do artista.
Via-se, ao fundo, a tortuosa crista
De altas montanhas a beijar o espaço.
No centro, um rio, a distender o braço.
Selvas banhavam em triunfal conquista.
Ao longo, dois amantes, pela lista
De um carreiro, seguiam, passo a passo.
Foi um rico painel. Uma obra finda
A primor, que, apesar de velha, ainda
Conservava das cores a frescura.
Hoje, porém, não é como era dantes:
Pois no ponto onde estavam os amantes,
Existe apenas uma nódoa escura.
Fonte:
Francisca Júlia da Silva. Mármores. Brasília: Senado Federal, 2020. Publicado originalmente em 1895.
Francisca Júlia da Silva. Mármores. Brasília: Senado Federal, 2020. Publicado originalmente em 1895.
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