Romance de estreia de Fitzgerald, “Este lado do paraíso” alcançou sucesso imediato quando foi publicado originalmente em 1920. Este livro é o retrato de uma geração jovem desiludida com a guerra, conhecida como Geração Perdida. Fitzgerald foi o porta-voz de sua época, identificando-se com a juventude americana elegante e irreverente.
Podemos facilmente dizer que o livro trata-se de um romance de formação por nos mostrar a trajetória de Amory desde seus primeiros anos, ainda criança - uma das partes mais interessantes do livro é a que concentra-se na mãe do personagem -, até o momento em que ele, já formado e tendo passado por uma guerra, encontra-se sem direção.
Nascido em berço de ouro, Amory Blaine foi mimado por sua mãe, Beatrice, uma mulher que reunia as qualidades esperadas de uma dona-de-casa rica da virada do século XX. Ela era bonita, interessante, propensa a doenças misteriosas e com um fraco por vícios em bebidas e medicamentos. Nada além do normal dentro daquela sociedade. Beatrice praticamente criou Amory sozinha, já que o pai do rapaz ausenta-se durante todo o romance. A educação era, de fato, vista como assunto de mulheres. E Amory foi educado de forma muito próxima pela mãe durante seus anos de infância, o que parece tê-lo marcado para sempre. Se Fitzgerald colocou tal construção como crítica ao apego entre uma mãe e um filho fica à interpretação do leitor.
É interessante perceber como Amory passa de um jovem que tem tudo - dinheiro, status e convicções firmes - para alguém que não possui grandes certezas, alquebrado pelo mundo que o rodeia, a qual não mais sente-se pertencente. O Amory que acompanhamos durante mais da metade do romance exibindo seu intelecto, fazendo farras com os colegas, tendo diversos encontros e usando o mundo como se fosse seu parque de diversões é bem diferente do rapaz que encontramos da metade para o final da história, quando ele já está com as ilusões por terra e enxerga o mundo e a si mesmo como coisas irremediáveis.
O estilo muda conforme Amory vai perdendo as bases fundamentais que sustentavam sua personalidade. O que começa como prosa muda para poemas, diários, cartas e teatro. Não há uma constante porque aquela era uma época de mudanças - tal qual o é esta. A guerra, a crise econômica, o rompimento com Rosalind, seu primeiro e mais intenso amor (claramente baseada em Zelda), a pandemia, a falta de perspectivas, tudo deprime aqueles personagens, que continuam tentando encontrar seus lugares, quer seja numa profissão, quer seja num casamento tradicional, seguindo os passos da geração anterior que já não se encaixam naquele contexto, pois os valores vitorianos foram rompidos no início do século XX.
Amory é um jovem rico, de família tradicional, e que cumpre os requisitos da alta sociedade da época. Vai para um internato, estuda numa faculdade de ponta, entra para uma fraternidade, é benquisto pelos colegas - e até mesmo um pouco invejado. Mas, conforme vai se aventurando por leituras de autores clássicos, como Tolstói, políticas e filosóficas, Amory tem sua visão de mundo modificada. Isso dialoga com a experiência que teve na pré-adolescência, nos poucos anos em que morou junto com os tios, no meio do nada, onde viveu à parte do círculo de riquezas e benefícios que lhe cercaram desde o berço. Embora ele fosse um jovem rico para quem tudo estava ao alcance, o mundo que se desenhava à sua frente era mais complexo e ele, seja por suas leituras, seja pela experiência de ter morado com os tios num local afastado e visto algo para além de si mesmo e do luxo com o qual crescera, não conseguia simplesmente ignorar aquilo que percebia. Sua sede por tornar-se alguém - ter uma definição que fosse além dos muros do nascimento - cresceu de tal modo que afetou os rumos de sua vida, impregnando para sempre Amory de um sentimento de desilusão.
Com uma narrativa vibrante, um tom fortemente autobiográfico e sua ironia típica, o autor nos revela a imaturidade e a insensatez dos jovens deslumbrados pelo progresso. Um dos maiores escritores americanos do século XX, Francis Scott Fitzgerald publicou, além de contos e ensaios, os romances Os belos e malditos (1922), O grande Gatsby (1925), Suave é a noite (1934) e O último magnata (1941).
“Francis Scott Fitzgerald captou como ninguém o que era ser jovem numa América ainda jovem. E o conseguiu fazendo o que para muitos escritores é conveniência, mas em seu caso era coragem: levando sua vida para sua arte de forma inédita.” Daniel Piza, trecho do prefácio.
Fontes:
Ed. Record
Mia Sodré. Este Lado do Paraíso: os ecos de uma Geração Perdida. In Querido Clássico. nov. 2020.
Ed. Record
Mia Sodré. Este Lado do Paraíso: os ecos de uma Geração Perdida. In Querido Clássico. nov. 2020.
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