domingo, 13 de dezembro de 2015

Contos Populares do Tibete (O Primeiro Rei do Tibete)

Na época em que os tibetanos eram governados por doze chefes sem importância, havia muito descontentamento e muitas contendas, pois eles não tinham um chefe único e eram uma nação dividida. Foi durante esse período que o rei de Vatsa, na índia, teve um filho. A criança, porém, não era um menino normal, pois havia nascido com sobrancelhas de cor turquesa, pálpebras salientes e mãos espalmadas.

O rei estava muito aflito e toda a corte se mostrava assustada com o estranho menino. Assim foi que, querendo livrar-se dele, o rei ordenou que o colocassem numa caixa de cobre e que o lançassem ao Rio Ganges. Quando isto se efetivou, o rei e a rainha, assim como todos os do palácio, suspiraram aliviados por se verem livres, finalmente, daquele embaraçoso engendro da natureza.

O menino, entretanto, não morreu, pois foi achado por um camponês. Este, ao abrir a caixa e encontrar dentro dela a estranha criancinha, encheu-se de amor por ela e a levou para a sua casa, a fim de que vivesse como alguém de sua família. Dessa maneira, o menino passou uma infância feliz, amado e cuidado pelo camponês e por sua mulher.

Quando o menino se tornou moço, o camponês achou que já era hora de que conhecesse as suas estranhas origens. Contou-lhe, então, a história de como ele havia sido encontrado numa caixa de chumbo às margens do Ganges. E, para que o rapaz não tivesse a impressão de que havia sido abandonado, o camponês tratou de convencê-lo de que ele era alguém muito especial: na verdade, um "poderoso", nascido de berço rico. O moço, entretanto, se entristeceu muito ao ouvir a história do camponês, pois sempre havia acreditado que fazia parte da família deste, a quem considerava como pai. Em sua aflição, o rapaz fugiu em direção aos Himalaias e cruzou a fronteira do Tibete, onde passou dias e dias sozinho, ao abrigo das montanhas.

Nesse lugar, o moço acabou encontrando alguns sacerdotes tibetanos da antiga religião. Estes, ao verem o estranho jovem, tomaram-no por um deus, pois, ao lhe perguntarem quem era, ele respondera, simplesmente: "Um poderoso".(1) E quando lhe pediram para dizer de onde havia vindo, o rapaz indicara a direção da índia, do outro lado das montanhas — e os sacerdotes acreditaram que estivesse indicando os céus. Devido ao obstáculo da língua, os sacerdotes abandonaram os esforços para comunicar-se com ele; apenas fizeram com que o moço fosse colocado numa cadeira de madeira, que quatro homens carregaram às costas. E os sacerdotes declararam: "Vamos constituí-lo em senhor nosso".

E assim foi como ficou sendo conhecido "o poderoso da cadeira de mãos" e como o Tibete teve constituído o seu primeiro rei.(2)
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Notas
1. Este epíteto (em tibetano btsan-po) passou a ser aplicado a todos os reis do Tibete.
2. Este personagem lendário é conhecido em tibetano como Nyakhri Tsampo (Nyag-khri btsan-po).
Toda "felicidade que existe no mundo nasceu inteiramente do desejo do bem aos outros. Toda a infelicidade que existe nasceu do egoísmo.


Fonte:
Jayang Rinpoche. Contos Populares do Tibete. (Tradução: Lenis E. Gemignani de Almeida).

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