QUESTÃO DE PURA LÓGICA
O PROFESSOR EVERALDO, da cadeira de matemática ergue com as duas mãos uma folha branca de papel, dessas A-4, e a exibe a seus alunos. Em seguida, pergunta para o Carlinhos, o guri sentado numa das carteiras logo à frente:
— Carlinhos, se eu dividir esta folha de papel em dois pedaços, com o que é que eu fico?
Carlinhos prontamente se levanta e responde:
— Com duas bandas ou duas metades, professor.
— Perfeito. Sandrinho, sua vez. Se eu dividir esta folha em quatro pedaços, com o que é que eu fico?
— O senhor ficará com quatro pedaços, ou quatro metades, professor.
— Ok. Toninho, a mesma indagação vai pra você. Se eu dividir esta folha que está aqui em seis pedaços, quantas partes terei?
— Seis partes, professor, ou seis metades.
— Muito bom, Toninho, muito bom.
O professor Everaldo pega uma segunda folha de papel igual a primeira e insiste na pergunta, agora ao menino Marcelinho:
— Marcelinho, e se eu dividir esta outra folha, ou melhor, se eu recortá-la com a tesoura. — Faz uma pausa, passa a mão na tesoura sobre a mesa — Repetindo, Marcelinho: se eu pegar esta folha e a dividir em oito pedaços iguais, quantos partes terei?
Marcelinho se levanta, pensa um pouco antes de responder:
— E então, Marcelinho, estou esperando. Qual é a sua resposta?
— Oito partes, professor, ou oito metades.
— Bravo, Marcelinho. Pode sentar. Estou vendo que meus alunos, a cada dia se esmeram em aprender a minha matéria. Estão mais confiantes, mais atenciosos. Para falar a verdade, estou gostando de ver.
Após estas palavras elogiosas, o professor volta a recortar a folha em dez pedacinhos exatamente do mesmo tamanho:
— Bebel, minha linda, sua vez. Como pode ver, cortei a folha de papel em dez pedaços iguais. Vou repetir a pergunta que fiz anteriormente a seus coleguinhas. Pronto. Aqui está. Dez pedaços. Diga, minha princesa, com quantas partes fiquei?
Bebel se levanta de um salto e manda a primeira coisa que lhe vem à cabeça:
— Professor Everaldo, os cortes que o senhor fez aí são iguais?
O professor Everaldo estranha a pergunta, todavia, acha melhor esclarecer a dúvida trazida e deixar a menina em paz com a sua controvérsia:
— Claro, Bebel. Qual a sua dificuldade?
— É que olhando daqui, professor, essas tirinhas parecem diferentes umas das outras.
— Bebelzinha, são iguais.
— O senhor quer dizer, do mesmo tamanho?
— Sim, Bebel. Então, minha garotinha do coração: qual a sua resposta?
— Que resposta, professor?
— Com quantas partes eu ficarei?
— Bem, se o senhor está dizendo que a folha foi repartida em dez partes iguais, o senhor terá um total de dez partes, ou dez metades, ou dez oitavos.
O professor Everaldo sorri:
— Muito bem, Bebel, muito bem.
Assim, nessa ordem segue o professor repetindo idêntica aventura com as folhas A-4. Cada novo aluno chamado, subia o valor dos" despedaços". De posse de uma terceira folha, rasga-a em doze. Ato contínuo, em quatorze e dezesseis. Depois, cada vez em tirinhas menores, separa em dezoito, vinte, vinte e duas, vinte e quatro, vinte e seis, vinte e oito e, finalmente, dilacera em trinta fatias.
Chega a vez do pior aluno da turma. O Emanuelito Bocó. Emanuelito Bocó, além de chato e pedante, tedioso e sem noção, gosta de aparecer, o que faz o professor sair totalmente do sério, ficar irritado e terminar a aula abruptamente querendo mandar todo mundo para o inferno. Entretanto, Emanuelito Bocó faz parte da sua classe. Se não o chamar, terá problemas futuros não só com o Bocó, aluno, igualmente a galera da coordenação cairá feio sobre seus costados:
— Emanuelito, como pode ver, dividi esta A-4 em trinta partes. A pergunta que farei, se prestou atenção à minha aula é, sem tirar nem pôr, a que formulei aos seus demais coleguinhas aqui presentes. Consegui compartimentar na frente de todos esta folha em trinta pequenos estilhacinhos. Quase não consegui. Mas tudo bem. Aqui estão as trinta lasquinhas daquela folha de papel em branco. Com quantos quartos, ou com quantos oitavos eu fiquei?
— O senhor quer que eu fale só dos quartos?
— Por certo, Emanuelito.
— O senhor não vai perguntar depois, pelos banheiros, salas e cozinhas?
— Emanuelito, por favor. Não complique. Estamos tratando de quartos. Quartos!
Emanuelito Bocó, insiste, sorriso desdenhoso no rosto magro. Segue desafiando o pobre mestre:
— Eu sei professor. Mas onde tem quartos, costuma ter salas, varandas, dependências de empregada...
O professor Everaldo a partir daí começa a ficar perturbado e a tremer as mãos:
— Emanuelito, meu filho. Quartos. Piquei a folha A-4 em branco em trinta pedacinhos. Vamos lá. Com quantos quartos fiquei?
— Eu estou na dúvida, professor... Acho que até agora todo mundo aqui respondeu errado à sua pergunta.
— Emanuelito, vou ser mais claro. Esquece os seus coleguinhas, deleta os quartos, etc., etc. Vamos nos enveredar por outra ótica. Se eu rasgar, ou dito de forma mais objetiva, para você me entender... Se eu dividir esta folha em cem ou duzentos pedacinhos, o que terei?
Zombando descaradamente do professor, o moleque manda a pancada final:
— Bem, nesse caso, o senhor não terá nem quartos, nem salas, ou varandas. Menos ainda bandas, metades ou partes, ou pior oitavos. De onde o senhor e a Bebel tiraram o tal do oitavo?! No meu entender, se o senhor rasgar essa folha em trinta, ou cem, ou duzentos pedacinhos, não importa o número, terá sim um montão de papeizinhos picados pra jogar no lixo!
Fonte:
Aparecido Raimundo de Souza. Comédias da vida na privada. RJ: Editora AMC-Guedes, 2020.
Texto enviado pelo autor.
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