segunda-feira, 10 de agosto de 2020

Dorothy Jansson Moretti (Pra Ver a Banda Passar)


Tenho lido neste jornal colunas e editoriais que dizem que se pretende criar (ou recriar) a banda em Itararé.

Que alegre notícia! Em minha opinião as bandas são um grande encanto das cidades do interior. Conheci tantas! Morei treze anos em Sorocaba, famosa por suas extraordinárias corporações musicais, a cujos concertos nas praças jamais deixei de assistir.

Sempre adorei ver a banda passar. Recuo no tempo aos meus cinco ou seis anos de idade, quando o Professor Miguel, meu cunhado, era regente da Lira Itarareense. A banda era um espetáculo! Ele era muito competente, tinha muito bom gosto e dentre as belas peças que seus músicos executavam, destacavam-se muitas de suas lindas composições; marchas, foxes, valsas, mazurcas, polcas, sambas, chorinhos, batucadas, maxixes...

Fato pitoresco: quando ele namorava minha irmã Sílvia, a banda parava em nossa esquina para fazer serenata. Os músicos perfilavam-se de frente para a casa de Seu Durval, dando as costas à nossa casa, artifício para despistar e evitar encrencas com meu pai, futuro sogro que — como todo pai que se prezava naquela época — era uma "fera"!

Eu não perdia uma passada da banda. Ao ouvir os primeiros acordes, corria para a calçada c ficava olhando até ela desaparecer numa esquina, morrendo de vontade de juntar-me aos moleques que a seguiam, marchando atrás.  

Sob a regência de Seu José Melillo, já mocinha, eu assistia aos concertos no velho coreto. (Por que o tiraram de lá? Era tão tradicional, tão relíquia!)
 
Nunca esqueci de um 1. de Maio, em que minha mãe, Gustavo, Linéa e eu fomos acompanhar meu irmão Antônio à estação, onde ele ia tomar o trem, de volta à sua cidade. Era madrugada e a banda de Seu Melillo estava fazendo alvorada. Ao passar pela Rua Quinze, tocava uma linda marcha cujas primeiras notas eram;
MI-FÁ-SOL LA-SOL-MI RE-DO-MÍ...

Qual era o nome dessa marcha? Gostaria tanto de saber! Ficou gravada em minha memória para sempre.

Lembro-me também das Sextas-feiras Santas e das músicas lentas e fúnebres nas procissões. Na madrugada do encontro de Maria com Jesus, a gente acordava com a música. Abria-se a janela e ficava-se apreciando. Seria por isso que a Semana Santa naquele tempo tinha mesmo uma cara de Semana Santa ?!

Em todas as festas de escola, em todas as reuniões cívicas ou sociais, lá estava a banda para animar a gente e dar o seu toque festivo.

Tomara que esse novo (ou velho?) sonho de Itararé logo se concretize! Quero voltar à nossa cidade, e como nos bons tempos de outrora, quero correr para a calçada... PRA VER A BANDA PASSAR.

(Publicado na Tribuna de Itararé – 19/06/1985)

Fonte:
Dorothy Jansson Moretti. Instantâneos. São Paulo: Dialeto, 2012.
Livro enviado pela escritora.

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