sexta-feira, 21 de agosto de 2020

Pedro Du Bois (Poemas Escolhidos) 7


ENGANO

Ser no engano
desengano: a hora do tempo
desmedido dos andares.

Ter estado aqui em outro estado.
Cortar passagem entre o povo
impensável da espera

Saber do fim aproximado e rasgar
em versos o sofrimento acobertado
da esperança: desenganar a imagem
empobrecida das águas turvadas
em cada dia. Adiar a sensação
convincente das emendas
e buscar em frestas o erro
percebido: estar aqui agora
e ainda.
****************************************

INVENÇÕES

Invento o tempo das respostas: respondo
todas as perguntas: interpreto no texto
o avesso do poeta: a publicidade escapa
do controle na pergunta e se faz verdade
consumida em tolo dia de respostas

altero o sentido em respostas
amplas de argumentos parcos
                                 restritos
                                aos sofrimentos
                               aflorados
                              à mente

minto as perguntas banais
da sobrevivência e me auxilio
da leitura quando nas respostas
                a invenção consome a hora
                em que devia estar dormindo.
****************************************

MINHA VIDA

Minha vida é a travessia
a travessura
o atravessado

(do planalto
à praia pela planície)

geográfico dos sentidos
ao ficar recolhido
nos abraços da amada

- ter ido embora
sem medo
do regresso -

no elementar direito de ser discreto
nas imediações do avesso e direto
em relação ao topo das esperas

o rosto acomodado
no travesseiro e os olhos
fechados em sonhos.
****************************************

RESTOS

A limalha de ferro
aparas
a madeira
recortada
em papel

escrevo em grafite
na folha
arrancada à raiz

rasgo a estrada
em pedras cinzeladas.
****************************************

RETENÇÃO

A retenção da hora no dia
acabado em capítulo de novela

- a irrealidade dos fatos
consumida no abstrato
espaço negado ao corpo -

a afobação na voz do eremita
diariamente em mesmas coisas

- sobre o dia de hoje: céus
se sucedem em arcos
e a íris dos olhos conflita.
****************************************

REVER

Revejo
como colocadas as coisas
entre mesas com pessoas
buscando em garfadas
enfrentar seus pensamentos

rever
ajuda?

rever
prejudica?

rever: como não ser
visto novamente.
****************************************

TANTOS

Em tantos estávamos
reunidos: uns aos outros
vazios em ciúmes
não reconhecidos

adultos significantes em sustos
inconcebíveis na idade percorrida
aguentávamos o vento e nas penas
dos pássaros flutuavam pesadelos

estávamos reunidos na imensidão
da casa: na peça principal diante
da mesa decomposta em pratos
e copos derramados. Reviramos
o lixo e não encontramos
a palmatória do mundo
nos gestos de frustrações
e raivas

em tantos estávamos na idade
passada em acovardadas idas
e retornos.
****************************************

TENRA


A planta
Fixa
Fixada
Em terra

Tenra vida

Onde o machado
Veneno
Tormenta
Mão
Age em desacordo

A flor
Seca
Entre folhas
Do caderno
Como lembrança.

Fonte:
Poemas enviados pelo poeta.

Nenhum comentário: