sábado, 6 de fevereiro de 2021

Francisco Elíude Pinheiro Galvão (Poemas Avulsos)

(o poeta faleceu dias atrás (fevereiro) de 2021, em São Vicente/SP)

MENSAGEM OCULTA

Já havia tinta na pena,
mas nada ela escrevia...
E a cada vez que eu tentava,
dela um pingo de tinta caía,
borrando o que
sobre o papel
escrito já estava;
algo que eu, de fato,
mesmo que quisesse ver,
quase não podia!...

Alguém escrevera com lágrimas
sua despedida em dor,
que dizia:

"– Onde quer que você vá
ou seja lá como for,
Se sentir saudades um dia
ou se acaso
se perder do amor,
Não jogue fora as pétalas
da rosa que um dia ornou
as páginas
onde um poema escrito,
Tais pétalas o inspirou!…”
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CASINHA PEQUENINA

Era bem pequenina , ainda me lembro:
Uma porta, duas janelas;
pintada toda de azul
e rodeada de flores belas!...
De manhã, logo cedinho,
o sol que batia nela,
ia clareando casa a dentro
e a alegria em toda ela,
era de contagiar quem a via
ou talvez mais ainda diria
-quem sabe.

Uma certa Flor de tranças sorrindo
com o acanhado olhar ainda só dela,
e que também hoje em mim ainda persiste
a saudade da casinha pequenina,
E daquela Flor sorrindo na janela.
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DOCE FEL

Em delírios balbuciam os teus lábios,
no mais profundo flamar da tua alma
E em deleite a se cobrir são os mais sábios
os contorcidos afagos que me acalmam...

E se em segredo tal paixão se devaneia,
como posso suportar real tortura
que me inflama como a chama da candeia,
enquanto a tua face em minh'alma se emoldura?!

Oh! Céus!...Perdoa-me tal desventura!...
Mas é-me tão doce esse amargo fel,
que em delícia é posto em gostosura
O sabor irresistível desse mel!
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ESQUINA POSTAL

Numa manhã ensolarada
rabisquei calçadas
com meus próprios passos
E pensei:
– Por que me canso de tanto andar,
escrevendo meus pensamentos
remetendo-os pra onde nem sei
ou se nem tenho certeza de sabe-los chegar!

E assim, ousei simplificar:
No fim da rua, uma esquina;
nela envelopei o meu pensar
e calmamente ela se encarregou de postar.
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ABRAÇO

E se eu te disser
que todo amor do mundo
cabe dentro de um abraço!

O que me farias
com um abraço teu?!
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MEUS VERSOS TEUS

Quantas vezes te procurei
nas ruas frias do meu nada,
nas vazias madrugadas...
E em cada uma, em ninguém,
em nenhuma daquelas calçadas
te encontrei?!...

Quantas calçadas!...tantas e quantas
a medirem os passos meus,
que entre sombras, perdidos,
jamais encontraram os teu!...

E no decorrer nefasto do tempo,
apenas ânsia, saudades...tormento;
Lembranças guardadas a sós,
escritas a cada pensamento.

Hoje, apenas em poemas me achastes:
Poemas escritos em livros
que não são só meus
Mas, que são ainda só teus
Os versos que me inspirastes.
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ÉS...

És o aceno distante
que me impõe limite no olhar...
És como o vento brando
acariciando meu rosto
mesmo sem me tocar...
És o alvorecer iluminando em mim
a mais completa inspiração!...
És como a voz que canta,
Encantando e acalentando
meus sonhos,
E sutilmente ensina-me a lição
de como se deve amar!
És poesia, soneto, sintonia...
És como uma voz sublime
que se faz ouvir num canto,
trazendo-me bonança, alegria,
Num perene bem-estar doce e sereno,
Como se fosse
O misterioso azul do mar
Num aceno,
Convidando-me a navegar!…
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A PENA

Inclinou-se a pena
sobre o branco papel inerte
E em compassados movimentos
vai se despindo devagar a cada linha,
Acariciando, em traços, a pálida nudez,
Que irresistivelmente aceita, inconteste,
o seu doce acarinhar,
em solto movimento circular!...
E assim se pondo,em sutil declínio
se deixa envolver por um beijo dado e repetido
sobre aquele macio corpo agora revestido
de tinta a se derramar
em perfeito orgasmo de inspiração,
Que, se também imóvel, agora se faz dormir
num profundo e inaudível ressonar...
E depois...cansada, se reveste,
e outra vez,
Volta a se guardar.
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ACALANTO

Bem queria ser o ápice da ternura,
para afagar teus cabelos,
te embalar em poesia;
te abraçar com ventura...

Quisera ser
a água cristalina da fonte;
o raio de sol no horizonte
ou a brisa morna da aurora:
Para acariciar o teu corpo;
te fazer sonhar comigo
e ver-te pensar em mim ao despertar!...

Quisera ser um rouxinol
cantando na tua janela;
ver tuas mãos se entrelaçando
ao bocejar diante de um arrebol...
E no final do dia,
quando todo o céu se cobrisse de luz
sob o luar de morno encanto
a iluminar esse amor
Eu pudesse, sobre ti,
derramar-me em doce e terno acalanto.
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Francisco Elíude Pinheiro Galvão, filho de Francisco Lopes Galvão e Antonia Tonita Pinheiro Galvão, nasceu em Currais Novos/RN. Mudou-se para S. Vicente em 1978.

Poeta, autodidata, membro Efetivo da Academia Vicentina de Letras, Artes e Ofícios e Acadêmico Honorário da Academia Boituvense Letras e Artes na cidade de Boituva (SP), Membro do Grupo Literário "Poetas Vivos" de Santos (SP), Embaixador Universal da Paz pelo Cercle Universel Des Ambassadeures de La Paix -Suisse/France. Participações em diversas Antologias Poéticas no Brasil e Exterior, em diversos Concursos Literários (com premiações), em Revistas Literárias pelo Clube dos Escritores de Piracicaba(SP), Caderno Literário pela Editora Pragmatta(RS).

Faleceu de câncer em fevereiro de 2021.

2 comentários:

Anônimo disse...

Obrigada por compartilhar as poesias do meu pai!

Jota Feldman disse...

Meus sentimentos, Nathali. O corpo do poeta se vai, mas a sua voz através de seus versos não se cala nunca, ela sempre está presente em nossas vidas, dia a dia, e deste modo o poeta estará sempre presente.