tanta maravilha
maravilharia durar
aqui neste lugar
onde nada dura
onde nada para
para ser ventura
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não fosse isso e era menos
não fosse tanto e era quase
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apagar-me
diluir-me
desmanchar-me
até que depois
de mim
de nós
de tudo
não reste mais
que o charme
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que tudo passe
passe a noite
passe a peste
passe o verão
passe o inverno
passe a guerra
e passe a paz
passe o que nasce
passe o que nem
passe o que faz
passe o que faz-se
que tudo passe
e passe muito bem
= = = = = = = = = = =
via sem saída
via bem
via aqui
via além
não via o trem
via sem saída
via tudo
não via a vida
via tudo que havia
não via a vida
a vida havia
= = = = = = = = = = =
eu queria tanto
ser um poeta maldito
a massa sofrendo
enquanto eu profundo medito
eu queria tanto
ser um poeta social
rosto queimado
pelo hálito das multidões
em vez
olha eu aqui
pondo sal
nesta sopa rala
que mal vai dar para dois
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a noite
me pinga uma estrela no olho
e passa
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cansei da frase polida
por anjos da cara pálida
palmeiras batendo palmas
ao passarem paradas
agora eu quero a pedrada
chuva de pedras palavras
distribuindo pauladas
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já fui coisa
escrita na lousa
hoje sem musa
apenas meu nome
escrito na blusa
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o mestre gira o globo
balança a cabeça e diz
o mundo é isso e assim
livros alunos aparelhos
somem pelas janelas
nuvem de pó de giz
Fonte:
Paulo Leminski. Distraídos venceremos. Publicado em 1987.
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