“Homo sum, humani nihil a me alienum puto” (Sou homem, nada do que é humano eu considero estranho a mim). A sentença é de Terêncio (185-159 a. C.), poeta e dramaturgo romano. Posto no fim da oração, como é praxe em latim, um curioso verbete nada tem a ver com o que algum apressadinho imaginou. É só a primeira pessoa singular do modo indicativo do verbo “putare”, sinônimo de pensar, achar, considerar. Terêncio afirmava que, sendo humano, ele não se via como melhor do que ninguém. Qualquer falta cometida por alguém ele também poderia cometer.
Aprendi essa verdade na infância. Estou convencido que não existe barbaridade praticada por outrem que eu não possa repetir. Não sou melhor que os outros. Nem tinha por quê. Estou sujeito ao erro como qualquer mortal.
Alguém modificou um pouco o dito de Terêncio. É comum ouvirmos: “Sou humano; tenho o direito de errar”. Nada disso. Ninguém tem direito de errar. O erro não é um direito, mas uma trágica possibilidade da condição humana. Bom seria que nunca fizéssemos maldade nenhuma. Infelizmente, não é assim. Porque nossa natureza foi ferida pelo pecado, praticamos mais facilmente o mal do que o bem. Não corrija uma criança; deixe-a crescer sem limites para ver o que acontece.
Desde cedo temos que combater o mal que nos alicia. Se não for combatido, ele cresce e se refina. Se não fazemos esforço para vencê-lo, ele vai grudando-se em nós até se tornar conatural. Como arbusto que cresce sem escora nem poda, torna-se árvore adulta, sim, mas torta. Aí, meu amigo, pode esquecer. O tempo solidifica os vícios. Não à toa nosso povo inventou um provérbio engraçado: “O diabo é sábio não por ser diabo, mas por ser velho”.
A sabedoria cristã recomenda pelejar sem trégua contra nossa tendência ao pecado. Falar de pecado hoje é politicamente incorreto. Parece coisa de gente atrasada. Só que não adianta, nossa natureza está sempre sujeita à possibilidade de pecar. No início desta semana, o papa Francisco pregou: “Nós somos homens em tensão. Somos também homens contraditórios e incoerentes, pecadores, todos. Mas homens que querem caminhar sob o olhar de Jesus. Nós somos pequenos, somos pecadores, mas queremos militar sob a bandeira da cruz […]. Nós somos egoístas. Queremos, no entanto, viver uma vida agitada por grandes aspirações. Renovemos a nossa oblação ao eterno Senhor do universo para que, com a ajuda da sua Mãe gloriosa, possamos desejar e viver os sentimentos de Cristo, que se esvaziou a si mesmo”.
Sei bem do que Francisco está falando. Há décadas venho lutando contra o velho homem que, segundo o apóstolo Paulo (Ef 4,22), carregamos dentro de nós. E como ele resiste! Há anos eu devia tê-lo vencido. De muitos pecados o Senhor me livrou por pura bondade. Mas meu estopim curto – o sangue espanhol dos antepassados – esse continua a me pregar peças. Até nesta altura da vida.
Não tenho problema em reconhecer meus erros. Nem me constrange pedir desculpas. Porém é enfadonho repetir aquilo que, há muito, eu já devia ter superado. Ainda bem que Deus me cercou de pessoas compreensivas. Tantas vezes pedi desculpas (até perdão, e em público, como podem testemunhar os que me conhecem), que já podiam ter-se cansado.
Meus pedidos sempre foram sinceros e doloridos. Só quem o carrega é que sabe quanto dói este pobre barro de que somos feitos.
Fonte: Portal do Rigon
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