domingo, 23 de junho de 2024

Vereda da Poesia = 42 =


Trova Humorística de Sete Lagoas/MG

WANDERLEY GUEDES DA SILVA

Um fantasma estarreceu,
espantou, gelou o sol.
Minha sogra apareceu
enrolada num lençol.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Poema de Paranavaí/PR

DINAIR LEITE

Acordei

Hoje acordei...
Então vi há quanto tempo dormia
e não via a vida fluir...

Os momentos perdidos de viver
outro amor, outra vida, amores...

Eu me achava condensada
em paixão. Respirando você
que não olha e não vê esse amor
que envolve meu ser
me fazendo sofrer em anseios
de ter o meu corpo em seus braços
e sua boca, a minha, a beijar.

Acordei e deixei você ir.
Esvaziei o meu ser de você.
O meu ventre e o meu coração
nunca mais sofreram a carência
ilusão do sonhar...preencher
um vazio com ar.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Aldravia do Rio de Janeiro/RJ

MARILZA DE CASTRO

Pierrô
arlequim
colombina
amor
em
trilogia
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Soneto do Rio Grande do Sul

ALMA WELT
Novo Hamburgo/RS, 1972 – 2007, Rosário do Sul/RS

A Travessia

 "O mundo é um moinho... " (Cartola) 

Todos nós temos corda onde agarrar,
A vida nos dá sempre uma saída
Que nos evite o risco de abismar
No medo natural da própria vida.

Por certo cada um pega o que pode:
Um amor, uma paixão ou mesmo um vício;
Um poema, um soneto ou uma ode,
Um portal com a cruz no frontispício,

Ou então, o que é pior, com um convite
Para entrar mas deixando a Esperança, 
Última paz que o mundo nos permite... 

Mas pra saíres vivo do moinho,
Não como Don Quixote e Sancho Pança,
Terás que atravessar a ti sozinho...
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova Premiada em Nova Friburgo/RJ, 1998

SELMA PATTI SPINELLI 
(São Paulo/SP)

Até no “terreiro” em prece,
é preguiçoso, o farsante: 
quando o “santo” dele desce,
só vem… de escada rolante!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Poema de Lisboa/Portugal 

ARY DOS SANTOS
 1937 – 1984

Estigma 

Filhos dum deus selvagem e secreto
E cobertos de lama, caminhamos
Por cidades,
Por nuvens
E desertos.
Ao vento semeamos o que os homens não querem.
Ao vento arremessamos as verdades que doem
E as palavras que ferem.
Da noite que nos gera, e nós amamos,
Só os astros trazemos.
A treva ficou onde
Todos guardamos a certeza oculta
Do que nós não dizemos,
Mas que somos.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Quadra Popular

Esta noite dormi fora, 
na porta do meu amor;
deu vento na roseira
me cobriu todo de flor.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Soneto de Portugal

MANUEL DE ARRIAGA
(Manuel José de Arriaga Brum da Silveira e Peyrelongue)
Horta/Açores/Portugal, 1840 – 1917, Lisboa

Alvorada

      Algures brilha o sol no azul do firmamento,
      E expõe com resplendor das coisas o espetáculo!
      Aqui, na escuridão, o mundo é tabernáculo
      Onde os frágeis mortais descansam um momento!...

      Além, o Sol incita o mundo ao movimento,
      Á luta pela Vida, o esteio e o sustentáculo
      Desde o ser da Razão ao mínimo animáculo,
      Aqui, o sono esparsa em todos novo alento!

      Ó Luz! tu és do mundo a Força, a Alma, a Vida,
      A essência do meu Ser, a minha própria Ideia,
      O próprio Deus, talvez!... Beleza, Amor, Verdade!

      Atrás de Ti caminha a Terra, mãe querida!
      Bendito caminhar! Por Ti minha alma anseia!...
      Bem vinda sejas, pois, oh doce claridade!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova Humorística de São Paulo/SP

THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA

O trovador tá empolgado
e até troféu quer ganhar!...
O tema é “Mar” e eis o “achado”:
- És meu mar... mas não faz mar!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Poema de Lisboa/Portugal

FERNANDO PESSOA
(Fernando António Nogueira Pessoa)
1888 – 1935

Poema de amor

O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar pra ela,
Mas não lhe sabe falar.

Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há de dizer.
Fala; parece que mente...
Cala: parece esquecer...

Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
Pra saber que a estão a amar!

Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!

Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar...
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Haicai de Pedro Leopoldo/MG

WAGNER MARQUES LOPES

Vão crescendo as plantas: 
amor de um agricultor 
a doar mãos santas. 
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Sextilha do Rio Grande do Sul

MILTON SEBASTIÃO SOUZA
Porto Alegre/RS, 1945 – 2018, Cachoeirinha/RS

O sextilheiro padece
para se manter na trilha,
ou a internet demora
para trazer a sextilha,
ou, quando menos espera,
traz duas, três, uma pilha…
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova de Saquarema/RJ

JOÃO COSTA

 Lá vou eu, de verso em verso
- seja suave ou dura a lida -,
compondo pelo Universo
o poema da minha vida!…
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Glosa de Porto Alegre/RS

GISLAINE CANALES
Herval/RS, 1938 – 2018, Porto Alegre/RS

MOTE:
Se essa aventura sonhada
se tornasse realidade,
com a carícia esperada
viria a felicidade!
Carmen Patiño Fernandes 
Coruña/Espanha

GLOSA:
Se essa aventura sonhada
um dia chegasse ao fim,
a minha alma, apaixonada,
sinto, explodiria em mim!

Se esse sonho que sonhei
se tornasse realidade,
tu serias o meu rei
e eu a tua deidade!

Fico até emocionada,
ardendo no meu desejo,
com a carícia esperada
com o calor do teu beijo!

Quero te amar com paixão
pois o amor não tem idade,
com ele, ao meu coração
viria a felicidade!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Aldravia de Juiz de Fora/MG

CECY BARBOSA CAMPOS

chuva
chorando
tristeza
invade
minha 
alma 
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Soneto de Ilhavo/Portugal

DOMINGOS FREIRE CARDOSO

“As palavras perfumadas da confidência”
(Verso de Maria Goreti Andrade Carneiro Dias in “Textos de Amor", p. 40)

Palavras perfumadas de confidência
Dizias tu baixinho ao meu ouvido
E eu, delas tão sedento e atrevido
Ia perdendo, aos poucos, a inocência.

O amor ardia em nós com tal urgência
E como quase nada era proibido
Sem saber o caminho percorrido
Quase demos às portas da demência.

Dormem os nossos corpos saciados
Perdidos nos lençóis amarrotados
Envoltos numa paz que nos aquece.

Em redor tudo é calmo e é perfeito.
E eu sinto em mim que o mundo é o nosso leito
Como se nele nada mais houvesse.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova Premiada em Bandeirantes/PR, 2020

ALBANO BRACHT 
Toledo/ PR

Decisão é coisa séria.
Convencido agora estou.
Quem concorda com miséria,
decidiu, mas não pensou.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Poema de São Paulo/SP

RENATA PACCOLA

A espera angustia

A espera angustia.
Você para,
a mente se esvazia.
Aí você acende um cigarro,
começa uma poesia,
e alguém,
que você nunca viu,
começa a encará-lo.
Aí você perde o embalo,
fica sem graça,
coça o braço,
e olha para o outro lado.

A saudade angustia.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Triverso de Curitiba/PR

ÁLVARO POSSELT

Esta vida é um mistério.
Perto da maternidade
também tem um cemitério.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Setilhas para o Médico, de Fortaleza/CE

NEMÉSIO PRATA

Todo Médico ao se formar 
jura "Hipocraticamente" 
de todo mundo tratar 
com cuidado, infelizmente 
médico também se esquece, 
e quando isto lhe acontece, 
quem paga o pato é o indigente! 

Tirante a graça dos versos, 
sou mui grato ao "Doutor", 
que luta em campos diversos 
para amenizar a dor, 
seja do rico ou do pobre, 
um gesto deveras nobre, 
que o faz ser nosso credor!
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova de Curitiba/PR

JANSKE NIEMANN SCHLENKER

Acordei (tinhas partido)
e me deixaste na estrada:
um pobre arbusto perdido
sem luz, sem pranto, sem nada…
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Ramalhete de Trovas sobre Palhaço, de Mogi-Guaçu/SP

OLIVALDO JÚNIOR

Quando o circo baixa a lona,
todo artista é feito o "clown":
cara em branco, bem pidona,
com tendência a ficar "down".
 
De carona num fusquinha,
com a mala colorida,
o palhaço é o "flanelinha"
no semáforo da vida.
 
Ao pintar o rosto pálido,
um Quixote em sofrimento
- o palhaço - torna válido
todo esforço contra o vento. 
 
O palhaço sempre insiste
numa alegre melodia,
sem saber que só existe
sua triste alegoria.
 
Palhacinho de mentira,
fui poeta de verdade,
que, no meio dessa lira,
foi embora da cidade.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Poetrix de Belo Horizonte/MG

JUCINEIA GONÇALVES

esperança

Arranco pétala,
por pétala,
os mal-me-queres dessa vida
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Soneto de Portugal

DIOGO BERNARDES
Ponte da Barca, 1530 – 1594, ??

Da branca neve, e da vermelha rosa
O Céu de tal maneira derramou
No vosso rosto as cores, que deixou
A rosa da manhã mais vergonhosa.

Os cabelos (d’amor prisão formosa)
Não d’ouro, que ouro fino desprezou,
Mas dos raios do Sol vos os dourou,
Do que Cíntia também anda invejosa.

Um resplendor ardente, mas suave,
Está nos vossos olhos derramando
Que o claro deixa escuro, o escuro aclara;

A doce fala, o riso doce, e grave
Entre rubis, e perlas lampejando
Não tem comparação por coisa rara.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Trova de Maringá/PR

A. A. DE ASSIS

Ouça os sons da natureza:
as águas, pássaros, ventos...
- Que orquestra produz beleza
maior que esses instrumentos?
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = 

Poema de Belém/PA

EDVANDRO PESSOATO

Tiro direto

Somos da mesma espécie: manos
Por isso não me ameace: me abrace
Por isso não me confunda: me comova
Por isso não me apague: me navegue
Por isso jamais me ate: desate-me
Por isso não me torture: me ame
Por isso não me desacate: me acate

Somos da mesma árvore: mãe
Por isso não me entristeça: cresça
Por isso não me arranque: me plante
Por isso não me exploda: nem me explore
Por isso jamais me negue: se entregue
Por isso não me recolha: escolha
Por isso não me acabe: me encante
Por isso não fure os olhos: abra-os
Por isso não me afogue: me acenda
Por isso e por tudo mais
Sejamos da mesma espécie: manos

Nenhum comentário: