Abracadabra! As palavras têm poderes, sim senhora. A escrita egípcia hieroglífica é um notável exemplo etimológico. Hieróglifo é um nome composto por hieros, a escrita, e gluphein, ou seja, gravar. Logo, a arte sagrada de gravar (na pedra). Escrita dos deuses. Os egípcios tinham até um deus da escrita, Thot.
Abre-te, Sésamo! A expressão mágica faz parte das Mil e Uma Noites, proferida por Ali Babá para abrir a porta da caverna e encontrar um tesouro. Quantas palavras já foram usadas com poderes sobrenaturais por toda a história? Fiat Lux! Deus disse, e a luz apareceu. No livro de Hebreus, 4:12, diz assim: Porque a palavra de Deus é viva e eficaz, e mais penetrante do que espada alguma de dois gumes, e penetra até à divisão da alma e do espírito, e das juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e intenções do coração.
Na literatura há inúmeros exemplos em que a palavra é um instrumento poderoso, podendo ser usada para o bem e para o mal. Clarice Lispector escrevia inebriada pela ação da palavra: Nunca esquecer que a palavra é fruto da palavra. A palavra tem que se parecer com a palavra. Atingi-la é o meu primeiro dever para comigo. E a palavra não pode ser enfeitada e artisticamente vã, tem que ser apenas ela.
No livro Primeiras Estórias, de Guimarães Rosa, há um conto chamado Famigerado. É uma aula do Mestre Rosa para quem quiser se deleitar com os efeitos, tramas, suspenses, humores e desenlaces a partir de uma palavra não assimilada, não compreendida, não captada. A dedução, muito comum em leituras de todo naipe, é astuta e oscilante. Acatafásica pode ser um elogio ou uma ofensa à leitora. Que fazer? Apelar para um sétimo sentido feminino dedutível? Convém ir ao dicionário, pois do contrário... Bem, do contrário, você terá que se contentar com sua imaginação. Ou morrer com a dúvida. As palavras também são traiçoeiras. Será?
Valdevinos? Só pode ser nome de gente, desde que tirando o s. Vovô Valdevino! Nada mal. Ou quem sabe será o nome de uma tribo indígena nalgum canto remoto do Brasil? Ou uma grife italiana. Ou uma porção de alguma espécie de molusco. Balabrega? Essa é fácil: uma bala que é vendida na Feira da Barganha, vinda do Paraguay, bem ruizinha de chupar. Ou uma corruptela para Uma Balada Brega, como me disse uma aluna.
Mirmecófago é um túmulo moderno. Antigamente chamava-se sarcófago. Ou será um instrumento cirúrgico usado em clínicas de alto padrão? Quiasma? Trata-se de uma interjeição vinda do português de Portugal. Quicuio? Claro que também é uma interjeição, mas de baixo calão. Mixteque? Mix quer dizer mistura. O teque deve ser uma bebida exótica. Mistura de Bebida Exótica! Renrém é o barulho que as ocas fazem quando o índio e a indiazinha conversam à noite. Weltanschauung é espirro, em alemão. O nosso Atchim!
Choutear era o verbo para chutar, usado no futebol do século 19. Aí o técnico gritava para o artilheiro fominha: Chouteia logo essa pelota pro gol! Xantorréia? Essa não é fácil... Ah, sim, é um tratamento contra a seborréia (ou a diarréia) a partir de Xampus. Zeribando é o sujeito que está no vermelho, sem vintém. Ou uma expressão para um bando que acabou. Alopatia? A mais fácil de todas! O mesmo que Alopamãe, Alopopai, Alopavó, Alopoamor... Essa até a Balzaquiana saberia responder...
Utopia é o nome para um exame médico complexo, segundo um aluno meu. Leréia é o nome de uma prima do interior com quem a gente brincava de oftalmologista. Borrasca é a pronúncia para borracha, só que em russo. Despostigar é um verbo da primeira conjugação usado em cerimônias militares para descansar a tropa perante o general. Ferrabrás é o nome da primeira empresa de trem de Sorocaba. Exornado é o sujeito que foi expulso de algum lugar. Atávico é quem sofre do Mal de Atávia, doença degenerativa que impede a pessoa de pronunciar as vogais. Haliêutica e Ludopédio são palavras que Sir Ricardón adora ouvir.
Então, minha pacóvia leitora, você vai ou não dormir com o dicionário a partir de agora? Cuidado com as pseudo-induções. Ao menos você sabe quem foram Viterbo, Morais, Aurélio e Hoauiss, yes?
Fonte:
Grupo Sorocult (Sorocaba/SP). http://www.sorocult.com
Abre-te, Sésamo! A expressão mágica faz parte das Mil e Uma Noites, proferida por Ali Babá para abrir a porta da caverna e encontrar um tesouro. Quantas palavras já foram usadas com poderes sobrenaturais por toda a história? Fiat Lux! Deus disse, e a luz apareceu. No livro de Hebreus, 4:12, diz assim: Porque a palavra de Deus é viva e eficaz, e mais penetrante do que espada alguma de dois gumes, e penetra até à divisão da alma e do espírito, e das juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e intenções do coração.
Na literatura há inúmeros exemplos em que a palavra é um instrumento poderoso, podendo ser usada para o bem e para o mal. Clarice Lispector escrevia inebriada pela ação da palavra: Nunca esquecer que a palavra é fruto da palavra. A palavra tem que se parecer com a palavra. Atingi-la é o meu primeiro dever para comigo. E a palavra não pode ser enfeitada e artisticamente vã, tem que ser apenas ela.
No livro Primeiras Estórias, de Guimarães Rosa, há um conto chamado Famigerado. É uma aula do Mestre Rosa para quem quiser se deleitar com os efeitos, tramas, suspenses, humores e desenlaces a partir de uma palavra não assimilada, não compreendida, não captada. A dedução, muito comum em leituras de todo naipe, é astuta e oscilante. Acatafásica pode ser um elogio ou uma ofensa à leitora. Que fazer? Apelar para um sétimo sentido feminino dedutível? Convém ir ao dicionário, pois do contrário... Bem, do contrário, você terá que se contentar com sua imaginação. Ou morrer com a dúvida. As palavras também são traiçoeiras. Será?
Valdevinos? Só pode ser nome de gente, desde que tirando o s. Vovô Valdevino! Nada mal. Ou quem sabe será o nome de uma tribo indígena nalgum canto remoto do Brasil? Ou uma grife italiana. Ou uma porção de alguma espécie de molusco. Balabrega? Essa é fácil: uma bala que é vendida na Feira da Barganha, vinda do Paraguay, bem ruizinha de chupar. Ou uma corruptela para Uma Balada Brega, como me disse uma aluna.
Mirmecófago é um túmulo moderno. Antigamente chamava-se sarcófago. Ou será um instrumento cirúrgico usado em clínicas de alto padrão? Quiasma? Trata-se de uma interjeição vinda do português de Portugal. Quicuio? Claro que também é uma interjeição, mas de baixo calão. Mixteque? Mix quer dizer mistura. O teque deve ser uma bebida exótica. Mistura de Bebida Exótica! Renrém é o barulho que as ocas fazem quando o índio e a indiazinha conversam à noite. Weltanschauung é espirro, em alemão. O nosso Atchim!
Choutear era o verbo para chutar, usado no futebol do século 19. Aí o técnico gritava para o artilheiro fominha: Chouteia logo essa pelota pro gol! Xantorréia? Essa não é fácil... Ah, sim, é um tratamento contra a seborréia (ou a diarréia) a partir de Xampus. Zeribando é o sujeito que está no vermelho, sem vintém. Ou uma expressão para um bando que acabou. Alopatia? A mais fácil de todas! O mesmo que Alopamãe, Alopopai, Alopavó, Alopoamor... Essa até a Balzaquiana saberia responder...
Utopia é o nome para um exame médico complexo, segundo um aluno meu. Leréia é o nome de uma prima do interior com quem a gente brincava de oftalmologista. Borrasca é a pronúncia para borracha, só que em russo. Despostigar é um verbo da primeira conjugação usado em cerimônias militares para descansar a tropa perante o general. Ferrabrás é o nome da primeira empresa de trem de Sorocaba. Exornado é o sujeito que foi expulso de algum lugar. Atávico é quem sofre do Mal de Atávia, doença degenerativa que impede a pessoa de pronunciar as vogais. Haliêutica e Ludopédio são palavras que Sir Ricardón adora ouvir.
Então, minha pacóvia leitora, você vai ou não dormir com o dicionário a partir de agora? Cuidado com as pseudo-induções. Ao menos você sabe quem foram Viterbo, Morais, Aurélio e Hoauiss, yes?
Fonte:
Grupo Sorocult (Sorocaba/SP). http://www.sorocult.com
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