Alex Matthiensen (Num cantinho da Lagoa
Ibirapuera, SC) [2007] aquarela
A PRIMEIRA NOVELA DE ERICO VERISSIMO
Amaro tem um piano.
Faz amor por aluguel.
Na pensão de Tia Zina,
fita a menina Clarissa
com nostálgica saudade
do amor que não viveu.
Um papagaio gasta o nome,
repetindo-o, sempre, sempre.
Clarissa tem um temperamento,
que a adolescência nem disfarça.
É primavera, os residentes
vêm de tantos lugares, são
tão diferentes que Amaro
perde-se em si mesmo, e
busca-se em camas sem
ilusão, em inocências
que só pode fitar,
à espera que o futuro
faça o presente dar frutos.
Amaro tem nome de luto.
Clarissa tem nome de sol.
Duas presenças opostas
que se encontram por acaso
como quem, fora de casa,
abana a um conhecido,
sorri, valeu, e é só isso.
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DESPERTAR
Amaro tem um piano.
Faz amor por aluguel.
Na pensão de Tia Zina,
fita a menina Clarissa
com nostálgica saudade
do amor que não viveu.
Um papagaio gasta o nome,
repetindo-o, sempre, sempre.
Clarissa tem um temperamento,
que a adolescência nem disfarça.
É primavera, os residentes
vêm de tantos lugares, são
tão diferentes que Amaro
perde-se em si mesmo, e
busca-se em camas sem
ilusão, em inocências
que só pode fitar,
à espera que o futuro
faça o presente dar frutos.
Amaro tem nome de luto.
Clarissa tem nome de sol.
Duas presenças opostas
que se encontram por acaso
como quem, fora de casa,
abana a um conhecido,
sorri, valeu, e é só isso.
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DESPERTAR
Acordo sem um acordo com a manhã
que esguicha suas freadas já tão cedo,
e sem ceder a qualquer convite, ergo
o corpo já cansado antes dos medos
comuns a qualquer homem que caminha
entre as ruas ou mesmo entre a família.
A noite passou lenta e não me deu
sonhos, estremeções nem mesmo o peso
de um pesadelo a dar sentido ou temor
para o dia que se pretende poderoso.
Levanto, escovo os dentes, me submeto
à repetitiva água do chuveiro.
Debaixo do aguaceiro, ora quente,
ora frio, me arrepio: dia seguinte.
Ontem houve o que houve e não repete
nada, ainda mesmo que eu me esforce
na reprodução de um cotidiano.
(Arte a fixar para o amanhã.)
Tão cedo e, entre bocejos,
arquejo no esforço de pensar
que hoje é só o começo, sol penteado
no qual ruge a ordem desses tempos
empurrando-me como se tudo afinal
urgisse, por mais que eu tanto faça.
Não saberei quando parar no exato instante
em que parar. Caindo, o sol trará
a noite e, de novo, o inquieto
povoará o vencido lençol até que a luz
sacuda-o, amarfanhado rosto. O espelho
o denuncia sem que o acuda o banho.
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ASCENSÃO E QUEDA DO DIÁLOGO
Um homem liga a tevê, o rádio, escuta o vozerio da rua.
Esse homem veste roupas que não combinam.
Aperta as mãos, sorri, goza o frio enervante da dúvida
em saber qualquer coisa que o conduza para algo
que se possa chamar de um lugar.
Nem precisa ser um destino.
Um homem que não conhecemos e que, cansado de si,
entende e aceita que não o verem não significa o fim
nem o começo de uma história, e portanto ele pode
continuar desse jeito, tevê, rádio e rua gritando
e ele nem aí, falando também, ao mesmo tempo,
sem que os outros escutem, imitando sua surdez.
Um homem que parece tudo, menos mudo – como tudo.
Que engole ávido a mudez a tomar conta do fluxo
de ruídos que explodem para o silêncio faminto.
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CAFÉ
O marrom pleno,
quase negro.
O cheiro se evola,
o ar a bebê-lo,
enquanto olho
a xícara, a mesa
– eis minha missa
e um companheiro.
Sirvo o líquido,
aspiro o aroma,
e o beberico.
Sou homem rico
com tão pouco.
Preparo outro
e o estendo
até o amigo,
e digo: “toma”.
Nem é preciso.
As mãos seguram
a taça plena
que depois pousa
sobre a mesa.
Corpo aquecido
e o paladar
com um sabor
nunca esquecido.
Além da mente
a acordar
para o real
que ainda dorme
tão inocente.
Lá fora o dia
boceja, lento,
com sua fé.
Nada mais tem
até que alguém
beba um café.
Então, num salto,
põe-se em pé.
E é caminhar.
Fontes:
http://www.artistasgauchos.com.br/
Pintura = http://www.flickr.com/photos/alex_matthiensen
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