quinta-feira, 25 de julho de 2019

Francisca Júlia (A Esperança)


A crença mitológica nos conta que os povos antigamente eram felizes, viviam na maior harmonia, sem guerras nem disputas. O mundo era composto de uma só família, onde todos se amavam igualmente e estavam unidos por um afeto fraternal.

Não havia a pobreza, porque a terra, como uma mãe carinhosa, produzia frutos para o aumento de todos. Não se conheciam os ardores do verão, os rigores do inverno, nem a ameaça das tempestades; uma primavera continua refrescava os ares, animava a verdura dos campos e fazia nascer os frutos. Os animais viviam da mesma forma; os pássaros com os répteis, as ovelhas com as feras.

Desta maneira todos se sentiam absolutamente ditosos.

Júpiter, porém, possuía uma caixa, que estava fechada, e que continha todos os males que a humanidade sofre atualmente.

Nela estavam ocultas a amargura, a guerra, a peste, a fome, o assassínio, a ingratidão e todo o gênero de sofrimentos a que o homem está sujeito.

Um dia, Júpiter, tendo de descer do Olimpo com o fim de visitar a terra, como não quisesse abandonar a caixa à curiosidade dos outros deuses, chamou Pandora e falou-lhe assim:

— Toma esta caixa. Ela contém toda a espécie de males criados pelas forças infernais; se a abrires, a humanidade há de sofrer eternamente. É por isso que ta confio, na certeza de que saberás guardai-a com o maior cuidado, não só pelo respeito que deves às minhas ordens, como pela piedade que te inspira a fraqueza humana.

E entregou-a a Pandora.

Esta deusa guardou a caixa durante muito tempo; mas como era excessivamente curiosa, resolveu abri-la.

Abriu-a.

A princípio escapou a guerra: logo os homens começaram a inventar os punhais envenenados, couraças, lanças, setas e toda a variedade de armas de defesa, para, quando fosse ocasião, marchar para o campo da batalha e escravizar os povos vencidos.

A peste abateu os soldados; as lágrimas umedeceram os olhos das mulheres; o falso amigo escondeu no seio o punhal assassino; o filho ridicularizou a velhice dos pais; e assim por diante os males foram saindo da caixa encantada, espalhando-se pelo mundo, acordando sentimentos maus nos corações e derramando por toda a parte a desolação e o luto.

Pandora sentiu remorsos nesse instante e fechou a caixa.

Todos os males, porém, já tinham saído exceto um: a esperança.

A esperança ficou no fundo, escondida, para consolar as mágoas e animar o mundo; de modo que, por mais infelizes que nos julguemos, sempre nos resta a esperança de alcançarmos uma felicidade futura, um suave descanso para as nossas tristezas e um consolo para as nossas aflições.

Fonte:
Francisca Júlia. Livro da Infância. Revisão ortográfica: Iba Mendes.

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