sexta-feira, 20 de setembro de 2019

Poesias Gauchescas


ANTONIO AUGUSTO CORONEL CRUZ
Gauchesca     


Canto agora nestes versos
com meu grito entusiasmado
a lida e o povo gaúcho
neste rincão abençoado

Quero falar do chimarrão
do churrasco e do gaiteiro
da linda prenda cheirosa
e do ginete faceiro

Das tropas cruzando as coxilhas
na toada mansa do tropeiro
nos tombos nas domas renhidas
e do galpão hospitaleiro

Canto o minuano cortante
o poncho amigo e o laço
a disparada da ema
e a boleadeira cortando o espaço

Exalto a história dessa gente
valente, simples e altiva
que tem a liberdade como semente
brotando da terra nativa

Sendo farrapo, chimango, maragato
ou peleador no Paraguai
são os rebentos deste Rio Grande
os filhos honrando o pai

Canto um tempo iluminado
pelas faíscas das adagas
pela prata dos arreios
e pelos olhares das amadas

Um tempo de muitas distâncias
vencidas num lombo tobiano
das frescas sangas de pedras
e das noites no chão pampeano

Vendo a tapera silenciosa
sinto um aperto no peito
lembrando o fio do bigode
e outras tradições de respeito

E me vem uma nostalgia infinita
dessa vida gaudéria e passada
uma amarga solidão sem consolo
como a perda da mulher amada

Mas sigo alimentando o braseiro
e ao patrão do céu peço, sincero,
que proteja este mundo campeiro
e o grito do quero-quero

ANTONIO AUGUSTO FAGUNDES
Lenço Branco


Nascido de alma caudilha
- nem por isso menos franca -
Deus te deu essa cor branca
que até de noite rebrilha.
Lua do herói na coxilha,
por de eu for, onde eu ande
e sem que ninguém me mande
eu te canto, troféu mudo
que é puro neste Rio Grande!

Do pica-pau ao chimango
vai um pedaço de glória
e engarupo na memória
com um guascaço de mango
recuerdos de algum charango
que no passado ficou.
Se eu sou assim como sou,
entonado e orgulhoso,
devo a ti, lenço glorioso,
que eu herdei do meu avô.

Das lágrimas de uma china
quando seu índio partia,
de uma lua que alumia
debruçada na campina,
de uma sanga cristalina
que murmurava merencória,
do clarão de uma vitória
deste povo leal e franco
nasceste, meu lenço branco,
para bandeira de glória!

Teu gosto é andar voejando
entre guerreiros e lanças
e acalentar esperanças
entropilhadas em bando.
O futuro está chamando,
já cumpriste o teu ideal
porque o Rio Grande imortal
fez de ti o seu retrato:
oposto do maragato,
puro, atrevido e bagual!

APPARICIO SILVA RILLO
Pago Vago


Vago é meu pago.
Este que trago,
cicatriz em mim,
Raiz de minhas íntimas origens,
veio subterrâneo de onde vim.

Vago é meu pago.
Este que trago,
em músculos e ossos.
Inteiro como foi porque é memória,
flor de perenidade entre destroços.

Vago é meu pago.
Este que trago,
como sombra e manto.
É meu destino a cruz de sustentá-lo
nos alicerces de vento de meu canto.

AURELIANO DE FIGUEIREDO PINTO
Romance do Gaúcho Velho Solito

 
dedicado a Eurípedes Jobim de Oliveira

Quando arranchei neste chão
empecei pelas mangueiras
com essas tronqueras que aí 'stão.
- Já mudei muitas madeiras
mas são as mesm'as tronqueras
que do tempo aguentando vão.

Quando a maior ficou pronta
veio um barrero mui ancho,
e empeçou a erguer seu rancho
de uma tronquera na ponta.

Chegou ... Gostou do lugar.
Deixou de ser cruzador.
E, como eu, pegou na lida,
cada um cuidando sua vida
nenhum pedindo favor.
Porque este rincão convida
para ficar morador.

Eu e ele, dois viventes,
dois tentos da mesma trama.
Eu com os braços, êle com as asas,
cada um barreando a sua casa
tudo a capricho e de fama
nesta chapada campera.
A dele - lá na tronquera !
A minha - em riba da grama.

Ele cantava em sobrado,
fachudo moço bonito
mudando pena em agosto.
Eu ... chimarreava com gosto
meu mate de índio solito.

Outubro chegou, trazendo
promessas de nova era.
Ele avoou longe ... E, na vinda,
trouxe uma amiga tão linda
dourada de primavera.

É bicho invejoso o homem!
No redomão Polvadera
me fui ... ! galope ... teatino ...
aventurando o destino
para campear companhera.

Achei... Trouxe ela ... E empecei
a aquerenciar minha flor,
linda triguera paisana.
Mas no olhar de ressolana
tinha algo que não engana
o tino de um domador ...

O barrerito amoroso,
clareando o dia em verão
abria o bico e cantava.
Eu com a prenda chimarreava
sobre o recosto do oitão.

Domei ... Tropiei ... Plantei muito...
Juntei plata, ... Mas despois ...
Cheguei de viage ... Era um frio !
E achei o rancho vazio!
O rancho que eu fiz pra dois ...

E o que eu passei... Ninguém viu!
No pobre rancho vazio!
No rancho que eu fiz pra dois ...

E o par de barreros?... Lindo!
Quanto mais o tempo andava
mais amizade sem fim!
Um do outro não se esquecia.
Se não cantavam, se via
que era por pena de mim!

Segui mateando solito!
Quis tanto bem ... mal me quis !

E irei pensando até à morte:
- Por que é que eu não tive a sorte
do barrerito feliz?! ...

CACO COELHO
Sonhada Querência
 
Queria que, de repente, tudo fosse diferente,
da vida que tenho aqui, da cidade ir me embora,
Viver a vida de outrora, dos meus tempos de guri..

Queria que a minha casa fosse um ranchito campeiro,
Amigos, gente chegando,
E no fogão , um braseiro,
A carne gorda pingando, na festança do assado,
E a gaita velha tocando um chote bem compassado..

Que os espigões que nos cercam,
Fossem Umbus pro aconchego
Dos gaudérios assoleados, descansando nos pelegos,

Que buzinas, telefones, ruídos que nos consomem,
Martirizando a existência,
Fossem pássaros cantores, nativos,
anunciadores de uma sonhada querencia,

Queria que, de repente, tudo fosse diferente,
da vida que tenho aqui,
Da cidade ir-me embora, viver a vida de outrora,
dos meus tempos de guri.

A cambona no costado, do forte calor do fogo,
no terreiro o eterno jogo do sol nascendo e se pondo...
De mão em mão o porongo, no apojo do mate amargo..
Um cusco junto comigo,
Olfateando por churrasco...
Ouvindo o bater dos cascos, de alguém que ao longe se vai ...
Pisando o treval maduro, das barrancas do Uruguai ..

Queria que, de repente, tudo fosse diferente,
Da vida que tenho aqui, da cidade ir-me embora,
Viver a vida de outrora, dos meus tempos de guri ...

INOEMA NUNES JAHNKE
Orgulho gaúcho


No sul quando nasce o dia
Nasce também à magia,
Esta estranha alegria,
Que se tem ao respirar.

Cevo um mate amargo
Do lado do meu amado,
Em silêncio uma oração
Agradece meu coração.

Agradeço minha terra
Meu pampa sul-rio-grandense,
O Patrão velho lá no céu
Por certo está contente.

Por ver tanto orgulho
Pela sua criação,
Que traz cada gaúcho
Dentro do seu coração.

Sou gaúcha, e isso é certo!
Trago a chama da emoção,
O amor por esta terra
Honrando sua tradição.

Reconheço a beleza
Da nossa amada querência,
Ressaltando  na consciência
A minha essência gaúcha.

Fiel as suas tradições
E disso, não abro mão!
Churrasco campeiro...
Fogo de chão...

E um gostoso chimarrão
Nos braços do meu peão.

INOEMA NUNES JAHNKE
Aventuras no Travesseiro

Tive um sonho meio guapo
Sonhei que era maragato,
De lança e espada na mão,
Lenço amarrado ao pescoço
Pelejando que dava gosto.

Meu cavalo ventania
Pingo malhado
Bem postado
Era minha companhia.

Zumbia lanças ao vento,
Retinia o aço da espada,
Daqueles bravos gaúchos
Que lutavam a meu lado,

Anita de Garibaldi
Passou por mim galopando,
Lado a lado com Garibaldi
Pelejando, pelejando.

Lanceiros negros
Lanças na mão
Com o bravo Teixeira Nunes
Lutando por este chão.

Índios guaranis
E seus cavalos
Tinham pra todo o lado,
Flechas cortando o minuano gelado.

Chimangos e maragatos
Escravos e guaranis,
Sepé Tiaraju herói missioneiro,
Todos os bravos guerreiros.

Juntos lado a lado
Lutando por este pago,
Defendendo nosso estado
Este rincão amado.

A história passou por mim
Como um livro desfolhado,
Cruzando época, tempo, espaço...
Fazendo um estardalhaço.

Dormi lado a lado com o passado
Lutando, pelejando,
Neste mundo encantado
Que trago em mim guardado,
Onde todos os nobres guerreiros
Encontrarão-me no entrevero
Em novas aventuraras no meu travesseiro.

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