DOCE INSTANTE...
Quantas vezes se busca pela vida
uma alegria, um bem, uma ventura,
sem nada achar-se, em luta estremecida,
vendo aumentar-se, sempre, a nossa agrura.
E, às vezes, num instante, sem corrida,
sem luta, sem espera e sem loucura,
ditosa e risonha, alma embevecida,
a gente tudo encontra, sem procura.
Que alegria de nós, então, se expande,
com doçura, através de um longo beijo,
num doce instante, que se faz bem grande!
E assim, a gente, em tão feliz ensejo,
recebe, palpitante, alma fagueira,
um Bem, que durar pode a vida inteira!...
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ENQUANTO ALGUNS...
Enquanto alguns batalham, sem temor,
com alma, com fervor e com respeito,
buscando um mundo bom e mais perfeito,
um mundo cheio de pureza e amor...
Enquanto alguns, com valentia e ardor,
se esforçam, procurando dar um jeito
de eliminar do mundo o desrespeito,
de eliminar do mundo a guerra e a dor...
Enquanto alguns, com seu amor profundo,
fraternidade buscam, neste mundo,
sofrendo, embora, todo escárnio e apodo:
– São muitos os que, em gesto furibundo,
buscam, com negro afinco e vil denodo,
fazer do mundo um mar de lama e lodo!
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FRUSTRAÇÃO
Pela vida alongando, um dia, os passos,
parti, confiante, austero e com ardor,
buscando, à minha frente, os róseos laços,
os róseos laços de um sublime amor...
E, em meus caminhos, só tive embaraços,
espinhos encontrando, em vez de flor...
— Fui enfrentando, assim, negros espaços,
negros espaços de tristeza e dor!...
E hoje, cansado, em minha mente, à toa,
eu sinto a imensa angústia, que povoa
toda a distância dos meus tempos idos,..
E a ferir-me a lembrança ainda vive
um punhado de sonhos vãos, perdidos,
do que eu quis ter na vida, mas não tive!
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NEM EM SONHO...
Eu sonhava contigo... Estavas linda!
Eras a santa imagem do pecado,
com atração tão doce, tão infinda,
que até fiquei pateta e deslumbrado.
E assim, eu disse a ti: — Sejas bem-vinda
a mim, que por ti vivo apaixonado!
E, como alguém que sai de uma berlinda,
sorridente, avancei para o teu lado...
E quando, todo amor, todo desejo,
quando faminto e louco por teu beijo,
quando, enfim, eu de ti me aproximei,
no instante do teu beijo então gozar,
não sei por que, meu Deus, eu acordei...
— Nem em sonho eu consigo te beijar!...
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O ZÉ TORRESMO
Era um pobre coitado o Zé Torresmo,
tão caolho, tão magro, tão sem trato,
que acreditava até, vivendo a esmo,
estar sobrando neste mundo ingrato.
Sem ter da vida um gesto bom e grato,
por todos desprezado, o Zé Torresmo,
esboçando na mente o seu retrato,
como que perguntava: — "Existo mesmo?..
Será que a minha vida ao mundo importa?…”
E assim, o Zé Torresmo, alma inocente,
fitava o céu, com sua vista torta,
como a dizer a Deus, humildemente,
num gesto triste, pela dor ferido:
"Perdão, Senhor, por eu haver nascido".
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SONETO SEM FIM...
Um soneto eu tentava, então, fazer,
todo inspirado num sublime rosto,
num lindo rosto, lindo de morrer,
— legítima expressão de encanto e gosto...
E esse rosto, que dava gosto ver,
queria ver num meu soneto posto,
quando acontece, então, me aparecer
o anjo divino — a dona desse rosto...
E eis que esse ente querido, um riso aberto,
de mim se aproximou, olhar esperto,
quando eu já tentava o último terceto...
Trêfega, esbelta, alegre e com meiguice,
"abraça-me, vovô!" — ela me disse,
interrompendo, assim, o meu soneto...
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SUBLIME PERFEIÇÃO...
Dos céus merece, como prêmio, a Palma
do Amor, quem nesta vida enfrenta escolhos,
de alegria vestindo, à beira da alma,
toda angústia que vem de seus refolhos.
E assim agindo, com bondade e calma,
sorrir procura para os seus abrolhos.
E os infernos de dor, que esconde na alma,
vai transformando em céu de amor, nos olhos.
É perfeito e se torna quase um santo,
pois sabe disfarçar seu desencanto,
quem tem gestos assim puros e sábios
de afogar sua angústia, seu desgosto,
dentro do amor a lhe florir no rosto,
com um sorriso a lhe bailar nos lábios!
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VIBRAÇÃO...
E deixa que minha alma, então contente,
sorrindo vibre, no êxtase do beijo
que, para festa desse meu desejo,
teus lábios hão de dar-me, ardentemente!
Todo o meu ser há de tremer, fremente,
ante o prazer infindo, que antevejo,
e em cujo doce e tão sublime ensejo,
hei de sorrir feliz, gostosamente!
De Cupido no Altar, então faremos
as núpcias desse amor sensacional…
e o grito do prazer, juntos, daremos,
como se fora a prece conjugal...
Enfim, nós ambos, eu e tu, seremos
do mundo inteiro o mais feliz casal!
Fonte:
Aparício Fernandes (org.). Anuário de Poetas do Brasil – Volume 4. Rio de Janeiro: Folha Carioca, 1979.
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