Aguinaldo que vinha se preparando para correr na São Silvestre, por Coxia, sofria o dissabor de com a perna quebrada, ter que desistir. De emergência, providenciou-se uma corrida eliminatória, chegando em primeiro lugar o Perneta. Após os prêmios, reuniram-se para discutir sobre a sua participação na São Silvestre. O secretário de esportes votou contra a saída da verba de sua secretaria para ajudar, pois via pouca chance de vitória, visto que numa corrida de tal envergadura, dificilmente um aleijado iria ganhar. Referia-se a uma leve torção que o corredor sofrera quando criança e que o levara até hoje a puxar da perna esquerda, o que lhe valera o apelido. Sabia também que o Sr. Avariando (nome do Perneta), era dado a tomar umas pingas, o que não condizia com o comportamento de um esportista. Perneta que tinha ficado calado até aquele momento, enfureceu-se; "Pera aí meu caro. O Ronaldo, lá de Descoberto, Minas Gerais, já teve anemia e nem por isso deixou de ganhar no ano retrasado. O baixinho não vai ganhar este ano, pois agora sou eu quem vai apresentar Coxia para o mundo. E de beber, é o seguinte: Sou igual a muitos motoristas, quanto mais bebo, mais corro." E foi saindo, sem querer saber de mais conversa. A oposição segurou o homem prometendo verba para as despesas.
Representante oficial de Coxia na corrida. Perneta era saudado por todos e fazia seus treinamentos diários com torcida. O patrão dispensou-o do trabalho, com direito a remuneração, pelo que prometeu nas entrevistas da vitória, elogiá-lo. Está certo que, normalmente, mais faltava do que trabalhava, mas valia a colaboração. Ermenegildo, pretendente a candidato a prefeito, mandou que o Perneta arrumasse empréstimo, que assim que recebesse um dinheiro que estava a juros, lhe daria para pagar. Mas tinha que prometer subir com ele nos palanques em sua campanha. Daria o dinheiro em janeiro. Quando perguntado pelo Perneta se daria o dinheiro, ganhasse ou perdesse a corrida, Ermenegildo, desconversava com um: "Você vai ganhar, você vai ganhar." Seu Quindim, que agora já não cobrava as pingas que o Perneta tomava em sua quitanda, dizia que a cachaça pela vitória, seria por sua conta. Fartos convites para churrascos, dificilmente recusados,
Chegara o grande dia. Reservaram hotel em São Paulo. O Perneta exigiu que pelo menos fosse quatro estrelas. Levou uma bandeira de Coxia, uma do Brasil e tinha pinta de atleta vencedor. Fretaram um ônibus para a torcida, que ficaria em um hotel mais barato. Na noite do dia 31, para festejar, reuniu-se com Pé Grande, Trator e o Chiquinho num bar do Bexiga e rolaram cantando samba e bossa nova, só interrompidos para tomar mais um gole da branquinha. Calibrados, dormiram na calçada mesmo, acordando com o pipocar dos fogos da meia noite, a chegada do Ano Novo e um bêbado que passava gritando viva aos quenianos.
Perneta não voltou à cidade nem para pegar suas roupas. Os três companheiros nem tocaram no assunto de tê-lo visto. Os mais velhos choravam a vergonha, enquanto outros gozavam e contavam piadas. O secretário aceitou as desculpas do prefeito e reassumiu seu cargo. Ermenegildo pessoalmente queimou as faixas e desmanchou o palanque.
Fonte:
Laé de Souza. Acredite se quiser. SP: Ecoarte, 2000.
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