sábado, 8 de junho de 2024

Vereda da Poesia = 28 =


Trova Humorística de Juiz de Fora/MG

HELOISA ZANCONATO

- Meu guri só diz tolice!...
E o garoto retrucou:
- Mas, papai, tudo o que eu disse
foi você quem me falou!...
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Soneto do Rio de Janeiro/RJ

MANUEL BANDEIRA
(Manuel Carneiro de Souza Bandeira Filho)
Recife/PE, 1886 – 1968, Rio de Janeiro/RJ

A CAMÕES

    Quando n’alma pesar de tua raça
    A névoa da apagada e vil tristeza,
    Busque ela sempre a glória que não passa,
    Em teu poema de heroísmo e de beleza.

    Gênio purificado na desgraça,
    Tu resumiste em ti toda a grandeza:
    Poeta e soldado... Em ti brilhou sem jaça
    O amor da grande pátria portuguesa.

    E enquanto o fero canto ecoar na mente
    Da estirpe que em perigos sublimados
    Plantou a cruz em cada continente,

    Não morrerá sem poetas nem soldados
    A língua em que cantaste rudemente
    As armas e os barões assinalados.
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Aldravia de Juiz de Fora/MG

CECY BARBOSA CAMPOS

a
turba
ruge
o
tiro
ecoa
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Soneto de Lisboa/Portugal

FERNANDO PESSOA
(Fernando Antonio Nogueira Pessoa)
1888 – 1935

AH UM SONETO!!!

Meu coração é um almirante louco
que abandonou a profissão do mar
e que a vai relembrando pouco a pouco
em casa a passear, a passear...

No movimento (eu mesmo me desloco
nesta cadeira, só de o imaginar)
o mar abandonado fica em foco
nos músculos cansados de parar.

Há saudades nas pernas e nos braços.
Há saudades no cérebro por fora.
Há grandes raivas feitas de cansaços.

Mas - esta é boa! - era do coração
que eu falava... e onde diabo estou eu agora
com almirante em vez de sensação?… 
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Trova Premiada em Bandeirantes/PR, 2009

JB XAVIER 
(José Xavier Borges Júnior)
São Paulo/SP

Na clausura da existência,
das prisões que nos impomos,
um devaneio é a essência
do que pensamos que somos!
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Poema de Catanduva/SP

ÓGUI LOURENÇO MAURI

O FASCÍNIO DO TEU SORRISO

Não sei como tu consegues ser assim!...
Nenhum contratempo tira teu sorriso.
Eu queria tal postura também pra mim.
É de um humor igual ao teu que preciso...

De tua euforia, tenho feito meu remédio,
Minha terapia é teu rosto risonho.
É sempre tua alegria que me espanta o tédio,
Preso a teu estado d'alma me recomponho.

Ah!... Se Deus me desse teu temperamento...
De quem sorri mesmo nas horas mais duras,
A esperança anularia meu desalento,
Fazendo meu astral chegar às alturas.

Este teu sorriso de puro fascínio,
Com todo o charme de matiz cativante,
Deixou meu coração sob teu domínio,
Prisioneiro de outro, num peito triunfante.

Quando noto, de orelha a orelha, teus lábios,
Um traçado horizontal num rosto lindo,
Percebo-te a usar a estratégia dos sábios,
Convicto de que me ganhaste sorrindo.
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QUADRA POPULAR

Quem me dera estar agora
onde está meu coração,
lá no campo da saudade,
onde meus suspiros vão.
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Soneto de Campo dos Goytacazes/RJ

ANTONIO ROBERTO FERNANDES 
São Fidélis/RJ, 1945 – 2008, Campos dos Goytacazes/RJ

SEM MEDIDA

Quem diz que ama muito ou pouco, mente
ou não conhece o amor, na realidade,
pois não se mede o amor em quantidade,
se ama, ou não se ama, simplesmente.

Quem ama, embora sonhe com a eternidade,
ainda assim não sonha o suficiente
e em nada modifica o amor que sente,
seja na dor ou na felicidade.

Não há um meio olhar ou um meio beijo.
Ninguém tem dez por cento de um desejo
nem existe carícia desmedida.

E o amor, sem ter tamanho, é tão profundo
que podemos achá-lo num segundo
ou procurá-lo, em vão, por toda a vida.
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Trova de Mangualde/ Portugal

ELISABETE DO AMARAL
(Elisabete do Amaral Albuquerque Freire Aguiar)

Sobre o fumo mais escuro,
fruto da vil ambição,
quero pintar um futuro
sol ridente, meu irmão!
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Poema de São Fidélis/RJ

ANTONIO MANOEL ABREU SARDENBERG

BUSCA

Traço na tábua a trilha da traça.
Tiro da tira um tanto de nada.
Fito na foto a fita que enfeita,
O filme perfeito de um conto de fada.

Fico atento focando no trono,
O rato roendo a roupa do rei.
Vejo ao relento a força da lei,
Perco a esperança, o sonho, o sono!

Sinto na alma um quê de saudade,
Choro sozinho o sonho perdido,
Vejo o passado morto e partido.
De mim sinto pena, dó, piedade!

Lanço o laço em busca do nada.
Sinto o horizonte mais longe que tudo.
Perco o caminho, o rumo, a estrada,
Caio na poça de um poço bem fundo.

Busco na fé a força do forte.
Conto o tempo em cada segundo.
Procuro na bússola a reta, o norte,
Acho você: meu mundo, meu tudo!
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Haicai de Campinas/SP

GUILHERME DE ALMEIDA 
(Guilherme de Andrade de Almeida)
Campinas, 1890-1969, São Paulo/SP

Um gosto de amora
comida com sol. A vida
chamava-se "Agora".
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Sextilha de São Simão/SP

THALMA TAVARES
(Vicente Liles de Araújo Pereira)

Descobri um grande amor
– meio século já faz -
e ainda hoje é o motivo
que sempre alegre me traz,
por ser a troca constante
de ternura, amor e paz.
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Trova Humorística de São Paulo/SP

THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA

Garota que, muitas vezes,
com jantares se tapeia,
vai, durante nove meses,
“chorar... de barriga cheia!”
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Glosa de Fortaleza/CE

NEMÉSIO PRATA 
(Nemésio Prata Crisóstomo)

MOTE:
Um sonho lindo que eu tive
onde tudo era harmonia
acordei... não me contive...
Era um sonho!... Que agonia!
José Feldman 
Campo Mourão/PR

GLOSA:
Um sonho lindo que eu tive
trouxe-me doces lembranças
quando jovem, em aclive,
via na vida esperanças!

Fora uma bela visão
onde tudo era harmonia
dando-me viva impressão
do quão feliz eu seria!

Hoje em infausto declive
na vida, sem me por freio,
acordei... não me contive...
foi só mais um devaneio!

Que o sonho fosse verdade
era tudo o que eu queria,
mas quedei-me à realidade:
Era um sonho!... Que agonia!
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Epigrama de Salvador/BA

LAFAIETE SPINOLA
(Lafaiete Ferreira Spínola)
1909 – 1975

Uma coisa aconteceu
Que a todo o mundo intrigou:
O Tesouro emagreceu
E o tesoureiro engordou!

(sobre um tesoureiro que guardava o dinheiro público em seu próprio bolso)
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Soneto do Rio de Janeiro/RJ

JOÃO BARAFUNDA
(João Francisco Coelho Cavalcanti)
São Luiz do Quitunde/AL, 1874 – 1938, Rio de Janeiro/RJ

ROSA

Como um botão de rosa despontando
era assim Rosa — meu primeiro amor;
passava às rosas seu perfume dando
e dando às rosas sua rósea cor.

Quando Rosa morreu, todos, chorando,
rosas puseram no caixão (que dor!)
E as rosas forma pálidas ficando,
ficando triste como a extinta flor.

E foi-se a rosa de meu coração...
Porque fugiste, amor puro e perfeito?
Porque morreste, flor inda em botão?

Tu, que foste rainha das formosas
flores, hás de viver sempre em meu peito.
Tens em meu peito um túmulo de rosas.
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Trova Premiada  em Cachoeiras de Macacu/RJ, 1999

ANTONIO COLAVITE FILHO 
Santos/SP

“Cara-de-pau!” E o grã-fino 
não se abala, não se afoba;
e no rosto, enfim, ladino,
passa um óleo de peroba…
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Spina de São Paulo/SP

CARLA BUENO OLIVEIRA

ESQUEÇO DE TUDO

Esqueço de tudo
desde que conheci
você, meu universo.

Você tornou-se a minha vida,
a razão de tudo, enfim,
de existir cada novo verso.
Foi tão bom isso acontecer,
não poderia ser o inverso!
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Trova de Campinas/SP

ARTHUR THOMAZ
(Arthur Thomaz da Silva Neto)

Em um lugar no passado...
Hoje, ao ver nosso retrato
esquecido e amarelado,
eu culpo o destino ingrato.
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Poema do Rio de Janeiro/RJ

LENA JESUS PONTE
(Lena Rúbia Ferreira de Jesus Ponte)

DE PASSAGEM

Na rua dorme um menino
sem lençol de afeto.
Na rua sonha um menino
sonhos sem imagens.
Na rua seca um menino
sem sequer as miragens de um deserto.

O menino dorme,
abraçado à calçada,
aconchegado ao cimento.
Que faz todo mundo neste momento exato?
Dormimos todos um sono profundo.
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Poetrix do Rio de Janeiro/RJ

RICARDO INGENITO ALFAYA

porcelana chinesa

Luz na água do chá
O rosto de um monge
Dentro da xícara
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Poema de Lisboa/Portugal

ANA LUÍSA AMARAL

ESPAÇOS

 As nuvens não se rasgaram
nem o sol: só a porta
do meu quarto

 A abrir-se noutras
portas dando para outros
quartos e um corredor ao fundo

 Não havia janelas nem
silêncios: sinfonias por dentro
a rasgar o silencio

 A porta do meu quarto
já nem porta: madeiramento
para o fogo
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Trova de Maringá/PR

A. A. de ASSIS
(Antonio Augusto de Assis)

– Aceitas dar-me os deleites 
da próxima contradança?... 
– Aceito, desde que aceites 
não me apertar contra a pança! 
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Poema de Brusque/SC

MARIA LUÍZA WALENDOWSKY

VIDAS II

Vidas, que se cruzam,
Que em seus trilhares
se confundem,
num misto de alegrias,
tristezas...
companheirismo e confidências.

Vidas, que ao longo do tempo,
criam raízes em nossos corações...
que ao se depararem com intempéries,
deixam cicatrizes... apenas!

Vida, que Deus nos presenteia...
e basta um segundo,
um instante,
para se entrelaçar
olhos,
 alma...
e coração!
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