Andando um dia Carlos Magno à caça com uma comitiva numerosa, perseguiu um veado, que dava tais saltos, e corria por tal forma que, apesar da ligeireza do seu cavalo, o rei perdeu-lhe completamente a pista. Foi então que viu que estava só, tendo a sua corte ficado muito para trás e, sentindo-se fatigado, entrou ao cair da noite numa choupana solitária no meio da floresta. Em roda da lareira estavam deitados quatro ladrões. Os salteadores levantaram-se logo, como despertados pelo barulho da entrada do viajante; cada um deles tinha tido um sonho, que lhe quiseram logo contar.
O primeiro que tomou a palavra exprimiu-se desta maneira:
– No meu sonho, tirava eu o capacete de ouro à pessoa que acabava de entrar aqui, e punha-o na minha cabeça.
– Eu, disse o outro, sonhei que vestia a sua couraça.
– E eu, disse o terceiro, que estava pondo o seu manto.
– E eu, disse o último ladrão, para lhe fazer favor, passava em roda do meu pescoço aquela pesada cadeia de ouro, da qual está pendurada a sua trompa de caça.
–Vejo bem, disse o imperador, que têm tenção de me roubar tudo, e mesmo a vida. Reconheço que estou em poder de vocês, e que toda e qualquer resistência seria inútil. Não lhes peço senão uma coisa, é que me deixem tocar pela última vez na minha trompa de caça.
Os salteadores responderam que consentiam, visto que o último pedido de um moribundo devia ser respeitado.
Carlos Magno levou à boca a sua magnífica trompa de marfim, e tirou dela sons tão fortes e sonoros, que em menos de alguns minutos todos os seus companheiros de caça e a sua comitiva estavam ao pé dele.
– Agora, disse o imperador, dirigindo-se aos salteadores, agora também eu devo contar o sonho que tive. Sonhei que vocês todos iam ser enforcados diante deste casebre.
E o sonho realizou-se imediatamente.
Fonte:
Guerra Junqueiro. Contos para a infância.
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