Narizinho fora levada para o alto da árvore onde tinha de morar toda a vida com o seu esposo macaco. Pedrinho fora amarrado ao tronco onde ia ser comido pelas formigas. O Visconde fora dormido num galho de pau..
Era o único feliz. Teve lindos sonhos. Sonhou com um país sossegado, onde não havia nem Emílias nem canastras.
Veio a noite. A macacada começou a cair num tal sono que dentro em pouco só se ouviam roncos naquele trecho da floresta. Da árvore onde estava, Narizinho pôde ver Pedrinho amarrado ao tronco.
— Tepenhapa papacipienpenciapia quepe Pepenipi-nhapa nãopão tarpardapa — gritou-lhe ela.
Nem bem acabara e já ouviu um galo cantar longe — Cócóricócó!
— Épé epelepe — gritou de novo a menina, batendo palmas.
E era mesmo. A pena de papagaio vinha flutuando em cima do burro em disparada. Peninha saltou em terra e correu a descer Narizinho da árvore. Os macacos, que lá estavam de sentinelas, não perceberam nada, tamanho era o sono.
— Estou estranhando o sono desta bicharia — disse a menina.
— Por mais barulho que se faça, nenhum acorda.
— Pudera! — exclamou Peninha. — Pus tal dose duma planta dormideira no poço onde eles bebem, que só amanhã lá pelo meio-dia poderão despertar. Que é de Pedrinho?
— Ali naquele tronco!
Peninha correu a desamarrá-lo. Depois foi acordar o Visconde, que danou de ter de cortar a gostosa soneca para novamente pôr às costas a canastrinha.
— Agora é montar no burro e tocar no galope!
— Não ainda! — disse Pedrinho. — Tenho contas a ajustar com o macacão rei.
Foi em procura de Simão XIV, que encontrou a roncar no meio de toda a corte, igualmente adormecida.
“Que fazer para vingar-me? Ah, já sei!”
Tomou uma tesoura que andava por ali e cortou-lhe as barbas, a ponta da cauda e meia orelha, dizendo:
— Quando a macacada despertar amanhã, nenhum poderá reconhecer o grande rei Simão Banana, e todos correrão daqui, a pau, este mono duma figa!...
Em seguida reuniu-se aos outros e pronto!
— Vamos! — gritou Peninha para o burro.
O animal saiu no galope e em menos de meia hora os levou para onde estavam os fabulistas. De longe já os meninos os viram, sentados na mesma pedra, ferrados na mesma discussão.
— Vivam! — exclamou o senhor de La Fontaine. — Por onde andaram os meus meninos?
Cansada das aventuras do dia e ansiosa por voltar para casa, Narizinho desfiou atropeladamente, sem apear-se do burro, as principais peripécias do passeio.
— Quando estivermos juntos outra vez, contarei tudo mais direitinho. Agora não posso. Adeus, senhor de La Fontaine! Adeus, senhor Esopo! Até um dia!
— Para onde vão com tanta pressa?
— Jantar! — gritou Pedrinho.
— Senhor de La Fontaine — disse Emília — fique sabendo que gostamos muito da sua pessoa. Apareça lá no sítio para tomar um cafezinho coado na hora. O senhor também, seu Esopo. Mas vá de paletó e calça, se não tia Nastácia se assusta. Não façam cerimônias. Dona Benta não se importa. Ela é muito boa...
Os fabulistas prometeram aparecer.
— Au revoir! — gritou de longe a menina.
— Au revoir! — repetiu o senhor de La Fontaine com um aceno de mão — e ficou por um tempo a segui-los com os olhos.
Quando o burro desapareceu numa nuvem de pó, lá bem ao longe, o fabulista suspirou:
— Felicidade, teu nome é juventude!... Em seguida voltou a sentar-se na pedra, à beira do ribeirão, e retomou a conversa com Esopo no ponto em que os meninos a haviam interrompido.
––––––––––––––
Continua… O Pó de Pirlimpimpim – I - O burro falante
Fonte:
LOBATO, Monteiro. Reinações de Narizinho. Col. O Sítio do Picapau Amarelo vol. I. Digitalização e Revisão: Arlindo_Sa
Era o único feliz. Teve lindos sonhos. Sonhou com um país sossegado, onde não havia nem Emílias nem canastras.
Veio a noite. A macacada começou a cair num tal sono que dentro em pouco só se ouviam roncos naquele trecho da floresta. Da árvore onde estava, Narizinho pôde ver Pedrinho amarrado ao tronco.
— Tepenhapa papacipienpenciapia quepe Pepenipi-nhapa nãopão tarpardapa — gritou-lhe ela.
Nem bem acabara e já ouviu um galo cantar longe — Cócóricócó!
— Épé epelepe — gritou de novo a menina, batendo palmas.
E era mesmo. A pena de papagaio vinha flutuando em cima do burro em disparada. Peninha saltou em terra e correu a descer Narizinho da árvore. Os macacos, que lá estavam de sentinelas, não perceberam nada, tamanho era o sono.
— Estou estranhando o sono desta bicharia — disse a menina.
— Por mais barulho que se faça, nenhum acorda.
— Pudera! — exclamou Peninha. — Pus tal dose duma planta dormideira no poço onde eles bebem, que só amanhã lá pelo meio-dia poderão despertar. Que é de Pedrinho?
— Ali naquele tronco!
Peninha correu a desamarrá-lo. Depois foi acordar o Visconde, que danou de ter de cortar a gostosa soneca para novamente pôr às costas a canastrinha.
— Agora é montar no burro e tocar no galope!
— Não ainda! — disse Pedrinho. — Tenho contas a ajustar com o macacão rei.
Foi em procura de Simão XIV, que encontrou a roncar no meio de toda a corte, igualmente adormecida.
“Que fazer para vingar-me? Ah, já sei!”
Tomou uma tesoura que andava por ali e cortou-lhe as barbas, a ponta da cauda e meia orelha, dizendo:
— Quando a macacada despertar amanhã, nenhum poderá reconhecer o grande rei Simão Banana, e todos correrão daqui, a pau, este mono duma figa!...
Em seguida reuniu-se aos outros e pronto!
— Vamos! — gritou Peninha para o burro.
O animal saiu no galope e em menos de meia hora os levou para onde estavam os fabulistas. De longe já os meninos os viram, sentados na mesma pedra, ferrados na mesma discussão.
— Vivam! — exclamou o senhor de La Fontaine. — Por onde andaram os meus meninos?
Cansada das aventuras do dia e ansiosa por voltar para casa, Narizinho desfiou atropeladamente, sem apear-se do burro, as principais peripécias do passeio.
— Quando estivermos juntos outra vez, contarei tudo mais direitinho. Agora não posso. Adeus, senhor de La Fontaine! Adeus, senhor Esopo! Até um dia!
— Para onde vão com tanta pressa?
— Jantar! — gritou Pedrinho.
— Senhor de La Fontaine — disse Emília — fique sabendo que gostamos muito da sua pessoa. Apareça lá no sítio para tomar um cafezinho coado na hora. O senhor também, seu Esopo. Mas vá de paletó e calça, se não tia Nastácia se assusta. Não façam cerimônias. Dona Benta não se importa. Ela é muito boa...
Os fabulistas prometeram aparecer.
— Au revoir! — gritou de longe a menina.
— Au revoir! — repetiu o senhor de La Fontaine com um aceno de mão — e ficou por um tempo a segui-los com os olhos.
Quando o burro desapareceu numa nuvem de pó, lá bem ao longe, o fabulista suspirou:
— Felicidade, teu nome é juventude!... Em seguida voltou a sentar-se na pedra, à beira do ribeirão, e retomou a conversa com Esopo no ponto em que os meninos a haviam interrompido.
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Continua… O Pó de Pirlimpimpim – I - O burro falante
Fonte:
LOBATO, Monteiro. Reinações de Narizinho. Col. O Sítio do Picapau Amarelo vol. I. Digitalização e Revisão: Arlindo_Sa
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