sexta-feira, 29 de março de 2013

Pedro Emílio (Versos Diversos)

TROVAS

Ai, quem me dera morrer
à mercê dos meus desejos
– apertado nos teus braços,
afogado nos teus beijos!

A minha mãe se enternece
me embalando com o olhar,
compondo terços em prece
sem ser preciso rezar".

Ao mesmo tempo em que mata,
mata e faz viver também...
Saudade é dor que maltrata,
maltrata fazendo o bem!

Das esperanças que tenho,
duas não posso alcançar:
são as que vivem pousadas
no verde do teu olhar...

Desejar mulher alheia
é pecado sem perdão?
Mas... e se ela nos deseja,
comete pecado ou não?...

Eu não troco a minha vida
pela vida de ninguém,
que nenhuma é mais florida
que a minha, junto ao meu bem.

No cantar de uma cigarra
há tanta melancolia,
que parece ser a tarde
chorando a morte do dia!...

O destino, minha amada,
nos impõe coisas assim:
- Eu não te esqueço por nada!
Por nada... esqueces de mim...

O outono as árvores deixa
despidas completamente...
– Vontade de ser outono
no corpo de muita gente!

Planta um beijo em meu jardim,
meu amor, quando te fores,
que, ao ver teu beijo florir,
murcharão as outras flores!

"Que Deus te ajude!" - assim disse
um mendigo em minha porta.
- Quem dera que Deus te ouvisse,
infeliz que me conforta!

 POEMA PARA EMBALAR JOANA

Quando Joana nasceu,
todas as estrelas
acordaram com ela
e em ciranda cantaram:

“Existe Bela-Joana
Existe Joana-Bela!”

Duas gotinhas de céu
pingaram nos olhos dela,
Joana tem cor de alvorada
e cabelos de luar.

Duas résteas de manhã
disseram nos lábios dela:
“Bela-Joana”  é serra
“Joana-Bela” é mulher.

Quando Joana sorriu,
todas as cores sorriram,
sorriram todas as flores,
até a tristeza sorriu.

Quando Joana andou
pisou leve, mansinho,
mas a primavera acordou
e os passarinhos cantaram:

“Existe Bela-Joana
existe Joana-Bela
Bela-Joana é serra
Joana-Bela é mulher!”

Quando Joana falou,
Um poema estava mudo
Joana acordou o verso
E as palavras rezaram:

- Joana cheia de graça!
- Joana cheia de luz!
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SÃO FIDÉLIS
CANTIGA PARA TRÊS TEMPOS


Chuva amarela na Gamboa:
- O I T I S -
Na avenida, chuva doce:
- S A P O T I S -
Tapetes coloridos nas manhãs
Sob os pés de flamboiãs.
LUCAS e CAMBIASCA
- Freis pioneiros -
no silêncio do bronze
FIDÉLIS
- Santo Padroeiro -
na inércia da massa unicolor.
1840 .....1870 .......1970 ........
Vila ..... Cidade ... Saudade...
Maria
Cheia de graça
que passa.
na praça:
- cadência de passos
no espaço.
Dilma ..... Dilce...... Dilza.....
Diva....... Dolores ...... dores:
Verso pobre,
canto roucos.
Tudo é nada,
muito é pouco.
O que eu digo,
o que eu sinto
no canto pobre
no verso rouco
para dizer donde vens
para dizer o que tens,
é muito pouco,
é muito pouco.
Cajá, café, caju,
Casa, cachaça, .....Cacilda.
No leito,
o rio,
o estio,
dorme
ouvindo cantigas
de lendas antigas.
Lampião sem gás,
coreto sem "Jazz",
porto
morto.
Hinos, sinos, Banda.
Bogos, jogos, fogos.
A araponga gonga,
Fere fogo na forja
e aguça o agudo gume
perfuro - cortante,
do comerciante
especialista
- e até tratadista
em robalo.
Cores, flores,
gente, cachorro quente.
Vila!
Cidade!
Saudade.
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MADRUGADA

Dois cigarros acesos no silêncio da madrugada
O meu e o teu cigarro
Uma tragada um beijo, um beijo uma tragada:
- Teu braço é o meu travesseiro quente e macio
Dois pássaros que a tempestade da noite separa
E se juntam em manhã dourada de estio
- Preciso partir, mas antes que eu diga mais nada
prende-me nos braços e entre beijos e abraços
pede-me para ficar
E como num delírio louco de amor
Começa a falar: Não, não vá embora
Deixe que o sol desponte e os pássaros comecem a cantar lá fora
Deixe que a névoa adormecida no colo azul das montanhas distantes
Desapareçam ao toque sutil da aurora.
-Que será do resto da manha se te fores,
não vês que ficarei sozinha morrendo de amores?
Esqueça a vida querido e me entregue a luz do teu olhar
Num sonho eterno e perdido
Somente agora o sol debruça em nossa janela
Com ar de malícia vem nos dar bom dia
Beijar nosso amor em eterna poesia
Louvar nosso amor nessa manhã tão bela
- Esqueça a vida querido e me entregue a luz do teu olhar
Num sonho eterno e perdido.
O que será do resto do dia se te fores,
Não vês que ficarei morrendo de amores?
Esqueça a vida querido...
O que será da tarde se te fores,
Não vês que ficarei sozinha morrendo de amores?
Deixe que a tarde caia serena
A encher de sombras e odores o caminho
Por onde há de passar sozinho
Esqueça a vida querido...
Somente agora a lua vem nascendo
Como um pintor em fina tela
Imagens vem tecendo...
Dois cigarros acesos no silêncio da madrugada
O meu e o teu cigarro…

O SAPO E A LUA

Os sapos, despertos,
saíam do mato
perto, com espanto,
da linha do trem.
Enquanto da noite,
logo após a chuva,
Penetrava o manto.

Na esquina a lua
na poça d’ água
boiava disforme...
A canção da rua
( que mágoa: )
a voz dos sapos
espiando a lua
afogada n’ água.

FLOR DE MARÇO

Floresces no outono
Rosa - de – Março
pálida e inocente?

Pequena flor de março
fria e sem cor
pendida num galho
solitário e triste...

Por que chegas, agora,
Fora do tempo
(do meu e do teu)
Rosa – de – Março
tímida e nervosa?

Só não sabes
o bem que tanto trazes
a um Jardim – de – Outono
solitário e triste…

QUERO-QUERO

À tarde nos campos
Dizem os quero-queros aos bandos
Quero-quero!...
Quero-quero!...
Quero-quero!...

Que “querem-querem”
Os quero-queros?
Pobres pedintes das beiras dos brejos!
Se eu soubesse
O quê o quê
Juro-juro
Dava-dava

 Pobre-pobre dos quero-queros
Sou estribilho
Um eco...
Eu também quero...
Também quero...
Também quero…

ROSA

Flor ou espinho?
- Um nome na lembrança
plena de solidão!
- imagem entalhada
pelo esquecimento!

( Rosa um espinho na garganta. )

Musa ou mulher?
-Um verso na boca
cheia de coração!
Uma canção emudecida
Morta de emoção

( Rosa uma cantiga de roda na rua:
Que se chama solidão...
Que roubou me coração... )

- O último ópio!

CACHOEIRA DO SALTO

Nas mãos do leito
Desce suave o rio.

Sussurra num jeito brisa
Nas copas das árvores centenárias.

Segue solene.

Teclas agudas, rotundas, disformes
Das submersas falésias ancestrais...

Cortam-se as águas,
Dilaceram-se, entrelaçam – se:
Murmúrios polissonoros freqüentes!

Elevam-se, embaraçam-se em tranças louras e disformes!

Seguem suaves e brandas
Os cabelos longos e serenos
Das águas milenares
Penetrando o oceano.
( até quando? )

VALENÇA
(poema dedicado à minha irmã Ana ao completar 80 anos)
Jardim de cima
Jardim de baixo...

Quando te encontro
É que me acho!

Do verso a rima
Da flor o Cacho!

Vale de cima
Vale de baixo...

Quando te encontro
É que me acho!

Do verso a rima
Da flor o cacho!

Na manhã de cinzas
Fênix ressurge...

Entre névoa que se evapora
Esplêndida aurora!

Cheia de amor, uma crença
Valei - me Valença!

CANÇÃO FINITA

Do primeiro canto da primavera
serão teus:
- o pássaro e a canção

Da primeira flor da primavera
serão teus:
- a cor e o perfume

Do primeiro verso da primavera
serão teus:
- o poeta e o poema.

Do último canto da primavera
de quem serão:
- o pássaro e a canção?

Da última flor da primavera
de quem serão:
- a cor e o perfume?

Do último verso da primavera
de quem serão:
- o poeta e o poema?

Murcha a flor...
quieto o pássaro...
morto o verso...

De quem será a primavera?

GAMBOA DE OUTRORA

Gamboa é a rua triste da cidade
Triste na expressão das árvores
Triste na expressão dos pássaros!

Gamboa rua da chegada,
Gamboa rua da partida ...

Quando chego é rua do abraço
Que me estende o peito úmido de saudade,
Quando parto é rua do adeus
Que me acena na primeira curva do caminho

Gamboa é a rua das lágrimas amarelas dos oitis
Choradas das calçadas ...
Rua das casas antigas debruçadas no tempo ...
Lamento das rezas dos pardais em tardes de cinzas,
Sombras das casas antigas debruçadas no tempo ...

Gamboa é a rua triste de minha cidade,
Triste só para mim, quem sabe ?

Lá, a gente chega na partida ...
Lá, a gente parte na chegada …

Fontes:
www.sardenbergpoesias.com.br
http://poeticasfulinaimicas.blogspot.com.br
http://www.saofidelisrj.com.br/
http://www.vendavaldasletras.wordpress.com

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