quinta-feira, 21 de junho de 2018

Petrarca Maranhão (Poemas Escolhidos)


O REI DOS RIOS
À Laura da Cunha Mello Maranhão, minha Mãe

 Vem de longe o Amazonas, o gigante
caudaloso, feliz, tentacular,
maior que o Mississipi e que o possante
rio Nilo, de glória milenar...

 Do Telhado do Mundo, ele, insinuante,
desliza da montanha, a ultrapassar
vales, terras, florestas, sempre avante,
rumando na distância, para o mar...

 Busca o estuário, em que deve, finalmente,
arremessar, violento, inquietas águas,
num lance magistral, largo e imponente...

A tudo vence, como um herói romântico :
rompe diques, barragens, pedras, fráguas,
projetando-se, olímpico, no Atlântico!...

 EM LOUVOR DO SONETO CLÁSSICO
A Adelmar Tavares

 Saudemos na Poesia, ao soneto perfeito,
clássico em seu fluir, correntio e fugaz,
sonoro em sua rima, alado em seu conceito,
proeza de que ele só e só ele é capaz...

 Saúde-se no Verso, a esse milagre audaz
da arte de traduzir, eloquente e escorreito,
tanto um suave sentir, de deleite e de paz,
quanto um clangor de guerra a rebentar do peito!

 Glória ao talento eterno... Ariel, ente imortal,
gênio do ar, a surgir no soneto ideal,
que por séculos já toda uma história abarca.

 Glória e bela criação, deveras empolgante,
que a alturas se livrou, de forma emocionante,
na apoteose triunfal de Laura e de Petrarca.

A LEI DA VIDA

 Todos nós temos sempre em cada dia,
Uma ínfima dose de ventura:
Para cada minuto de alegria,
Outros tantos instantes de amargura . . .

 Se, acaso, alguns momentos de euforia
Fazem da vida um sonho de ventura,
Logo uma sombra má nos angustia,
Nos vem turvar aquela paz tão pura . . .

 Afinal, não se sabe por que lei
E por que inexorável fatalismo
Hão de andar, lado a lado, riso e pranto!

Eu também – ai de mim! – de nada sei . . .
Sei que me curvo ao meu determinismo,
Vivendo entre a ilusão . . . e o desencanto!

A  ELA
À Capitu do “D. Casmurro” de Machado de Assis

“O’ flor do céu, ó flor cândida e pura”
Em quem meu pensamento se resume!
Flor bendita de mágico perfume,
Que embevece minh’alma de ventura!

 Da seta de Cupido o afiado gume
Em raios mil no teu olhar fulgura,
Representante ideal da formosura,
Mulher magnífica! Meu Celso nume!

 No mundo, quando a mim mais nada valha,
Serás meu guia e único fanal!
Da vida em meio à luta intensa e forte,

 Quando tu fores minha, à própria morte
Declararei, por fim, de vez, triunfal:
“Perde-se a vida, ganha-se a batalha”! . . .

SAUDADES DO AMAZONAS

Desde que te deixei, ó terra minha,
Jamais pairou em mim consolação,
Porque, se eu longe tinha o coração,
Perto de ti minh’alma se mantinha.

Em êxtase minh’alma se avizinha
De ti, todos os dias, com emoção,
Vivendo apenas dentro da ilusão
De voltar, tal qual vive quando vinha.

Assim, minh’alma vive amargurada
Sem que eu a veja em ti bem restaurada
Das comoções que teve em outras zonas,

Mas para torná-las em felicidade,
É preciso matar toda a saudade,
Fazendo-me voltar ao Amazonas!

ESCOLHA

 Neste dilema, o que é que tu preferes?
Sinceramente, amor, dize-me aqui:
Que eu ame em ti,  a todas as mulheres
Ou em todas as mulheres ame a ti? . . .

 CLARO ENIGMA

 Eu quis fazer um poema todo esdrúxulo,
Um poema estratosférico e algo exótico,
Que fosse ao mesmo tempo heroico e másculo,
Ainda que sem rima, ideia e métrica.
Quis escrever um poema todo excêntrico,
Um tanto claro, um tanto enigmático,
Um “claro enigma” apático e esotérico,
Futurístico, místico e vesânico,
Um tanto parecido com os patéticos
Poemetos futuristas cabalísticos,
Escritos pelos gênios marinéticos . . .
Mas, se caso, estes versos melancólicos,
Que não são protestantes nem católicos,
Não agradarem meus leitores líricos,
Não me chamem de tolo nem lunático,
Nem me taxem, tampouco, em tons satíricos,
de trêfego, de frívolo ou de pérfido . . .

Fontes:
– Petrarca Maranhão.  Sonetos petrarqueanos.  
Rio de Janeiro: Editora Pongetti, 1965.
– Petrarca Maranhão. Ronda de Estrelas: poesia.
Rio de Janeiro: Editora Vecchi, 1955

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