1
Abaixa teu dedo em riste
e, antes que alguém, te descubra...
Sente a humildade que existe
nas cores da tarde rubra!
2
Afasta indignos clamores,
e falsas juras secretas,
que em meio a tantos pastores
há muitos falsos profetas!
3
A manhã, de alma serena,
e a tarde, de alma tristonha;
juntas, vão dosando a pena
da solidão de quem sonha!
4
Ao dedilhar minha lira,
bem cedo, ao romper da aurora,
a voz do vento suspira
gemendo como quem chora!
5
Ao fim da tarde, eu medito,
e percebo a contra gosto,
que a tristeza do infinito
se faz presente em meu rosto!
6
Ao rever a mocidade,
depois de velho e cansado...
Vi a sombra da saudade
nas cinzas do meu passado!
7
À tarde, o que me apavora,
é ver que a melancolia
nos meus olhos também chora
nas horas finais do dia!
8
Buscando cores mais belas,
Deus ouvindo os meus apelos...
Pintou brancas aquarelas
nas telas dos meus cabelos!
9
Carrego em minha mochila,
um brinquedo, amigo e irmão:
Meu pião, que ainda cochila
quando gira em minha mão!
10
Carro-de-bois, teu gemido
fez no sertão nossa história;
teu canto triste e sofrido
é culto em nossa memória!
11
Cerejeira, não se zangue,
que as suas cores florais,
têm a cor rubra do sangue
da luta dos samurais!
12
Com vingança não se encerra
tudo que o mundo desfaz...
Em vez de pactos de guerra
façamos tréguas de paz!
13
Corrupção - é o lado injusto
da mente perversa, insana,
que esquece o preço do custo
do resto da raça humana!
14
Cruzando nossos destinos,
nossas mãos, guardam segredos,
que meus dedos peregrinos
vão revelando em teus dedos!
15
Descalça vai para a escola,
a menina, e não se cansa...
leva sonhos na sacola
e em cada passo a esperança!
16
É bem mais pesada a cruz
que arrasta o velho andarilho,
quando o olhar quase sem luz,
é a luz dos olhos do filho!
17
Guardo esta velha cartilha
que foi luz dos olhos teus,
como centelha que brilha
nas trevas dos olhos meus!
18
Esquece a angústia incontida,
ama esse doce quebranto;
que em cada etapa da vida,
há lágrima, há riso e pranto!
19
Jangada - nos teus acenos,
não há sinais de maldade...
Mas em teus gestos serenos,
oceanos de saudade!
20
Mantém as mãos estendidas,
não firas outros irmãos...
Vê na cruz, que há mãos feridas
pelo perdão de outras mãos!
21
Mesmo por rumos incertos,
com Deus, fiz minha aliança:
Fazer dos braços abertos,
a grande cruz da esperança!
22
Nos braços de alguém que sonha,
ouço uma voz aos pedaços
de uma viola tristonha,
com saudade de outros braços!
23
O pão da vida é melhor,
e a massa cresce e se espalha,
tendo o sabor do suor
do rosto de quem trabalha!
24
O velho ancião, em seus passos,
já se arrasta entre os escombros,
como quem se entrega aos braços
da cruz que pesa em seus ombros!
25
O vento que beija a flor,
no galho onde a flor se arrancha,
nem deixa marcas no amor,
nem deixa mágoas nem mancha!
26
Quando a noite me tortura,
e a solidão me aquartela,
o vento triste murmura
soletrando o nome dela!
27
Quando a paixão me incendeia,
entre os gradis do meu teto...
Apago a luz da candeia
e acendo o fogo do afeto!
28
Quando, no amor, eu me aperte,
começo a fazer resumos...
Em busca de um rumo certo
para o amor que não tem rumos!
29
Sabiá, teu triste canto,
no alçapão que te prendeu,
em mim, dói do mesmo tanto
que em ti, tanto já doeu!
30
Se a seca, com seus ressábios,
deixa mil sonhos vazios...
Decreta a morte nos lábios
das margens secas dos rios!
31
Se há heróis, que se eternizam,
sendo sombras de outros sóis...
Na vida, todos precisam,
gravar seus atos de heróis!
32
Se placas mais luminosas
dão brilho a lutas inglórias...
Há derrotas dolorosas
que ofuscam falsas vitórias!
33
Sino!... Por que tanto alarde?
Há mais pranto em teu cantar...
Se és mesmo o pastor da tarde,
a tarde não quer chorar!
Fonte:
Francisco Garcia de Araújo. Trovas que sonhei cantar. vol.2. Caicó/RN: Ed. do Autor, 2018.
Livro enviado pelo autor.
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