sábado, 26 de fevereiro de 2022

Contos e Lendas do Mundo (Grã Bretanha: Binnorie)

Era uma vez um rei que tinha duas filhas. Elas viviam em um pavilhão perto da linda represa de Binnorie.

Sir William veio cortejar a mais velha e conquistou seu amor, comprometendo-se com uma luva e um anel. Após um tempo, voltou-se para a irmã mais nova, de faces rosadas e cabelos dourados, e seu amor por ela cresceu tanto que ele esqueceu a mais velha. Então a mais velha passou a odiar a irmã por ter lhe roubado o amor de sir William e, como a cada dia seu ódio aumentava, ela logo começou a fazer planos para se livrar da irmã.

Certa manhã bonita e brilhante, disse para a irmã:

– Vamos ver os barcos de nosso pai chegando à linda represa de Binnorie.

Foram elas de mãos dadas. Quando chegaram na margem do rio, a mais nova subiu em uma pedra para observar a chegada dos barcos, e a irmã, aproximando-se por trás, segurou-a pela cintura e a atirou na represa turbulenta de Binnorie.

– Oh, irmã, irmã, estenda a mão! – gritou a mais nova enquanto era carregada para longe pelas águas – Você terá a metade de tudo que possuo ou virei a possuir.

– Não, irmã, não vou lhe estender a mão, porque sou a herdeira de todas as suas terras. Seria uma vergonha se tocasse em quem se interpôs entre mim e meu grande amor.

– Oh, irmã, oh, irmã, então me estenda sua luva! – gritou a mais nova, enquanto flutuava para mais longe ainda. – Você terá sir William de volta.

– Afogue-se! – gritou a princesa cruel. – Não tocará na minha mão nem na minha luva. O doce William será todo meu quando você tiver se afogado.

Dando-lhe as costas, voltou para o castelo do rei.

A princesa mais nova flutuou represa abaixo, ora nadando, ora afundando, até que chegou perto de um moinho, na hora que a filha do moleiro estava cozinhando e precisava de água para a comida que preparava. Quando foi buscá-la no riacho, viu algo flutuando em direção à barragem do moinho e gritou:

– Pai! Pai! Venha tirar algo aqui da represa. Há uma donzela ou um cisne branco como leite descendo o riacho.

Então o moleiro correu para a represa e deteve as pesadas e cruéis pás do moinho. Retiraram a princesa e a puseram na margem. Estava linda quando a puseram ali. Em seus cabelos haviam pérolas e pedras preciosas, um cinto dourado circundava sua cintura, e a barra dourada de seu vestido branco cobria seus mimosos pés. Mas ela se afogara.

Enquanto estava ali, deitada e bela, um famoso harpista passou pela represa de Binnorie e viu a doce e pálida jovem. Embora continuasse seu caminho para longe, não conseguia esquecer aquele belo rosto, por isso, muito tempo mais tarde, voltou para a represa de Binnorie. Mas, tudo que encontrou depois que a enterraram, foram seus ossos e os cabelos dourados. Então ele fez uma harpa com o osso do tórax e os cabelos da moça e subiu o morro da represa de Binnorie, até chegar ao castelo do rei, pai da princesa.

Naquela noite estavam todos reunidos no grande salão do castelo para ouvir o famoso harpista. O rei e a rainha, sua filha mais velha, seu filho, sir William e toda a corte pareciam se divertir.

Primeiramente o harpista cantou ao som de sua antiga harpa, fazendo o público vibrar de alegria ou se emocionar e chorar, segundo sua vontade. Mas, enquanto cantava, ele colocou a harpa que fizera naquele dia sobre uma pedra no salão, e ela começou a tocar e cantar por conta própria, em tom baixo e claro. O harpista parou para ouvir em silêncio, assim como todos os demais.

O que a harpa cantou foi:

Oh, além se senta meu pai, o rei,
Binnorie, oh, Binnorie;
E além se senta minha mãe, a rainha,
Perto da linda represa de Binnorie.
E além está meu irmão, Hugh, de pé,
Binnorie, oh, Binnorie;
E junto a ele meu William, falso e sincero,
Perto da linda represa de Binnorie.


Então todos ficaram curiosos, e o harpista contou como vira a princesa afogada na margem perto da represa de Binnorie, e como depois fizera essa harpa com seus cabelos e o osso do tórax. Nesse instante a harpa começou a cantar de novo, e isso foi o que ela cantou, em tom alto e claro:

E ali está sentada minha irmã, que me afogou
Na linda represa de Binnorie.


Então a harpa se partiu e nunca mais cantou.

Fonte:
Katharinne M. Briggs. Contos Populares da Grã-Bretanha.

Katharine Mary Briggs (1898 -1980) foi uma folclorista e escritora britânica, que escreveu A Dictionary of British Folk-Tales, e vários outros livros sobre fadas e folclore. De 1969 a 1972, ela foi presidente da Folklore Society, que estabeleceu um prêmio em seu nome para comemorar sua vida e obra.

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