segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

Emiliano Perneta (Sensações e bizarrias)


Não sou sectário de nenhum sistema filosófico. Não sigo Schopenhauer, nem sigo Augusto Comte. Sou às vezes mais pessimista que o primeiro, porque acrescento à sua frase: “A vida não merece ser vivida” a seguinte: “Não devíamos ter nascido”. Sou mais otimista que o segundo, porque há dias em que rio tão feliz e satisfeito, tão alegre e vibrante, que parece que o universo inteiro ri comigo. Glória, áurea vaidade, que se desfaz no túmulo, no nirvana!

É um engano dizer-se que o artista ambiciona a glória. A glória consiste neste contentamento íntimo, duradouro e eterno, que o artista traz dentro de si, de poder criar obras-primas e executá-las.

Eu devia ter entrado para a Academia aos 13 anos de idade, porque só nessa idade eu poderia suportar as tolices dos meus colegas, berrar nas eleições, entusiasmar-me na festa 11 de agosto.

Como um homem custa a descobrir uma coisa que estava em si mesmo há tempo! Ele proclamava a mortalidade, o desespero dos conhecimentos dos mistérios, e entretanto ele mentia, porque sempre no fundo da sua alma, não sei onde, ele conservava a esperança de que viria a saber destes mistérios, e só agora é que ele descobriu isso!

Dizei tudo quanto tendes de dizer enquanto é cedo, porque senão tempo virá em que tudo ouvireis, tudo quererei dizer e não o podereis.

Dá-se um fato, o imbecil sempre o compreende torto; não lho expliqueis, é pior, compreende de outro modo, mais estupidamente ainda. Como um homem de espírito se torna fútil no meio de imbecis!

Evolução! Isto não passa de uma cruz que a imbecilidade põe aos ombros dos homens de talento e que estes conduzem pela via infinita e dolorosa do Progresso. Eu não sei fazer inveja aos outros porque não a sinto. Ou por outra: sinto-a de um modo tão esquisito, com tanta nobreza, que a raros poderia fazer experimentar o mesmo sentimento.

Quando ouço um imbecil dizer uma barbaridade, que é o que sempre ele diz, a respeito da poesia ou qualquer outra coisa sagrada, eu tenho vontade de protestar. Mas se avanço a primeira frase, paro logo desanimado, com uma preguiça mortal de remover aquela estupidez mais pesada que uma montanha.

Olho para o céu. Está escuro e odiento. Nestas ocasiões, sinto uma irritação nervosa contra a fatalidade que me condenou a viver sob esta abóbada — de camadas gasosas e de mistérios — a mesma irritação que sentiria se visse-me preso num subterrâneo.

O único modo de ser-se amigo dos homens e principalmente de seu dono — é ser-se baixo, adulador, paciente, humilde e serviçal como um cão. É por isso que o cão é o emblema da amizade.

Religião! Tirai-me este peso dos ombros. Eu, às vezes, sinto em mim todo o cansaço da humanidade sob esse fardo eterno.

Fonte:
Luís Bueno (org). O tempo visto daqui : 85 cronistas paranaenses. Curitiba, PR: Secretaria de Estado da Cultura, 2018.

Nenhum comentário: