Era uma vez a bela filha de um Homem rico, que estudava na universidade.
Ela era uma aluna muito aplicada e um dia, quando estava sentada próximo à janela da sua sala de aula escrevendo com um estilo(*) numa folha de palmeira, uma fórmula importante que o douto professor estava ditando para a classe, o estilo escorregou das suas mãos cansadas e caiu pela janela, indo parar no chão.
Ela achou que seria desrespeitoso pedir ao professor que fizesse uma pausa, mas se ela se levantasse para ir pegar o estilo, perderia a fórmula. Enquanto estava nesse dilema, um colega seu passou perto da janela, e a moça lhe pediu, num sussurro, que pegasse o estilo para ela.
Ora, o rapaz que passava era um filho de rei e uma pessoa muito má. Fazendo troça, ele respondeu: "Prometa-me que você vai me dar sua primeira flor na primeira noite".
A jovem, absorta na fórmula do professor, compreendeu apenas a palavra flor e aquiesceu com um gesto de cabeça.
Ele logo esqueceu a brincadeira que fizera; a jovem, porém, refletindo sobre o episódio, compreendeu o significado pleno das palavras do príncipe, mas não pensou mais nelas e esperou que tivessem sido ditas de brincadeira.
Ao fim dos respectivos cursos na universidade, o príncipe voltou para o seu reino e logo depois subiu ao trono do pai, e a jovem voltou para sua casa, num reino vizinho, casando logo em seguida com o filho de um homem rico. Na noite do casamento, ela se lembrou do incidente do estilo e, atormentada pela sua consciência, contou ao marido à promessa que tinha feito, expressando, porém, a certeza de que o jovem estava apenas brincando.
"Minha querida", o marido disse. "Quem tem de dizer se estava brincando ou não é o jovem. Uma promessa nunca deve ser quebrada." A jovem, depois de fazer uma reverência diante do marido, partiu imediatamente numa viagem ao reino vizinho, para cumprir a promessa que fizera ao rei, caso ele quisesse cobrar o prometido.
Quando andava sozinha na escuridão, um ladrão a agarrou e disse:
"Que mulher é essa que sai andando pela noite, enfeitada de ouro e joias? Me entregue suas joias e seu vestido de seda".
"Oh, ladrão", a jovem respondeu, "leve minhas joias, mas deixe-me o vestido de seda, pois não posso entrar no palácio do rei nua e cheia de vergonha."
"Não", o ladrão disse. "Seu vestido de seda é tão valioso quanto suas joias. Dê-me o vestido também."
Então a jovem explicou ao ladrão o motivo por que estava viajando sozinha na escuridão.
"Estou impressionado com o seu senso de honra", o ladrão disse. "E, se você me prometer voltar aqui depois de dar a primeira flor ao rei, eu a deixo ir embora."
A jovem fez a promessa, e pôde então continuar viagem.
Ela foi andando até passar sob uma figueira-brava.
"Que mulher é essa, tão jovem e delicada, que vaga sozinha à noite?", o ogro da árvore disse. "Vou comer você, pois todas as pessoas que passam sob a minha árvore depois que escurece me pertencem."
"Oh, ogro", a jovem suplicou. "Por favor, poupe-me, porque se você me comer agora não poderei cumprir a promessa que fiz ao príncipe."
Depois que ela explicou o propósito de sua viagem noturna, o Ogro disse:
"Estou impressionado com seu senso de honra, e, se você me prometer voltar aqui depois de se encontrar com o rei, eu a deixo partir".
A jovem fez a promessa e pôde continuar viagem.
Finalmente, sem nenhum outro incidente, ela chegou à cidade, e logo estava batendo nos portões do palácio do rei.
"Que tipo de mulher é você?", os guardas do palácio perguntaram. "O que pretende vindo ao palácio e pedindo para entrar em plena meia-noite?"
"É uma questão de honra.", a jovem respondeu. "Por favor, digam ao meu senhor, o rei, que sua colega de universidade veio cumprir a promessa."
O rei, que ouvira o tumulto, olhou pela janela do seu quarto e viu a jovem iluminada pela luz das tochas dos guardas, em toda plenitude da sua beleza. Ele a reconheceu e a desejou, mas quando ouviu a sua história, admirou-a por sua fidelidade à promessa e pela coragem de enfrentar todos os perigos e dificuldades para cumprir a palavra.
"Minha amiga", ele disse. "Você é uma mulher maravilhosa, pois coloca a sua honra acima até mesmo do seu recato de donzela. A promessa que lhe pedi não passou de uma brincadeira, e a esqueci. Por isso, volte para o seu marido."
A jovem voltou ao ogro da figueira-brava e disse: "Oh, ogro, coma meu corpo, mas, depois de tê-lo comido, pegue meu vestido de seda e minhas joias e os leve ao ladrão que está me esperando a alguns metros daqui".
O ogro disse: "Amiga, você é uma mulher maravilhosa, porque coloca sua honra acima até da própria vida. Você está livre para partir, pois eu a dispenso da sua promessa".
A jovem voltou então ao ladrão e disse: "Oh, ladrão, tome as minhas joias e o meu vestido de seda. Embora eu tenha que voltar para o meu marido nua e envergonhada, os criados haverão de me deixar entrar, pois vão me reconhecer".
O ladrão respondeu: "Amiga, você é uma mulher maravilhosa, porque coloca a sua promessa acima de joias e de belas roupas. Você está livre para ir embora, pois eu a dispenso da sua promessa".
E assim a jovem voltou para o seu marido, que a recebeu com todo afeto e consideração, e eles viveram felizes para sempre.
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Ela era uma aluna muito aplicada e um dia, quando estava sentada próximo à janela da sua sala de aula escrevendo com um estilo(*) numa folha de palmeira, uma fórmula importante que o douto professor estava ditando para a classe, o estilo escorregou das suas mãos cansadas e caiu pela janela, indo parar no chão.
Ela achou que seria desrespeitoso pedir ao professor que fizesse uma pausa, mas se ela se levantasse para ir pegar o estilo, perderia a fórmula. Enquanto estava nesse dilema, um colega seu passou perto da janela, e a moça lhe pediu, num sussurro, que pegasse o estilo para ela.
Ora, o rapaz que passava era um filho de rei e uma pessoa muito má. Fazendo troça, ele respondeu: "Prometa-me que você vai me dar sua primeira flor na primeira noite".
A jovem, absorta na fórmula do professor, compreendeu apenas a palavra flor e aquiesceu com um gesto de cabeça.
Ele logo esqueceu a brincadeira que fizera; a jovem, porém, refletindo sobre o episódio, compreendeu o significado pleno das palavras do príncipe, mas não pensou mais nelas e esperou que tivessem sido ditas de brincadeira.
Ao fim dos respectivos cursos na universidade, o príncipe voltou para o seu reino e logo depois subiu ao trono do pai, e a jovem voltou para sua casa, num reino vizinho, casando logo em seguida com o filho de um homem rico. Na noite do casamento, ela se lembrou do incidente do estilo e, atormentada pela sua consciência, contou ao marido à promessa que tinha feito, expressando, porém, a certeza de que o jovem estava apenas brincando.
"Minha querida", o marido disse. "Quem tem de dizer se estava brincando ou não é o jovem. Uma promessa nunca deve ser quebrada." A jovem, depois de fazer uma reverência diante do marido, partiu imediatamente numa viagem ao reino vizinho, para cumprir a promessa que fizera ao rei, caso ele quisesse cobrar o prometido.
Quando andava sozinha na escuridão, um ladrão a agarrou e disse:
"Que mulher é essa que sai andando pela noite, enfeitada de ouro e joias? Me entregue suas joias e seu vestido de seda".
"Oh, ladrão", a jovem respondeu, "leve minhas joias, mas deixe-me o vestido de seda, pois não posso entrar no palácio do rei nua e cheia de vergonha."
"Não", o ladrão disse. "Seu vestido de seda é tão valioso quanto suas joias. Dê-me o vestido também."
Então a jovem explicou ao ladrão o motivo por que estava viajando sozinha na escuridão.
"Estou impressionado com o seu senso de honra", o ladrão disse. "E, se você me prometer voltar aqui depois de dar a primeira flor ao rei, eu a deixo ir embora."
A jovem fez a promessa, e pôde então continuar viagem.
Ela foi andando até passar sob uma figueira-brava.
"Que mulher é essa, tão jovem e delicada, que vaga sozinha à noite?", o ogro da árvore disse. "Vou comer você, pois todas as pessoas que passam sob a minha árvore depois que escurece me pertencem."
"Oh, ogro", a jovem suplicou. "Por favor, poupe-me, porque se você me comer agora não poderei cumprir a promessa que fiz ao príncipe."
Depois que ela explicou o propósito de sua viagem noturna, o Ogro disse:
"Estou impressionado com seu senso de honra, e, se você me prometer voltar aqui depois de se encontrar com o rei, eu a deixo partir".
A jovem fez a promessa e pôde continuar viagem.
Finalmente, sem nenhum outro incidente, ela chegou à cidade, e logo estava batendo nos portões do palácio do rei.
"Que tipo de mulher é você?", os guardas do palácio perguntaram. "O que pretende vindo ao palácio e pedindo para entrar em plena meia-noite?"
"É uma questão de honra.", a jovem respondeu. "Por favor, digam ao meu senhor, o rei, que sua colega de universidade veio cumprir a promessa."
O rei, que ouvira o tumulto, olhou pela janela do seu quarto e viu a jovem iluminada pela luz das tochas dos guardas, em toda plenitude da sua beleza. Ele a reconheceu e a desejou, mas quando ouviu a sua história, admirou-a por sua fidelidade à promessa e pela coragem de enfrentar todos os perigos e dificuldades para cumprir a palavra.
"Minha amiga", ele disse. "Você é uma mulher maravilhosa, pois coloca a sua honra acima até mesmo do seu recato de donzela. A promessa que lhe pedi não passou de uma brincadeira, e a esqueci. Por isso, volte para o seu marido."
A jovem voltou ao ogro da figueira-brava e disse: "Oh, ogro, coma meu corpo, mas, depois de tê-lo comido, pegue meu vestido de seda e minhas joias e os leve ao ladrão que está me esperando a alguns metros daqui".
O ogro disse: "Amiga, você é uma mulher maravilhosa, porque coloca sua honra acima até da própria vida. Você está livre para partir, pois eu a dispenso da sua promessa".
A jovem voltou então ao ladrão e disse: "Oh, ladrão, tome as minhas joias e o meu vestido de seda. Embora eu tenha que voltar para o meu marido nua e envergonhada, os criados haverão de me deixar entrar, pois vão me reconhecer".
O ladrão respondeu: "Amiga, você é uma mulher maravilhosa, porque coloca a sua promessa acima de joias e de belas roupas. Você está livre para ir embora, pois eu a dispenso da sua promessa".
E assim a jovem voltou para o seu marido, que a recebeu com todo afeto e consideração, e eles viveram felizes para sempre.
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(*) Estilo: Ponteiro ou pequena haste de madeira, metal, osso, pedra etc. com que os antigos escreviam em tábuas recobertas por uma camada de cera
Fonte:
Angela Carter. 103 contos de fadas. Publicado originalmente (Angela Carter's book of fairy tales) em 2005.
Angela Carter. 103 contos de fadas. Publicado originalmente (Angela Carter's book of fairy tales) em 2005.
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