domingo, 12 de junho de 2022

Professor Garcia (Reflexões em Trovas) 8

A ave presa quando canta,
sabe que não canta em vão;
se solta a voz da garganta,
liberta a voz da prisão!
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A ganância, me insinua,
a ver crianças sem nome,
entre mendigos de rua
mastigando o pão da fome!!!
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Ante o amor, que se desfaz,
há gritos de pranto e dor,
e a terra perdendo a paz
mendiga um pouco de amor!
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As folhas secas do outono,
que se arrastara pelo chão...
Levam meus sonhos sem dono
que aos poucos, também se vão!
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Das palmas do vento, o açoite
dedilha canção tão bela,
que eu sinto os dedos da noite
batendo em minha janela!
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Deus, por ser sábio e tão santo,
num santo gesto de amor,
afasta a fonte do pranto
da fonte que orvalha a flor!
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Eis que a ilusão continua...
E, a liberdade, é ilusão;
que há jovens presos na rua
e homens livres na prisão!
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É neste silêncio mudo
quando estamos sempre a sós,
que eu percebo em quase tudo,
o que ainda existe entre nós!
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Enquanto a ganância avança
e, a exploração continua,
a fome perde a esperança
de um dia fugir da rua!
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Enquanto a noite se aninha,
a saudade me seduz
e a tarde, bela e sozinha,
enche os meus versos de luz!
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Há na cinza requentada
do fogão do meu passado,
velha saudade sentada
batendo palma ao meu lado!
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Mesmo sem cor, desbotada,
guarda uma infância tão linda,
essa fraldinha rasgada
que em meu baú, guardo ainda!
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Meu verso, por onde for,
mesmo se não for preciso,
é velha prece de amor
e paz em qualquer sorriso!
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Não temo o tempo que avança!
Envelhecer, na verdade...
é voltar a ser criança
no fim da terceira idade!
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O andarilho tem na mão,
o mais fiel breviário,
que fala da solidão
na vida de um solitário!
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Ó, solidão, tem piedade!
Ou tu não tens coração?...
Nunca sentiste saudade,
sequer, de outra solidão?
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O Sol, quando acende a chama,
e entre a neblina reluz...
Parece que o céu derrama
cristais em gotas de luz!
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O velho mosteiro, ao longe,
na solidão, sem alarde,
rende-se à prece de um monge,
nos idos, do fim da tarde!
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Preserve, não mate as matas,
o verde está moribundo!
Ouça na voz das cascatas
as dores cruéis do mundo!
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Quando a tarde, faz seus testes,
com nuvens, lençóis tecendo,
é Jesus trocando as vestes
da tarde que vai morrendo!
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Quando disseste, "até breve",
esqueceste os sonhos seus!...
Sem sonhos, ninguém descreve,
o peso da cruz do adeus!
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Quem lê, não teme os fracassos,
e a nada o leitor se rende...
Pode alguém prender teus braços,
mas os teus sonhos, não prende!
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Se a angústia, filho, entedia,
saiba que ela é cega e vã;
e, por ser cega de guia,
não guia o nosso amanhã!
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Se a sorte nos desatina,
quem ama não se maldiz;
o amor traça a própria sina
de quem quer ser mais feliz!
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Se és escravo do teu ódio,
e te escraviza o teu tédio...
Esquece a glória do pódio,
que o teu mal não tem remédio!
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Semeio meu grão sem nome,
seja na roça que for;
que a massa do pão da fome
é a mesma do pão do amor!
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Só existe um lar sem suspeita,
que agrega o amor mais profundo:
É o ventre da mãe que aceita
todas as raças do mundo!
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Teu pranto trevoso, vence-o,
pela fé, que te conduz;
que a humilde prece, em silêncio,
abre um caminho de luz!

Fonte:
Professor Garcia. Versos para refletir. Natal/RN: Trairy, 2021.
Livro enviado pelo trovador.

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