" TRAGO AMARGO "
Dispenso as palavras
de conforto...
Tomarei como um trago amargo
o meu desgosto...
- Amor morto:
amor posto.
" TROVADOR "
E vou iludindo, assim,
aos outros
e a mim...
Sigo
a espalhar cantiga,
trovador de alma triste
e alegre bandolim…
"TUDO?... NADA?..."
Que hei de dizer-te se nada te posso dizer?
Se tudo sabes sem uma palavra em meus lábios.
Se meus olhos toda vez que te encontram
se confessam como um pecador,
e eu não posso evitar que eles falem por mim
e revelem aos teus olhos meu segredo de amor?...
Que hei de dizer-te? Se nada te posso dizer...
Se devo parecer um incoerente, um tolo...
Se só me resta afinal esse consolo
de me confessar toda vez que meu olhar
encontra o teu olhar. . .
Há tanta coisa ao redor. . . tanto cenário inútil
ao nosso encontro,
- encontro só meu,
pois que afinal nem sei se ao me veres, me vês,
ao cruzar meu passo com o teu...
Tão complicada esta vida... E como seria simples
amar-te
tomar-te como uma criança em meus braços, beijar-te...
(Perdoa, amor, estas coisas que penso
e a estas horas tardes, componho... )
- tomar-te só para mim, e dividir contigo
pedaço por pedaço, inteirinho, este amor,
este sonho...
Chamo sonho a este amor com que me embriago,
amargo pensamento onde apenas é doce
a tua presença,
perdoa, amor: pensar em- ti, era, a principio, vago,
no começo, nem supus que importante isto fosse,
hoje, pensar em ti já é quase uma doença...
Que hei de dizer-te, afinal, se nada posso esperar...
Se temo que tudo se desmanche...
Receio pronunciar qualquer palavra, a palavra
que seria essa pequena pedra deslocada,
capaz de provocar uma avalanche!
... e sepultar
este sonho, e fazer de tudo...
... nada!
" UM NOVO AMOR "
E de repente... (parece incrível)
- o tudo de antes, não existe mais
não interessa...
Um novo amor, amor,
é sempre um mundo novo
que começa!
Não importa a experiência que tiveste
ou que julgas Ter,
nem essa íntima e inútil convicção
de que nada mais poderia em tua vida
surpreender o coração...
Não importa o percorrido
o conquistado,
ou o que antes foi desejado
por teu marinheiro coração,
- um novo amor
começa tudo do chão...
é como se abrisses os olhos para a vida
naquele instante,
como se para trás nada tivesse havido...
Nasces com um novo amor! E viverás de novo
o mistério deslumbrante
do que há de acontecer, como se nunca tivesse
acontecido...
De repente
nada mais resta,
o ontem, foi uma noite que passou,
- o hoje é o que importa, é o que se vai viver...
Um novo amor, é uma festa,
é uma nova alegria...
Um novo amor, amor, é um novo dia
que vai nascer!
" VAGA "
E um dia,
levaste com um gesto de vaga sobre a areia
tudo o que havia em minha vida...
Com um vai-vem de vaga, apagaste
tudo,
e restou a praia limpa, a areia branca,
e uma manhã de sol, sem brumas...
E a tua presença de vaga
vaga ternura , em vagas
de carícias a envolver-me todo
de espumas…
" VARIAÇÕES SOBRE O AMOR "
I
Agora que te amo
concluo e proclamo:
nunca haverá um amor igual ao outro,
podes crer...
Como não há o mesmo beijo, o mesmo olhar,
a mesma ternura,
o mesmo prazer...
II
O amor é como o perfume...
Uma vez que se sente
nunca mais se mistura ou se pode esquecer
completamente...
III
Tu pensas que amas muitas vezes...
Engano, puro engano,
esse é um estranho milagre do coração
humano
que custei a entender,
e que ainda não compreendes talvez:
- toda vez que se ama
é a primeira vez...
IV
Nunca se ama duas vezes
porque apesar de um só, o amor não se repete
no coração da gente...
O amor é como o mar...
- único, múltiplo,
diferente...
V
Os amores são como as ondas
no mar...
Parecem todas iguais quando espumam, distante,
e se põem a avançar...
Entretanto, nunca haverá uma onda
igual àquela que se elevou, cresceu
e se desfez...
Toda onda é onda somente
uma vez...
VI
Um amor é sempre assim
novo, diferente,
e surpreendente,
nada tem com o amor que passou
que floriu, que murchou,
como uma onda, ou uma flor...
Um novo amor, ( que importa o coração
viajado
e sofrido?)
é sempre um novo amor!
Que importa se é velho o barco?
Importa é o novo roteiro
a nova paisagem...
Um novo amor é sempre o primeiro...
É sempre uma nova viagem...
Fonte:
J. G. de Araujo Jorge. Quatro Damas. 1. ed. 1964.
Nenhum comentário:
Postar um comentário