sábado, 30 de março de 2013

Pedro Du Bois (Poemas Inéditos)

CIÚME

O sucesso o aplauso o cumprimento
no reconhecer a raiva entranhada

ciúme

nada mais querem de você
nessa hora de glória
em que o mundo vem abaixo
e você somente agradece.

CONSTRUIR

O homem destrói
a casa
e a refaz
em prédios
maiores

a magnitude da obra
indica o poder
a fortuna
a capacidade
a determinação
o descaso com o que está feito

o terreno ao lado
permanece vazio
vago
desocupado.

ESCREVER

Sobre o que escrevo a terra liberta
o texto indigesto e acrobático. Conheço
no espaço a treva na extensão afoita
das respostas - amanhã será a véspera
da repetição. A inocência em olhos
sobrestados no contínuo linguajar:
a estrada em acordes de sentenças
que no dizer o gesto contemporiza
a estátua imobilizada ao talhe. Escrevo
o detalhe afirmado em sugestão
e ordem.

FACES

Sob a face
há outra face
e outra face
se sucede
na face
anterior

todas as faces olham
o mesmo lado

todos os lados
estão do lado de fora

sobre a primeira face
irreconhecível
se sustentam faces
sucessivas

você me vê na face
externa de onde olha
minha face infinita.

LUZES

O fulgor
refulge
- significa
estar avivado
no extremo

enuviado no espaço
descalço sobre a grama
lavado em corpo ácido -

o dourado poente
aponta vésper
e a noite antecede
o amanhecer

no globo
que se repete.

NADA

Velhas construções
e o badalar dos sinos
próximos

(pessoas se recolhem incólumes
em mais um dia de passagem)

estabeleço as regras
e retenho na velocidade
o corpo que se desloca

a vila se fecha em sonhos
de épocas anteriores: pássaros
adormecidos em árvores.

Estabeleço as regras
e as deposito
sobre o nada.

NORMAL

A normalidade
busca na igualdade:

crescer
estudar
arrumar emprego
casar
ter filhos: descender
ascender
ao cargo maior

descansar
envelhecer
perder

desesperar os filhos
na frustração da vida
igualada na normalidade.

RISOS

O riso
adulto
repassa
a criança
em vida

o velho sorri
sua estrada
em repouso

longe
o vulto
próximo
ao contato

o riso permanente
na razão que completa
as horas de espera.

SILÊNCIO
não há quem converse
que a rua fechada
escurece a hora
do recolhimento

onde estão as respostas
do ano findo?

onde faço do futuro
a ponte inferior
das respostas?

debruçado sobre a amurada
aterriso o corpo no desgosto
da rua fechada: não me responde
o escuro sobre a descendência
vinda no sabor do calor
que me desmancha

sei do horror que se aproxima
em lágrimas de chuva

Fonte:
O Autor

Um comentário:

Pedro Du Bois disse...

Gratíssimo Feldman, pelo sempre destaque dado aos meus poemas. Abraços, Pedro.