domingo, 29 de dezembro de 2013

Hernando Feitosa Bezerra Chagall (Cantares) VII

AGORA

A vida acontece
A todo o momento e em qualquer lugar
Estejamos ou deixemos de estar.
Atemporal escorre pelos dedos das mãos
Pegajosa lambuza-nos de gente
O coração.

ADOLESEMPRE
 

Meu coração inconsequente
Doce quente adolescente
Esquece o tempo que diz:

Tuas melenas brancas
Não fazem de ti criança
Então por que és tão feliz?

MERCADORES DA PALAVRA

Não aceito a palavra maldita
A palavra bendita rejeito
Prefiro a palavra não dita
Que faça abalar-me o peito
Porque
A palavra afiada
Eloquente e vazia
Não me diz nada
E
A palavra mansa
Mas cheia de hipocrisia
Simplesmente me cansa.

UÓ UÓ UÓ

Enquanto a ambulância
Desespera-se pela avenida
Trânsito e pessoas engarrafadas
Dizem não à vida.

SEMEADOR
 

Planto sementes, resoluto.
Sei nunca serei
Árvore ou flor
Sou fruto.

SEM CHANCE

Essa vida é uma escada
Apontada para o nada
Para aqueles que a vivem
Sem gozar a utopia
Das pessoas simples, vadias
Que amam e entregam-se amadas.

CICLOS

Nasço no verão
No outono frutifico
Morro no inverno
Na primavera ressuscito.

ALQUIMI$TA$

No princípio
Era o verbo
Um alquimista alegre
Cercado de crianças geniais.
Hoje
Alquimistas e crianças
$ão $eres $érios demai$.

CLOWN

Pintei um sorriso no rosto
Para disfarçar meu cansaço.
Hoje
Uns me chamam de louco
Outros exclamam, palhaço!!!

BEZERRAS

Tato frágil
Tito mais
Tita flor
Ambrózia
Pai...
Perdoem-me
Ser mais forte
Poeta
Sonho mais.

ADULTO

Vestido de feliz
Caminha o adulto triste
Enquanto a felicidade
Despida de maldade
Brinca de roda
Num coração
Infantil.

FLOR DO MEIO DIA

Eu nasci para ser feliz
Não lembro mais porque chorei
Também não sei porque sofri
O que sei é que amo demais
Do meu jeito meu mau jeito.
Importante!
É que ainda hoje consigo sorrir
Porque nasci neste lugar
E vim morar com a poesia
Menina flor
Musa do meio-dia.

FIO DE OURO


Num céu azul
De iluminadas núvens
Uma pipa dançando
Brinca de liberdade
Atrelada ao sonho que livra
Um garoto de sua dura realidade.

ESCREVER
 

Não jogues com palavras
Como quem joga dados
Nem com sentimentos
Como quem lê mãos...
Tuas sementes
Cultiva na mente
Com raízes fincadas
Em teu coração.

AVENIDA QUALQUER

Dos altos prédios impassíveis
Janelas olham, radares observam,

Antenas perfuram o céu
Da famosa cidade...
Êta ruazinha futriqueira, meu Deus!

OFÍCIO

Escrevo
Como quem acha um trevo
Escrevo
Como quem dá um beijo
Escrevo
Tudo o que desejo
Por muito desejar
Escrevo
Escrevo
Escrevo.

PRIMAVERA

A primavera talvez seja
Duas mãos cheias de cores
Que vêm silenciosamente
Abrir uma janela de fora pra dentro de nós
Movimentando de lá pra cá, daqui pra lá
Suavemente as coisas velhas
Sem nada quebrar.

BAILARINA
(Karina)

Ah, teus pés [rimas preciosas]
Bailam giram voam encantam
Como duas rosas.

Ai, teus pés [delicados artistas]
Quando finalmente no chão
Correm para as mãos do calista.

BALA PERDIDA
(No alvo)

Arma empunhada
Mirada no ser humano

Bala no alvo
Corpo no chão
Inocente ou não

Revólver do povo
Gatilho da lei
Ou vice-versa
Não sei

Sei que toda bala
Acerta sempre em cheio
O peito e o seio
De nossa frágil sociedade.

NEGRO

Negro jazz
Negro samba
Negro soul.

O branco canta e se encanta
Com o que a alma africana
Criou

Negro jazz
Negro samba
Negro soul
E Rock and roll!

OSCAR

Deus revela-se
Através das curvas
Leves, sinuosas e belas
Das monumentais mulheres
De Niemeyer.

LEITURA

Palavras dormem
No silêncio dos livros fechados
Cobertos pela poeira da ignorância...
Mas acordam
Em algazarra num livro aberto
Pela curiosidade de uma criança.

Fonte:
Hernando Feitosa Bezerra. Cantares.  Universidade da Amazônia – NEAD.

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