“Câmara Municipal
Sem ter regimento interno!”
Exclamou, com ar paterno
Vereador pontual.
“Sem um acordo fraterno,
Um papel, um manual,
Certo, acabaremos mal,
Faremos disto um inferno.
“Digo-vos que é usual,
Em qualquer lugar externo
Haver regimento interno
Para evitar todo o mal.”
Em tom sossegado e terno
Diz outro municipal
Que o pau (físico ou moral)
É regime mais superno.
— “Há de haver algum sinal
Aqui, pelo lado interno,
Do efeito vivo e fraterno
Desse estatuto formal.
“Palavras (é dito eterno)
Às sopas não trazem sal;
Quero ação, ação real,
Venha do céu ou do averno.
“E que outra menos verbal
Que a ação do cacete alterno,
Não como um vento galerno,
Porém, como um vendaval?
Se, assim amparado, externo
Meu parecer cordial,
Para que me serve o tal
Regimento de caderno?
“Saiba a câmara atual
Que, se eu aqui não governo,
Tenho este dever paterno
De a não fazer trivial.
“Paterno disse? Materno;
Quero outro tom pessoal.
Fique-lhe o tom paternal
Ao colega mais moderno.
“Sim, o pau, é pau real
Venha do céu ou do averno,
E palavras (dito eterno)
Às sopas não trazem sal “.
Não sei que disse o paterno
Vereador pontual;
Eu, por mim, prefiro a tal
Um copo do meu falerno.
Não que seja um casual,
Ruim, triste e subalterno
Modo de encontrar em erno
O consoante final,
É falerno e bom falerno
Sorrir da municipal
Que vive tant bien que mal,
Sem ter regimento interno.
Ou esse escrito legal
Que o outro chamou caderno,
Para o bom viver paterno
Vale tudo ou nada val.
Se não, por que é que o superno
Parlamento nacional
Conserva um trambolho igual,
Quer de verão, quer de inverno?
Se sim, como é curial,
Que não tenha esse uso interno,
Corpo tal, que vive alterno,
Conservador, liberal?
Relevem se um subalterno
Entrou nesse cipoal...
Olha a taça de cristal,
Leitor, vamos ao falerno!
Fonte:
Obra Completa de Machado de Assis, Edições Jackson, Rio de Janeiro, 1937.
Publicado originalmente na Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, de 01/11/1886 a 24/02/1888.
Sem ter regimento interno!”
Exclamou, com ar paterno
Vereador pontual.
“Sem um acordo fraterno,
Um papel, um manual,
Certo, acabaremos mal,
Faremos disto um inferno.
“Digo-vos que é usual,
Em qualquer lugar externo
Haver regimento interno
Para evitar todo o mal.”
Em tom sossegado e terno
Diz outro municipal
Que o pau (físico ou moral)
É regime mais superno.
— “Há de haver algum sinal
Aqui, pelo lado interno,
Do efeito vivo e fraterno
Desse estatuto formal.
“Palavras (é dito eterno)
Às sopas não trazem sal;
Quero ação, ação real,
Venha do céu ou do averno.
“E que outra menos verbal
Que a ação do cacete alterno,
Não como um vento galerno,
Porém, como um vendaval?
Se, assim amparado, externo
Meu parecer cordial,
Para que me serve o tal
Regimento de caderno?
“Saiba a câmara atual
Que, se eu aqui não governo,
Tenho este dever paterno
De a não fazer trivial.
“Paterno disse? Materno;
Quero outro tom pessoal.
Fique-lhe o tom paternal
Ao colega mais moderno.
“Sim, o pau, é pau real
Venha do céu ou do averno,
E palavras (dito eterno)
Às sopas não trazem sal “.
Não sei que disse o paterno
Vereador pontual;
Eu, por mim, prefiro a tal
Um copo do meu falerno.
Não que seja um casual,
Ruim, triste e subalterno
Modo de encontrar em erno
O consoante final,
É falerno e bom falerno
Sorrir da municipal
Que vive tant bien que mal,
Sem ter regimento interno.
Ou esse escrito legal
Que o outro chamou caderno,
Para o bom viver paterno
Vale tudo ou nada val.
Se não, por que é que o superno
Parlamento nacional
Conserva um trambolho igual,
Quer de verão, quer de inverno?
Se sim, como é curial,
Que não tenha esse uso interno,
Corpo tal, que vive alterno,
Conservador, liberal?
Relevem se um subalterno
Entrou nesse cipoal...
Olha a taça de cristal,
Leitor, vamos ao falerno!
Fonte:
Obra Completa de Machado de Assis, Edições Jackson, Rio de Janeiro, 1937.
Publicado originalmente na Gazeta de Noticias, Rio de Janeiro, de 01/11/1886 a 24/02/1888.
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